Passarinhos e Gaviões - Uma Fábula da Constituinte
(Chico Alencar)
Uma vez, há muito tempo, um lugar chamado Caturama. Era um lugar muito bom de se viver, terra boa e muitas plantas que enchiam de cores a paisagem. Mas não havia só plantas, havia pássaros também, de todos os tipos e tamanhos. Assim como no mundo das pessoas a variedade era grande, mas a amizade entre as aves era maior.Era tico-tico, andorinha, sabiá, beija-flor,pintassilgo, corrupião, azulão, pica-pau, martim-pescador, anu-preto, anu-branco, quero-quero... nos galhos das árvores cabiam todos, a comida mtambém era suficiente. Cada um cantava o que queria, afinado ou desafinando, o que importava era cantar e ser feliz. Um periquito esperto dizia sempre: " Somos todos iguais e todos diferentes! E éisso que nos deixa contentes!" Só os gaviões que não chegavam por lá, voavam alto com cara de poucos amigos pensando que não seriam bem-vindos.O pardal era o líder da passarada, era bem inteligente. De tão elogiado foi mudando o comportamento e queria mandar mais que os outros, querer mais comida que os outros e ainda se sentir o dono da melhor canção. O pardal então decidiu ser o rei da mata. Chamou os amigos e criou um grupo. Com o tempo a aparência do pardal foi mudando conforme suas atitudes mudavam também. Seu bico foi ficando curvo, seus pés viraram garras, seu corpo cresceu e além do tamnho, cresceu também a vontade de mandar. Seus amigos de outrora não reconheciam mais o amigo. O ex-pardal contou como se tornara gavião: comendo ovinhos dos outros pássaros. Eles queriam ser gaviões e adotaram a mesma prática. A partir de então só se ouvia lamentação em Caturama. Quando as mães saiam, quando voltavam não havia mais ovinho. Os gaviões-pardais trataram de impor leis e ficavam cada vez mais fortes por causa do medo dos passarinhos. E decretavam leis só para impor o poder. Tudo era proibido. Os gaviões eram violentos, egoístas e mandões. Os dominados já acreditavam que seria pior sem os gaviões no poder pois eles não eram capazes de cuidar de si mesmos. E assim passou o tempo, o domínio dos gaviões continuava. Aos poucos, os oprimidos começaram a se unir timidamente mas era difícil. Até que um dia resolveram desafiar as leis. O galo-da-campina ecoou um grito de guerra:" Assombração só existe quando a gente não entra no quarto escuro. Medo só acaba quando a gente o encara de peito aberto e bico duro!". E o poder dos gaviões começou a ser balançado. Os passarinhos perceberam que só com união poderiam ganhar a guerra. E ganharam. Decidiram então reorganizar Caturama. Criaram uma constituição. Juntos criaram o estatuto que deveria ser respeitado por todos, a regra do bem viver. A Dona Coruja redigiu a Carta Magna. Passarinhos e passarões de Caturama formaram então a Assembléia Constituinte, para fazer a Constituição. Havia sempre reuniões na Mangueira. Depois de muitos meses e debates, ficou pronta a Constituição de Caturama. Era simples e curta. Eram sete artigos como as cores do arco-íris, era bela e sonora como o canto dos pássaros. E a lição mais importante era: " Somos todos iguais, mas, todos diferentes! E é isso que nos torna contentes!"
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