O Doce Amanhã
(Atom Egoyan)
The Sweet Hereafter (O Doce Amanhã- filme).
Filmes independentes nunca terão uma projeção tão grande quanto os hollywoodianos. Talvez seja esta a única razão para que O Doce Amanhã tenha ficado alheio à maioria das pessoas. Um filme que, como poucos, consegue transmitir a mais profunda dor humana, sem recorrer a lugares comuns, frases feitas e tragédias desde sempre exploradas.
Lançado em 1997, e filmado no Canadá, este filme trata de um acidente envolvendo um ônibus escolar em um pequeno povoado, matando quase todas as crianças que nele estavam. O que o filme explora, porém, não é o acidente em si. Vemos o ônibus em seu momento fatídico, perdendo o controle e saindo da estrada, mas a imagem se afasta e não é possível visualizar a tragédia acontecendo, porquê não é isto o mais importante. O que interessa ao desenrolar da história é como aquela pequena população, onde todos se conhecem e convivem fraternalmente, lida com a súbita perda de suas crianças.
No momento imediatamente posterior ao acidente, um advogado, Mitchell Stephens, chega à cidade no intuito de convencer os pais das crianças mortas a entrarem com uma ação judicial para responsabilizar o possível culpado, e dele extrair uma indenização milionária. Em meio à sua peregrinação a procura de adeptos, vemos as conseqüências da perda de um filho para os pais. Vemos a desolação de forma raramente retratada em um filme. Vemos como a dor pode facilmente ser transformada em ódio, quando Mitchell consegue convencer alguns pais da existência, sim, de um culpado, mesmo que indireto, como o fabricante das peças do ônibus.
Paralelamente a estes acontecimentos, mostra-se dois outros momentos distintos: o futuro, dois anos após o ocorrido, retratando a luta de Mitchell contra o vício da filha, e o passado, tanto o imediatamente anterior ao acidente, que nos faz conhecer as vítimas da tragédia e suas famílias, e um mais distante, que novamente remete a Mitchell, lembrando do dia em que quase perdeu sua filha por envenenamento, e que estava preparado, no caso de a menina sufocar-se, para entrar com uma faca em sua garganta e salvar sua vida.
E muitas coisas acontecem, muitos sentimentos se expressam, sem, contudo, deixar o filme cansativo. Histórias de adultério e incesto. Histórias de morte de entes queridos, mesmo antes do acidente, e histórias de amor incondicional entre pais e filhos. Mas são os sentimentos transmitidos o maior acerto do filme. A ternura que conseguimos ver na cena em que Mitchell carrega sua filha no colo, com a faca na mão, torcendo para que não tivesse que recorrer ao extremo de cortar-lhe a garganta, mesmo vendo apenas o rosto da menina. Que vemos também na forma com que a motorista do ônibus, que sobreviveu à tragédia, fala de suas crianças. No simples aceno do pai aos filhos, eles já no ônibus escolar, ele seguindo-os com o carro, sem saber que os perderia em questão de minutos.
Há beleza neste filme até mesmo na combinação de uma história infantil narrada pela personagem Nicole, adolescente que sobreviveu à tragédia, com os fatos ocorridos no filme. A história de um mago que se enfureceu com toda uma cidade e encantou suas crianças para levá-las consigo deixa a história mais leve, com ares de um conto de fada, não fosse o trágico desfecho. E, nessa história, as crianças, encantadas pelo mago, dançaram todo o caminho percorrido, até que uma porta se fechou atrás delas, e nunca mais regressaram. Apenas uma ficou para trás, porque era manca. Somente ela pôde retornar aos seus. É Nicole a criança manca. A que conseguiu voltar aos seus, e a única que, em meio aos devaneios causados pela presença de um advogado em busca de indenizações, conseguiu agarrar-se aos valores de sua comunidade e encerrar, de uma vez por todas, com a possível ação milionária. Porquê ninguém que não vivesse ali entenderia que todo aquele povo vivia de um doce amanhã.
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