Resumo de Jornada do Herói bipolar

A vida é uma longa jornada. E nós somos os heróis. Num instante estamos quietos, em paz, à espera do tempo. O tempo, vilão sedento que não espera. O tempo é impaciente, e seus olhos brilham na escuridão. Enquanto ficamos sentados diante de uma tela de raios catódicos, o tempo, o tempo se espalha, o tempo rola no chão. O tempo ri.
E nós ali, impávidos, ignaros, desatentos.
Mergulhados em nosso mundo comum, nossa vida comum, sonhos comuns, o comum comum que nos abraça, cobre, estrangula.
E ali ficaríamos, não fosse o tempo, que acorda e grita: levanta-te, herói. Tua jornada te espera. Então eu ergo a cabeça, olho dentro dos olhos do tempo, e mudo o canal da TV.
E esqueço o tempo, o tempo que se encolhe e se esconde embaixo da cama, choramingando. Ofendido, magoado, triste. O tempo não esperava isso de mim.
Mas o que esperar de mim? Eu, que recuso o chamado, que me contento em viver minha vida de fantasias mal iluminadas, catalogadas uma a uma no jornal das desventuras toscas?
Não, não somos heróis. Somos pais cansados, amigos ludibriados, amantes desenganados.
Somos filhos da inércia desses tempos de amargura.
Sozinhos em nossas casas, perdidos. Às vezes olhamos nos olhos de nossos filhos, pais, amigos e nãos os reconhecemos. Muitas vezes nem à nós mesmos nos reconhecemos!
Estamos feridos. Crianças feridas, eis o que somos.
A jornada é longa e nosso espírito está cansado. Em algum lugar da estrada, nos perdemos. Ficamos pelo caminho entre um sonho despedaçado e outro e ali fixamos a residência de nossas alma.
Não, não somos heróis. Somos reis cujo trono, o sonho, foi usurpado pela malícia dos senhores da guerra. E nos resignamos ao fracasso, apoiados em nossas muletas. Nos trancamos no quarto para lamber as feridas. As feridas que nunca curam.
É por isso, a TV. Trocamos de canal como loucos. É por isso a internet. Clicamos aqui e ali, desesperados. Procuramos algo. Sim, a cura. Procuramos a cura para nossas feridas mais íntimas. E não encontramos nada.
Não, não somos heróis. Somos mentores amputados. Somos como canções esquecidas. Somos poemas não escritos.
Nós. Amigos que ninguém mais visita, livros que ninguém mais lê.
Se houvesse outra vida para viver, nós a viveríamos. Enfiaríamos uma bala em nossa cabeça e deixaríamos para trás. Mas nem isso. Somos fracos. Leões cansados. Anjos extorquidos.
Não temos mãe. Somos filhos da angústia de nossos tempos. Vez ou outra, algum de nós até vai até a janela e olha para o sol beijando um jardim de flores mortas. E se atira da janela.
E então alguns dizem que somos loucos. Nada mais. Apenas loucos.

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