A crise no jornalismo
(Lucas Ito; Lígia de Azevedo)
A crise do jornalismoA procura de uma nova identidade profissionalEdson Kameda O reconhecimento do jornalismo como profissão, ocorrida no início do século XIX, resultou na criação de normas e códigos de ética para nortear as funções deste profissional. No entanto a evolução da sociedade determinou naturalmente novos rumos para essa categoria. No passado os profissionais de jornalismo ficaram conhecidos como “cães de guarda”, os “olhos da sociedade”, entre outras denominações. Todas essas qualificações geraram aos jornalistas uma vaidade que os levaram a acreditar que estavam isentos a críticas e questionamentos. Mas a sociedade não parou de se modificar. A lógica capitalista exigiu o enxugamento das redações, as informações se transformaram em produto, e conseqüentemente surge a necessidade de produzir maior número de notícias em menor tempo com menor número de profissionais. Outro fator é o avanço tecnológico da internet. Qualquer indivíduo, com alguns pares de cliques do mouse, verificar qualquer informação e também publicar suas idéias, relatar um fato, denunciar, opinar sobre qualquer assunto e atrair um número significativo de seguidores. Aquela velha máxima de que o jornalista seria o especialista em generalidades parece não se sustentar mais, frente à complexidade das inter-relações entre indivíduos e entre instituições de toda natureza que ocorrem na atualidade. No entanto ainda restam resquícios daquela visão “glamourizada”, de que a profissão de jornalista tem como a premissa básica o cumprimento de uma missão na sociedade, seja ela contra as injustiças sociais, desvelar crimes ambientais, denunciar falcatruas, desmentir as autoridades etc. Muitos alunos dos primeiros semestres dos inúmeros cursos de jornalismo ingressaram na faculdade motivados por essa visão distorcida de jornalismo romântico. Talvez o cinema tenha contribuído para a formação desse senso comum, essa imagem “congelada” do jornalista herói que muda o curso da história. Podemos citar aqui alguns filmes desse gênero como “O Quarto Poder” - o jornalista que recupera o seu censo ético durante uma reportagem e tenta fazer justiça, “O Informante” - contra a falcatrua da indústria de tabaco e principalmente “Todos os Homens do Presidente” que a partir de uma noticia policial, a investigação jornalística provoca a renúncia do Chefe de Estado do país mais influente no cenário mundial, os Estados Unidos. Neste referido filme, uma produção norte-americana de 1976, baseado no livro homônimo escrito pelos próprios protagonistas da história real, os repórteres do Washington Post, Bob Woodward e Carl Bernstein, mostram um caso específico dentre milhares de acontecimentos, como um ideal da prática jornalística, tanto na relação do repórter com os fatos e as fontes, como também o apoio e a confiança que recebem do seu chefe imediato, que tem uma atitude quase paternalista, orientando-os e defendendo-os junto à direção do jornal. Fato bastante raro no mundo atual, onde o veículo prima pelo não confrontamento das autoridades constituídas e velocidade na produção de matérias. É improvável que o fazer jornalístico dos protagonistas retratado no filme, tais como reconhecer a própria limitação de texto (Woodward), não confiar em uma só fonte mesmo que seja considerada “segura” (garganta profunda), questionar as fontes incessantemente etc., sejam praticados por jornalistas recém formados, pois a atual grade curricular privilegia as disciplinas técnicas em detrimento das sociológicas, antropológicas e filosóficas, fundamentais para o desenvolvimento do censo crítico, sem o qual é impossível farejar qualquer anomalia dentro dos inúmeros fatos que ocorrem diariamente na sociedade. Apesar do enredo do filme ser baseado em fatos, ele não reflete a realidade diária nem histórica do jornalismo. Vide o caso Collor, quando no início do processo parte da imprensa não noticiava as manifestações, a Escola Base - cobertura completamente equivocada, o “mensalão”, o “mensalinho”, o caso “Dirceu” etc. A imprensa continua “em paz” com as autoridades e com a sociedade como se nada de grave tivesse ocorrido. Segundo os teóricos da área de comunicação como Marcondes Filho, Eugenio Bucci e outros, a função social do jornalista vem se modificando ao longo do tempo, tais como: atender as necessidades das autoridades constituídas, contestar as mesmas, difundir ideologias políticas e, mais recentemente, atender à necessidade do mercado como medida para a auto-sustentação econômico-financeira das empresas de comunicação. Pelo menos aqui no Brasil, os veículos de comunicação não se posicionam em relação a nenhum partido político concordando ou discordando de suas ideologias, pois isso restringiria o número de seus leitores. Adotam o critério de mercado para agregar o maior número de leitores. Atacam, vez ou outra, algumas atividades ou atitudes do governo ou da oposição para mostrar o inexistente critério da objetividade e neutralidade. Combater a injustiça social, denunciar falcatruas, fiscalizar o poder são belos ideais para se carregar enquanto cidadão atuante dentro de uma sociedade, mas não é necessário ser jornalista para isso. Basta acreditar que esses objetivos podem contribuir para a construção de uma sociedade mais justa, e agir de acordo com elas, em qualquer que seja o ramo de atuação. Quanto à necessidade de uma graduação para formação de um bom profissional, ela é desejável até para o cozinheiro que o nosso Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes citou no seu infeliz comentário, na ocasião da quebra da obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista. Recuperar o glamour da profissão de jornalista de outrora, nos parece bastante improvável neste cenário social onde os integrantes são considerados consumidores antes de indivíduos, mas carregar uma ética que valorize o ser humano e o bem estar da coletividade é uma prática válida para qualquer profissão, inclusive para os jornalistas.
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