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O elixir da longa vida
(Honoré de Balzac)

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    A história contada por Balzac em 1830 inicia-se narrando a cena de uma luxuriante festa realizada no palácio de Ferrara, numa noite de inverno, onde residia don Juan Belvidero. No auge da embriaguez de todos os que figuravam no festim, surge numa porta um velho criado que com ar triste anuncia que Bartolomeo Belvidero, pai de don Juan, está na cama à beira da morte. Imediatamente o anfitrião perde a alegria, tal como quem abandona um  guardanapo usado e sai do salão à procura do pai, deixando atrás de si uma festa de clima frio e opaco. Don Juan chega ao leito do mortiço com a alma cheia de arrependimento, contrastando com a tranqüilidade do pai, o qual nunca se desgostara das festas depravadas e da vida esbanjadora que o filho único levava.

“Que remorsos eu sinto, meu pai! Se fosse possível restituir-te a vida dando uma parte da minha!”
“Eu bem sabia, meu filho, que podia contar contigo”, exclamou o moribundo. “Eu viverei. Vai, serás feliz. Eu viverei, mas sem retirar um único dos dias que te pertencem.”
“Está delirando”, pensou don Juan.

Os dois discutiram sobre o que don Juan achava ser devaneio, até blasfêmia, do velho, dizendo que continuaria vivendo. Bartolomeo, porém, explicou o seu plano: tinha descoberto uma maneira de ressuscitar. Pediu que o filho pegasse um frasco guardado na gaveta e esfregasse o líquido contido dentro em todo o seu corpo, assim que desse o último suspiro. No mesmo instante, falecendo, o corpo do pai fica teso como uma estátua de mármore. Relutante, don Juan guarda o misterioso licor de volta: estava com medo. Depois, passado o momento de indecisão que fazia-o alternar o olhar entre o frasco e o defunto, escorraça algumas pessoas que chegaram ao quarto e põe-se à incumbência de besuntar o cadáver. Pegou um pano embebido na poção e molhou a pálpebra direita do pai. O olho, com o brilho do olho dos vivos, abriu-se no mesmo instante .
“Furá-lo? Será talvez um parricídio?”, perguntou a si mesmo.
“Sim”, disse o olho dando uma piscada de espantosa ironia.
“Ah!, ah!”, exclamou don Juan, “aí dentro tem feitiçaria.”
E aproximou-se do olho para esmagá-lo. Uma grossa lágrima rolou pelas encovadas do cadáver e caiu na mão de Belvidero.
Está escaldante”, exclamou, sentando-se.
Em seguida, reunindo toda a coragem necessária para ser covarde, esmagou o olho, apertando-o com um pano, mas sem olhar.
            Don Juan, passando por filho piedoso, ergue um monumento de mármore sobre o túmulo do pai. Sozinho, passa a querer apoderar-se do mundo: vive de maneira ainda mais libertina. Renunciara a um mundo melhor, nunca mais se ouviu pronunciar um nome sagrado e passou a considerar os santos de pedra nas igrejas obras de arte. 

            Com sessenta anos, don Juan Belvidero fixou-se na Espanha e se casou com uma moça de Andaluzia, com quem teve alguns filhos. Filipe Belvidero, um deles, era um jovem tão conscientemente religioso como o pai fora ímpio. E chegou um tempo em que este, junto com, doña Elvira, a esposa do velho, teve que cuidar de don Juan, que expirava na cama. O ancião às vezes brigava com eles, acusando-os de que a dedicação que lhe prestavam era devida à fortuna que ele investira em rendas vitalícias para a família, mas logo, afetuosamente suplicava perdões.
Mas, numa noite de verão, don Juan sentiu a aproximação da morte. Na cama, ordenou que filho Filipe viesse ouvi-lo. Explicou-lhe que por temer o inferno, o rapaz deveria, assim que o pai morresse, recitando pai nosssos e ave marias, untar-lhe todo o corpo, enquanto estivesse ainda quente, com uma santa água que tinha consigo, guardada num vidro. Filipe, confuso, ao lado do pai morto, precipita-se com o pano molhado, para a unção. Com a sala totalmente silente, o filho inicia o trabalho, começando pela cabeça, descendo para o pescoço e o braço. Ao sentir o membro direito do pai se levantar e fortemente apertar-lhe o pescoço, o rapaz solta um grito de pavor e deixa o frasco cair, perdendo todo o líquido. Uma multidão de empregados do castelo, ouvindo o urro desesperado, carregando tochas, correram e encheram o quarto vendo o bizarro fato.
            “Milagre!”. E todos os espanhóis repetiram: “Milagre!”.
            A esposa, doña Elvira, manda chamar o abade do convento de San Lucar. Este, com os próprios olhos vê o estranho acontecimento e aproveitando-se da situação para aumentar suas rendas, anuncia uma cerimônia de apoteose no seu convento, que passaria a se chamar San Juan de Lucar. A cabeça do morto fez uma jocosa careta para as palavras do religioso. O convento, outrora uma antiga mesquita, passou a viver sempre lotado. Uma multidão dentro e fora se apertava para ver e ter a redenção do singular novo santo.
Numa ocasião, a música cantada na catedral, repleta de pessoas ajoelhadas, foi violentamente quebrada por um estrondo de trovão. Don Juan, demasiado espirituoso para permanecer calado, respondeu à cena com um diabólico riso pavoroso.
            “Vão todos para o diabo, bestas, brutos que sois!”, gritou Belvidero, “Insultais a majestade do inferno!”.
             Então a cabeça do morto se separou violentamente do corpo, avançando para  devorar a cabeça do abade.
            “Imbecil, pois sim que existe um Deus!”, gritou a voz no momento em que o abade, mordido no crânio, expirava.



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