Ana Maria
(Jonesoh; Adeel Kaweski)
FILOSOFIA DE BOTECO-Contos&Crônicas.ANA MARIA.
Tinha que acontecer. Depois de tantos olhares, que no começo pareciam apenas coincidência, olhares fortuitos afinal Ana Maria era uma das garçonetes do bar e restaurante, era seu dever estar sempre alerta para um atendimento perfeito dos clientes.
Dirigir olhares era a maneira de checar as mesas, vendo de antemão, o que faltava, e também sinal de cordialidade e cortesia, pondo o cliente à vontade, colocando-o num ambiente familiar, no faz-de-conta de que é sua própria casa.
E aconteceu...! Tinha que acontecer!
Não foi com ansiedade, não foi com avidez, não foi com a fome incontida dos guerreiros retornando de meses e meses de batalhas, não foi como os peões, ávidos de uma aventura depois de receberem o suado salário, não foi como os pombinhos em lua de mel, onde o desespero e o despreparo colocam em risco toda uma vida futura.
Foi como um sonho. Foi como poesia, onde os versos rimam em consonância, foi como uma viagem sobre brancas nuvens, onde leves sons de violinos irradiavam uma melodia envolvente que parecia nunca mais ter fim.
Foi com compreensão. Foi com amor. Foi com um amor diferente. Foi com um amor que ela sabia que nunca teria. Foi com o amor que ela nunca teve.
Como tudo tem um fim, tudo acabou.
Ao sair o velho peão, pegou uma nota de mil cruzeiros e quando tentava colocar entre os seios de Ana Maria, a moça, graciosamente pegou a sua mão, fechou-a escondendo a nota, aproximou a boca de sua testa e com um respeitoso beijo, disse-lhe:
– Obrigada! Obrigada! Obrigada mesmo, por me ensinar a ser feliz!
E o velho peão, sem dizer uma palavra sequer, virou as costas e saiu andando pela rua escura, salpicada apenas por alguns débeis respingos de luz amarela, fugidios, tênues e acovardados saindo das velhas e toscas lâmpadas, que se equilibravam em cima de carcomidos postes de madeira lavrada.
Nesse momento um fio de lágrimas desceu dos olhos de Ana Maria que num salto saiu para a rua, levantou os braços e tentou de um grito só, jogar toda a angústia, todo o desespero que naquele momento enchia seu peito.
Algo a impediu de gritar. Sua voz sufocada não saía. Era o momento necessário, o tempo preciso para fazê-la voltar à razão.
E Ana Maria, mais uma vez, viu ao longe, através, do branco véu de neblina contrastando com a noite escura, a figura esmaecida de um único alguém que em apenas alguns momentos a fez retornar à vida.
Ana Maria, ainda com os braços para o alto e com a voz mais uma vez embargada, disse baixinho:
– Obrigada, meu velho!
Adeel Kaweski
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