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O pop: literatura, mídia e outras artes
(Décio Torres Cruz)

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“O Papa é pop” (Engenheiros do Hawaii, 1990), assim como o é o mundo da globalização de marcas comerciais, de signos culturais e de mitos da TV, do cinema, da internet e da literatura. O pop, que se deu mormente nas artes plásticas, enfatiza os traços democratizadores de sua proposta estética e apresenta um impulso carnavalizante de toda linguagem. Tendo se consolidado como fenômeno estético no que se pode chamar de “tradição da ruptura” das vanguardas da alta modernidade artística e nos movimentos de contracultura dos anos cinqüenta e sessenta, o pop sintetiza o ímpeto desauratizador e dessacralizador que marca em boa medida o cenário do século XX, mas que, ao invés de datado historicamente, tem ressonância como uma visão de mundo fortemente constitutiva da arte contemporânea. É aí que Décio Torres Cruz se propõe, em seu O pop: literatura, mídia e outras artes (Editora Quarteto, Salvador, 2003, 252 p.), a delinear o ambiente pop como também ajustado para se pensar a literatura apresentada em obras como PanAmérica, de José Agrippino de Paula, que é considerado o primeiro trabalho literário pop no Brasil; Sangue de coca-cola, de Roberto Drummond; Meu nome é Gal, de Rogério Menezes; Morangos mofados, de Caio Fernando Abreu; O beijo da mulher aranha, de Manuel Puig; e Três tristes tigres, de Guilhermo Cabrera Infante, dentre outras narrativas brasileiras e estrangeiras a partir dos anos 60. De forma academicamente arejada, O pop... vem para preencher uma lacuna no estudo do pop, uma vez que é sistematicamente analisado nas artes plásticas, mas raramente como narrativa literária. Segundo Décio Cruz, a primeira tentativa de delinear uma teoria sobre o discurso literário pop foi a obra Supercaos (Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1980), de Evelina Hoisel – que muito oportunamente escreve a apresentação de O pop... –, seguida do ensaio “O cão pop e a alegoria cobradora”, de Luiz Costa Lima. Mesmo com seu tom leve e didático, O pop... ainda pode ser considerado ‘destoante’ em sua linguagem em relação ao objeto que aborda. Isso porque o fenômeno pop propõe a quebra radical das fronteiras entre os gêneros e linguagens, num processo de iconoclastia contundente em sua representação desfigurante e desalienante dos signos de uma civilização cada vez mais urbana, tecnológica, industrial e cosmopolita, e cada vez menos regional e folclórica. É aí que também reside a distinção central entre o pop e o popular. O discurso pop tem como possíveis precursores Walt Whitman e Baudelaire, seguidos por nomes das vanguardas dadaísta, futurista, cubista e surrealista, além dos poetas beatniks, Décio Cruz se alia a Octavio Paz e François Lyotard para caracterizar tanto o modernismo quanto o pós-modernismo (fronteiras fluidas entre as quais o pop germina e contamina) como prolongamentos da atitude romântica, com naturais ajustes no século XX. Porém, diferentemente dos primeiros modernistas pós-românticos, o pop não propõe o niilismo e o pessimismo paralisantes, mas “o ‘jogo’ alegre, nietzschiano” (p. 58), nas palavras de Décio Cruz. Portanto, em um ethos ateu e caótico, caracterizado pelo sentimento de nonsense, descentramento, orfandade e fragmentação, o pop funciona como desrecalque de vozes e posturas abafadas pelas ditaduras e guerras frias e quentes que dominaram o último século, em um campo semântico que inclui, dentre muitos, termos como contracultura, desbunde, carnavalização, democratização estética, indústria cultural, kitsch e geração odara. Boa parte desses fenômenos que cruzam o pop foram experienciados por Décio Cruz, que assume ser O pop... uma “tentativa de reunir os fragmentos esparsos e estilhaçados” de sua história pessoal, que se cruza com sua atuação como professor da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Estadual da Bahia, com sua defesa do título de Doutor em Literatura Comparada pela State University of New York (Buffalo, EUA). O pop... está dividido em quatro capítulos centrais. O primeiro trata dos precursores do pop, da indústria cultural e da democratização das artes, num percurso que vai de Whitman ao Tropicalismo. O segundo capítulo aborda os contornos fluidos da linguagem do pop, com sua característica central de carnavalização, de insubordinação à gramática e de tensionamento entre sagrado e profano. O terceiro capítulo se refere à temática do pop, que gira em torno do caos e do lixo, da violência e da festa, do corpo e do erótico, dokitsch e do que é sobra e sucata da urbis industrial e midiática. O quarto capítulo – “A identidade mítica” – consolida a abordagem do discurso literário no ambiente do pop, numa tentativa de delinear o personagem-mito desse fenômeno. O pop... conclui de forma interrogativa: “E daqui, para onde vamos?”. Mas algumas considerações finais aí apresentadas podem dizer muito do conteúdo dos capítulos anteriores, a saber: a literatura pop tem uma função social quando serve para denunciar a transformação do fator cultural em um instrumento de manipulação do homem moderno através da comunicação e da informação; a literatura pop desmascara, de modo ainda mais contundente do que nas artes plásticas, o jogo de poder mercadológico da indústria cultural; a literatura pop propõe a revisão da tradição sob a ótica da carnavalização das linguagens e a rasura das fronteiras hierarquizantes entre manifestações culturais; a literautra pop apropria-se da mitologia cristã e a dessacraliza em sua hibridação com os mitos urbanos. Como energia geral dessa obra de Décio Torres pode-se apontar sua visão da permanência do “sonho pop” como democratização e dessacralização do estético e que “o fim da festa pop só será declarado quando a bomba realmente explodir” (p. 220).



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