O Sentimento de Culpa
(Paulo Sergio Rosa Guedes e Julio Cesar Walz)
Os psicanalistas Paulo Sergio Rosa Guedes e Julio César Walz esmiúçam “O sentimento de culpa” de forma acessível ao público em geral. É uma obra extremamente bem estudada, elaborada, pensada e aberta. Por isso, aqui pretendo apenas registrar impressões que me ocorreram ao lê-la, e não necessariamente resumir o que foi dito pelos autores - o que até acho impossível ante a objetividade e clareza de ambos.
Onipotência e culpa andam juntas e antecedidas por uma sombra chamada medo. O medo, em especial dos próprios desejos ou até de desejar, uma emoção básica que faz paralisar, recuar ou avançar, pode gerar como defesa o sentimento de onipotência e o conseqüente sentimento de culpa.
Assim, se o sujeito pode tudo, quando falha em relação a si e ao outro, sente-se culpado por isso. O inverso é a responsabilização por não poder tudo em relação a si nem aos demais e, embora tema as conseqüências disso, sabe lidar com elas de forma a não adoecer e morrer em razão delas.
Na obra, há insights que dificilmente um analisando alcançará durante seu tratamento clínico. E muito provavelmente, por vários motivos, o analista não oferecerá ao seu cliente. Por quê? Porque muitos chegam à clínica com esta queixa, em especial por ser a culpa um sentimento fundante da civilização regida pelas religiões judaico-cristãs - este conceito há que ser revisto, uma vez que o cristianismo, por exemplo, nada ou pouco tem a ver com o catolicismo que infunde a culpa e o seu reverso como o paraíso dado por um outro.
Nas religiões orientais e adjacências ocidentalizadas (Espírita-Kardecista, por exemplo), em lugar da culpa, o sujeito é chamado ao seu oposto, à responsabilização pelos seus atos e pensamentos (lei de ação e reação), de forma que o paraíso de cada um pode ser alcançado independente de um “outro” bom/mau, julgador/punitivo.
A culpa pode ser estruturante e organizadora do fucnionamento psíquico de um sujeito que, mesmo queixando-se deste gozo no sofrimento, viveu boa parte de sua jornada às voltas com o não-desejo - pode-se dizer que o desejo vincula-se aos princípios do prazer e da realidade (amor), enquanto o gozo, mortífero, está para além do princípio do prazer (paixão, doença, morte).
Uma das atribuições mais caras à psicanálise é possibilitar que pela fala o sujeito descubra, se aproprie e se responsabilize pelos seus desejos, e assim pare de culpar a si e aos outros. Uma via bastante sutil de tratar a culpa, parte da terapia talvez mal-percebida pelos que freqüentam o divã. E assim, ao ler a obra de Paulo Guedes e Julio Walz, pode-se ficar com a impressão de que os psicanalistas são “devedores” de seus pacientes neste quesito, o do tratamento da culpa.
Mas, imagine um sujeito habituado a andar apoiado por muletas, desde a infância, e que de repente vê-se privado delas. Provavelmente, cairá descrente de que possa se reerguer pelo seu próprio desejo – até porque o desconhece - e não mais pelo sofrimento causado pelas muletas.
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