Admiravel mundo novo 
(Aldous Huxley)
  
A idéia de clonagem do ser humano, ou seja, a
 produção científica de milhares de seres humanos perfeitamente iguais
 uns aos outros, era outro tema recorrente, inspirado em parte pelos
 avanços da genética, e por outro, pela visão proporcionada pelas
 fileiras infindas de soldados inteiramente iguais, marchando com passo
 de ganso nas manifestações de massa do nazismo em Nüremberg. Visões
 desse pesadelo distópico, brilhantemente imaginado por Huxley vieram à
 tona nesta semana, com o anúncio, por cientistas escoceses, de que
 tinham obtido clones perfeitos em duas ovelhas. Os pesquisadores, Keith
 Campbell e David Solter, do Roslin Institute, de Edinburgh, utilizaram
 uma técnica bastante conhecida, que já tinha sido usada anteriormente
 com dezenas de espécies, desde plantas até sapos, mas nunca em
 mamíferos tão complexos como uma ovelha. Esta técnica foi inventada por
 um cientista chamado Gurdon, na década dos 70. Utilizando avanços na
 cultura de células vivas fora do corpo, e de novos aparelhos de
 micromanipulação, que permitem ao pesquisador operar delicadamente uma
 única célula, sem matá-la, Gurdon retirou células já diferenciadas
 (isto é, formadas embriologicamente) do intestino de uma perereca,
 extirpou seus núcleos, onde existe o DNA e os cromossomas (o material
 genético), e os implantou em óvulos, dos quais o núcleo tinha sido
 previamente retirado. Como resultado, notou que os genes do novo núcleo
 se desdiferenciavam e produziam um novo ser, totalmente idêntico ao que
 tinha doado o núcleo. A clonagem, então se tornava possível (no ser
 humano, a única situação natural em que isso ocorre é nos gêmeos
 univitelinos). No experimento com as ovelhas, os cientistas fizeram
 exatamente a mesma, coisa, tendo aperfeiçoado o método de cultura de
 células, e de implante do embrião recém formado no útero de
 ovelhas-mães, uma técnica já perfeitamente dominada, e utilizada em
 grande escala na pecuária para aumentar a qualidade dos rebanhos.
 Teoricamente, o trabalho abre as portas para a produção em massa de
 animais clonados. E qual seria a vantagem disso ? Evidentemente, os
 pesquisadores podem selecionar um doador de núcleos que seja um
 exemplar perfeito da espécie, para fins econômicos, e "brincar de
 Deus", como diz o título da reportagem da revista "Veja", ou seja,
 derrotar os mecanismos lentos e imprevisíveis da seleção artificial por
 reprodução, e chegar diretamente a milhares de cópias desse exemplar.
 Outra vantagem é, que conhecendo bem um exemplar, a menor variabilidade
 biológica do rebanho facilitará sua alimentação, prevenção e tratamento
 de doenças, e previsão de ganhos ponderais, de produção de lã, etc. A
 pergunta que todo mundo está fazendo é se isso seria possível crianças
 com genomas idênticos (é o caso dos gêmeos univitelinos, ou seja,
 originários da divisão do mesmo óvulo fecundado) têm muitíssimas coisas
 em comum, inclusive vários aspectos da personalidade e inteligência. É
 como se uma fosse uma cópia quase perfeita da outra. Atemorizante,
 porque abre caminho para muitos abusos, principalmente em sociedades
 autoritárias ou grupos anti-sociais, como aquela seita japonesa que
 soltou gás no metrô de Tóquio.   Do ponto de vista de um casal que quer
 ter vários filhos, a clonagem poderá ter várias aplicações
 interessantes. Uma possibilidade medica e eticamente justificada seria
 aquela em que os pais têm risco genético alto de terem filhos
 deficientes ou com doenças congênitas. Caso eles tenham a sorte de ter
 um filho inteiramente normal, poderão clonar o genoma deste para gerar
 um segundo filho, o qual correrá um risco muitíssimo menor de ter a
 doença. Creio, mesmo, que esta será uma conduta recomendada
 rotineiramente pelos geneticistas em tais casos. Uma outra
 possibilidade correlata é quando os pais estão tão encantados com um
 filho já nascido (se a criança for excepcionalmente bonita e/ou
 inteligente, por exemplo), que desejam uma cópia idêntica do mesmo.
 Assim, correrão menos riscos de ter um segundo filho fora das
 características desejadas. Esta, evidentemente, já cria alguns
 problemas de ordem ética e moral; mas não legal, pois se a técnica
 existe e é segura, não deve cair, a meu ver, sob o escrutínio da
 justiça: afinal ninguém necessita permissão de um juiz para ter filhos
 gêmeos univitelinos. Uma polêmica maior é criada quando uma pessoa
 deseja ter um filho que seja uma cópia perfeita de si mesma. Isso
 poderá ocorrer em vários casos, de gravidade ética cada vez maior.
 Primeiro, o da mãe biológica que deseja clonar um filho com o genoma de
 seu marido ou uma filha a partir de si mesma (neste caso a clonagem
 eqüivale a uma partenogênese, um evento comum em muitos animais, mas
 teoricamente muito difícil de ocorrer naturalmente no ser humano).
 Segundo, o de uma mãe solteira que deseja clonar o genoma de algum
 grande homem ou mulher (um artista de cinema admirado, um prêmio Nobel
 super-inteligente, etc.). Será que a Sharon Stone gostaria de doar
 algumas cé ;lulas suas para essa finalidade ? Teoricamente, ela poderia
 ter muitas e muitas filhas tão bonitas e inteligentes quanto
 ela...Terceiro, o de um homem solteiro que deseja clonar a si mesmo,
 usando uma "barriga de aluguel" (uma mãe não biológica, implantada
 artificialmente com o embrião). Até aqui, eu ainda acho é tudo
 relativamente aceitável, do ponto de vista da Ética médica. Nada que
 seja muito grave ou danoso para a sociedade e para as pessoas. Enquanto
 estivermos nesse nível, não estaremos invertendo grandemente a ordem
 natural das coisas (eu até acharia interessante, por exemplo, ter um
 filho idêntico ao que eu sou. Seria a mesma coisa que tomar conta de
 mim mesmo, me ver quando era bebezinho, acompanhar e influenciar meu
 próprio crescimento !). 
 
  
 
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