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Carlos Drummond de Andrade - Um homem; Suas viagens
(Alzira Souza)

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UM HOMEM; SUAS VIAGENS

Alzira Souza

A sensibilidade é ingrediente primordial, característica imprescindível para a execução do exercício de bem escrever de um poeta. Tal sensibilidade permite que o poeta liquidifique seus sentimentos com os sentimentos dos seres e do mundo que o rodeia, mundo de coisas e acontecimentos que nele desperta interesse, que a ele transmite emoções.

Fernando Pessoa, o grande poeta português, nos presenteou com os versos de “Autopsicografia”, tão conhecidos pela veracidade que exprimem:

"O POETA É UM FINGIDOR.
FINGE TÃO COMPLETAMENTE
QUE CHEGA A FINGIR QUE É DOR
A DOR QUE DEVERAS SENTE..."

Verdade seja dita, todos os escritores fictícios são fingidores, enganadores, seres capazes de conduzir leitores inocentes em suas estórias inventadas, oferecendo-lhes data, hora e local dos fatos.

Mas é possível que grande parte deles engane a si mesma; se envolva de tal forma em seus relatos imaginativos e acredita-se personagem de sua própria fantasia.

Escrever romances, contos, casos “não verídicos”, assim como escrever poesias, é uma forma inteligente de dizer o que pensa sem dizer o que pensa. E quem pode afirmar que a estória, o conto, o caso, ou a poesia, não teve seu enredo baseado em fatos reais!... Como sabemos, o escritor pode ou não admitir suas verdadeiras inspirações.

Mas esta reflexão interessa a poucos. Aos leitores que só querem saborear boas estórias, bons versos, não importa muito a origem das idéias.

A não ser que a idéia seja extremamente original, fuja a todo censo comum; enfim, seja quase uma luz, às vezes até uma adivinhação.

Carlos Drummond de Andrade, contista, cronista, poeta, foi este escritor “iluminado”, que ultrapassou os limites da originalidade. Poetizou todas as coisas e situações comuns da vida e do cotidiano, de maneira incomum, imprevisível. O passado e o presente de seu tempo não passaram em vão. Tudo virou versos, manuscritos ou datilografados. E nem o futuro escapou de suas inspirações.

Seus admiradores místicos o consideraram bruxo, premonitor, vidente. Já os “pés-no-chão” o chamam sensível, sábio, “antenado”.

Bruxo ou antenado, Drummond deixou-nos provas concretas de sua ampla sensibilidade e sabedoria. Em “O SOBREVIVENTE”, extraído do seu primeiro livro, o ALGUMA POESIA, de 1930, escreveu:
“(...)
Os homens não melhoram e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem. Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado. E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio. (Desconfio que escrevi um poema.)”

O “Alguma Poesia” apresenta versos que retratam, irreverentemente, o cotidiano, repudiando as tendências parnasiano-simbolistas que dominavam a poesia até aquele momento. Drummond, bem humorado, despistava seus sentimentos amargos, suas revoltas e também sua timidez, através de seus poemas irônicos. Analista dos fatos do dia a dia, transcendeu o tempo e o espaço e alcançou o perene e o universal.


HIPÓTESE
E se Deus é canhotoe criou com a mão esquerda?Isso explica, talvez, as coisas deste mundo.
Num segundo momento, mostra a faceta de um homem-poeta reflexivo, preocupado com a sociedade, e se revela um crítico da vida urbana. A partir daí, tantas outras facetas viriam, tantos outros temas o escritor abordaria e tanto mais aprenderíamos através das suas palavras.
Drummond não passeou pelo mundo. Como atestam suas biografias, conheceu pouquíssimas cidades. Mas conheceu o mundo. Explorou-o como nenhum viajante ambulante de tempos modernos jamais o fez; rasgou os céus, os oceanos, como nenhum bilionário de jato particular jamais conseguiu percorrer; cortou a atmosfera terrestre, entrou em órbita, navegou no espaço sideral como nenhum astronauta conseguiu imaginar.
Em “O Homem, As Viagens”, 1973, deixou-nos uma síntese (apenas uma reflexão ou uma adivinhação?) do que viria a realizar o homem, por excelência um explorador, sempre insaciável, desejoso, curioso.
Como um trabalho escolar em resumo que deve dizer tudo, dissertou a alma humana, tendo como base para seus argumentos fatos reais, como o ocorrido três ou quatro anos antes, quando, em 1969, o homem pisou pela primeira vez na lua.

O HOMEM; AS VIAGENS
O homem, bicho da Terra tão pequeno
chateia-se na Terra
lugar de muita miséria e pouca diversão,
faz um foguete, uma cápsula, um módulo
toca para a Lua
desce cauteloso na Lua
pisa na Lua
planta bandeirola na Lua
experimenta a Lua
coloniza a Lua
civiliza a Lua
humaniza a Lua.
Lua humanizada: tão igual à Terra.
O homem chateia-se na Lua.
Vamos para Marte - ordena a suas máquinas.
(...) humaniza Marte com engenho e arte.
Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro - diz o engenho
sofisticado e dócil.
Vamos a Vênus.
O homem põe o pé em Vênus,
vê o visto - é isto?
(...)
Restam outros sistemas fora
do solar a col-
onizar
Ao acabarem todos só resta ao homem (estará equipado?)
a dificílima dangerosíssima viagem
de si a si mesmo:
pôr o pé no chão
do seu coração
experimentar
colonizar
civilizar
humanizar
o homem
descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
a perene, insuspeitada alegria
de con-viver.”
(In As Impurezas doBranco. José Olympio,1973)
E pensar que este homem, este poeta, se considerava gauche, alguém que estava à margem da realidade e que com ela não conseguia estabelecer relação. Talvez tivesse razão e fosse realmente assim: a realidade sempre esteve aquém do que foi capaz de alcançar a sabedoria, perspicácia e sensibilidade ultra-humana de Carlos Drummond de Andrade.



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