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CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DA DITADURA
(Norberto Bobbio)

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CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DA DITADURA. — Do que afirmei até agora se depreende um significado bastante preciso da Ditadura moderna. Com a palavra Ditadura, tende-se a designar toda classe dos regimes não-democráticos especificamente modernos, isto é, dos regimes não-democráticos existentes nos países modernos ou em vias de modernização (com que se podem assemelhar também as tiranias gregas dos séculos VII e VI a.C. e alguns outros Governos surgidos na história do Ocidente). Temos, no entanto, de reconhecer que este significado de Ditadura, embora possua uma indubitável dimensão descritiva, tem sido freqüentemente usado com fins prático-ideológicos, como alvo de valor negativo a contrapor polemicamente à democracia. É também por essa razão que, nos últimos anos, o uso de Ditadura em sentido moderno, corrente nos anos 50 e 60, tende a tornar-se mais raro; e não falta quem queira restringir a palavra ao significado de órgão excepcional e temporário, próprio da sua origem romana.
Não é esta certamente a ocasião de adentrarmos numa questão que corre o risco de se transformar em mera questão de palavras. Bastará, antes de ir mais além, deixar firmes estes dois pontos: 1) até hoje ainda não se encontrou um termo mais adequado que o de Ditadura para designar, em seu conjunto, os regimes não-democráticos modernos; 2) em todo caso, o que vou dizer daqui para a frente sobre as características e tipologias das Ditaduras há de entender-se como uma série de proposições respeitantes, sobretudo, indubitavelmente, aos regimes não-democráticos modernos.
Tendo isso em vista, começarei por examinar as características fundamentais da Ditadura moderna, evidenciadas na discussão da relação da Ditadura com o despotismo, o absolutismo, a tirania, a autocracia e o autoritarismo. São três, a meu parecer, essas características: a concentração e o caráter ilimitado do poder; as condições políticas ambientais, constituídas pela entrada de largos estratos da população na política e pelo princípio da soberania popular; a precariedade das regras de sucessão no poder.Com referência à concentração do poder, limitamo-nos a lembrar que esta pode referir-se a uma única pessoa ou a um pequeno grupo de pessoas. Sobre as diferentes propriedades desses dois tipos de Ditadura voltaremos a falar.
O Governo ditatorial não é refreado pela lei, coloca-se acima dela e transforma em lei a própria vontade. Mesmo quando são mantidas ou introduzidas normas que resguardam nominalmente os direitos de liberdade, ou limitam de outra forma o poder do Governo, estas normas jurídicas são apenas um véu exterior, com escassa ou nenhuma eficácia real, que o Governo ditatorial pode ignorar com discrição mais ou menos absoluta, recorrendo a outras leis que contradizem as primeiras ou que criam exceções, utilizando poderosos organismos políticos subtraídos ao direito comum ou invocando diretamente pretensos princípios superiores que guiam a ação do Governo e que prevalecem sobre qualquer lei. Este absolutismo do poder ditatorial torna caracteristicamente imprevisível e irregular a conduta do ditador ou da elite ditatorial.
Nas Ditaduras mais moderadas, podem aparecer alguns limites concretos postos por grupos dirigentes subalternos que mantenham uma certa autonomia. Estes limites conferem algum grau de regularidade e de previsibilidade à conduta do Governo. Mesmo neste caso não existe nenhuma garantia legal ou institucional que permita dar validade permanente a esses limites. Em relação aos instrumentos de controle coercitivos que empregam e ao grau de sua penetração e arregimentação da sociedade, os regimes ditatoriais diferem notavelmente um do outro. A respeito deste tema vamos nos remeter para o exposto mais adiante, a propósito da análise das tipologias das Ditaduras.Passemos agora ao segundo ponto: o fundo social e político da Ditadura. O ambiente mais típico dos regimes ditatoriais é o de uma sociedade abalada por uma profunda transformação econômica e social, a qual ativa o interesse e a participação política de faixas cada vez maiores da população e faz emergir o princípio da soberania popular. Não foi por acaso que os contextos históricos, nos quais o Governo ditatorial teve maior difusão, foram o das cidades gregas dos séculos VII-VI a.C. e o da época contemporânea, a partir da Revolução Francesa. O primeiro período marca a passagem nas cidades gregas, da estrutura tradicional da sociedade com base agrícola e oligárquica, a uma estrutura nova com base mercantil, e artesanal, igualitária e democrática. O segundo período é o do processo conseqüente à industrialização, que destrói a velha sociedade agrícola e aristocrática, amplia as bases de mobilização social e política e faz ver imperiosamente no povo o fundamento principal da justificação do Governo (mesmo se o povo vier a transformar-se em proletariado, nação ou raça). Neste quadro e com referência ao mundo contemporâneo, a Ditadura pode surgir, em primeiro lugar, numa sociedade com um alto grau de modernização econômica e social e de intensa mobilização política. Esta é então o resultado de uma grave crise do regime democrático, deteriorado por perturbações externas ou internas e suportando movimentos anárquicos das divisões inconciliáveis entre os diversos partidos políticos. Conforme o ambiente social no qual ela se instaura, esta Ditadura é durável somente quando adota uma política de mobilização permanente da população.
Finalmente, a Ditadura pode surgir também numa sociedade não atingida pela modernização, mas na qual os valores e os imperativos do desenvolvimento econômico, social e político, que se irradiam dos centros-guias da história mundial, impelem uma pequena elite a impor do alto a industrialização e o desenvolvimento. Neste caso, a Ditadura procura introduzir uma intensa e durável mobilização, apesar de defrontar-se, seguidamente, com limites muito persistentes na estrutura da sociedade tradicional.



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