Violência presumida, relativa ou absoluta - Parte 3
(Fernanda Bitencourt Balas)
É pertinente entender que nem toda criança de doze anos, já detêm maturidade para entender o ato sexual e todas as conseqüências que derivam do mesmo. Porém, dizer que nenhum menor de 14 anos possui capacidade para realizar o ato sexual seria mais um capitulo da hipocrisia social dentro do panorama atual. Nas palavras do eminente jurista Luiz Régis Prado[1]: “[...] estabelecer-se um critério etário para a autodeterminação sexual de uma pessoa afronta a lógica e o bom senso, já que a partir de uma idade legalmente fixada esta pode livremente decidir sobres ua vida sexual, mas se encontra proibida de fazê-lo às vésperas de tal fator temporal.” Compreendido todo o exposto assim, visualizam-se os pilares da presunção relativa de violência em atos sexuais envolvendo menores de 14 anos prevista no artigo 224, a do Código Penal Brasileiro. Valendo-se novamente das noções de hermenêutica, pode-se concluir que o a presunção do artigo 224,a não pode ser considerada uma presunção júris et de jure. Afinal, essa noção de presunção absoluta é paradoxal em relação ao princípio do contraditório, prelecionado em nossa Magna Carta no artigo 5°, XXX. Assim, esse princípio deve se sobrelevar, caso contrário estar-se-ia ignorando uma das cláusulas pétreas da CF/88, o que é inadmissível. Por fim, ainda no campo da interpretação, reafirma-se o argumento que elucida o ângulo relativo da presunção prevista no artigo 224, a do CPB. Afinal, a doutrina e a jurisprudência são unânimes ao admitir que são relativas as presunções expostas nas alíneas b e c do artigo supra. Logo, não haveria razão para considerar como absoluta apenas a presunção de violência envolvendo menores de 14 anos, já que não há nada expresso nesse sentido. Crer no angulo absoluto da violência presumida nos crimes sexuais cometidos contra menores de quatorze anos não é fechar os olhos para um realidade que nos cerca; pelo contrário, é reconhecê-la, admitindo a existência da prostituição infantil e a condição irrevogável de crianças e adolescentes como vítimas de um crime praticado por adultos. Em síntese, os tempos mudaram, e o homem evolui. As leis estão se modificando, e os entendimentos também. O único quesito que permanece intacto nesta relação desigual de forças relativas ao crime sexual é a violência. Seus resultados e conseqüências, seja ela decorrentes de uma presunção ou de uma agressão, não se alteraram. Compõem-se sempre de uma pesada carga traumatizante, desorientam, constrangem e até mesmo desequilibra uma vida em formação. Em linhas essencialmente legais, aprovar que crianças e adolescentes menores de 14 anos tenham discernimento, entendimento, capacidade ou sequer a possibilidade de conhecimento das conseqüências de uma relação sexual, tendo por base apenas mudanças ocorridas em nossa sociedade, que não se sabe se são ou não suficientes para tanto , é contradizer todo o conjunto de normas nacionais, inclusive preceitos constitucionais e do Estatuto da Criança e do Adolescente que seriam apenas textos sem sentido, Além disso, em nosso ordenamento jurídico não se admite que o costume (prática social reiterada de ações num mesmo sentido) revogue a lei, sendo o mesmo utilizado apenas quando a lei for omissa (como dita a Lei de Introdução ao Código Civil, Art. 4º) – e esta hipótese não é o que ocorre no caso em estudo, em que a lei é bem precisa e expressa. Muito menos temos em nosso País qualquer tipo de jurisprudência vinculante (ou seja, decisões de tribunais não têm o poder de atrair, vinculando-as para o mesmo sentido, o resultado de outras que serão julgadas posteriormente). Portanto, a questão continua indefinida, inclusive nos Tribunais, e essa é uma das vantagens do nosso sistema: não sendo a jurisprudência vinculante, é estimulado o debate crítico, contribuindo para o aperfeiçoamento das decisões e a melhor aplicação da lei a cada caso concreto. [1] Luiz Reges Prado - Curso de Direito Penal Brasileiro - Volumes 1 e 3 - RT
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