Resumo de Mitterrand, o melhor Presidente francês

EM VIDA, os franceses deram-lhe diversos cognomes, como «Monarca» e «Deus». A sombra do homem que reinou durante 14 anos em França, continua a planar sobre um povo fascinado por personagens romanescos.
François Mitterrand cultivou magistralmente esta faceta digna das maiores obras literárias. Com uma cultura fora do comum, foi um político genial na arte da estratégia e da manobra, mas continua envolvido num intenso mistério. Ele próprio disse um dia que mesmo os seus mais próximos apenas conheciam um terço da sua vida.
Faleceu aos 79 anos e controlou tudo até ao fim: mesmo as revelações sobre o seu passado colaboracionista com o regime de Vichy, durante o nazismo, ou a existência da sua filha «natural», Mazarine, foram orquestradas por ele e só foram divulgadas quando ele o quis. Chegou a mandar perseguir pela polícia secreta ou pelo fisco e a autorizar escutas telefónicas ilegais quem ameaçava divulgar alguns dos seus segredos, antes do momento que ele tinha cuidadosamente preparado.
O fim do seu reinado foi marcado por diversos escândalos, mas a sua imagem não foi afectada.
Uma sondagem publicada pelo jornal «Libération» indicava que ele foi o melhor Presidente francês dos últimos 50 anos, à frente do general de Gaulle! Uma outra colocava-o logo a seguir ao mítico militar que organizou a resistência à Alemanha nazi.
François Mitterrand era, a um tempo, socialista, místico e até, surpreendentemente, crente. Pouco antes de morrer, afirmou numa entrevista na televisão que depois do seu desaparecimento continuaria a proteger o «seu» povo. «Esteja onde estiver olharei por vós», disse.
A complexidade da sua personalidade continua a ser uma mina de ouro para quem com ele conviveu. Quatro livros e dois novos filmes assinalaram o décimo aniversário da sua morte. Um dos livros - C’était François Mitterrand (edições Fayard) - é assinado pelo seu «conselheiro especial», Jacques Atali. Outro é da autoria do grande rival de Mitterrand na luta pela liderança do PS, Michel Rocard, que ajusta as suas contas pessoais com o homem que o derrotou em Si la gauche savait (Se a esquerda soubesse, Robert Lafont). Mesmo o seu psicanalista, Ali Magoudi, revelou as confidências do seu ilustre paciente em Rendez-vous - La psychanalyse de François Mitterrand (Maren Sel Editeurs).
E elas são espantosas! Até agora só se conhecia a faceta de Mitterrand apaixonado pela vidência, mas não se sabia que ele também tinha feito psicanálise durante nove anos. Magoudi, acusado de violar as regras deontológicas da profissão, descreve tudo. Não só a vida política, como a pessoal: o segredo sobre Mazarine, o cancro que escondeu aos franceses fazendo publicar relatórios médicos falsificados, a amizade com criminosos envolvidos há 60 anos em rusgas contra os judeus.
Uma das revelações mais espectaculares envolve a ex-primeira-ministra britânica, Margaret Thatcher, e a guerra das Maldivas. Mitterrand teria dado a Thatcher os códigos dos mísseis franceses utilizados pelas forças armadas argentinas porque a «dama-de-ferro» ameaçava utilizar a bomba atómica contra a Argentina! Depois teria confessado ao psicanalista: «Mas ela vai pagar isso - vou destruir-lhe a sua ilha, vou construir um túnel sob a Mancha!».

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