Aprender a Viver
(Luc Ferry)
A finitude humana e a questão da salvação. Esta é a ideia central que a obra do filósofo francês Luc Ferry, Aprender a Viver, nos traz, instigando-nos a pensar em filosofia não sinteticamente, mas sim, analiticamente e de um modo mais profundo que o usual. Para o autor, a filosofia é erroneamente definida como um método de pensamento rigoroso, conceito que considera deveras generalizado, e nos dá as ferramentas para fazermos a nossa própria leitura da questão. No primeiro capítulo do livro, Ferry apresenta o ser humano como o único animal consciente de sua própria finitude, sendo, portanto, naturalmente impelido a questionar-se sobre essa inquietante verdade e a buscar formas de livrar-se do inexorável fim, na maioria das vezes, por meio de religiões que lhe dão a garantia de salvação. Salvação esta que, segundo o filósofo, é extremamente almejada por tantas pessoas pelo fato de oferecer um caminho alternativo à morte como um fim definitivo, por ser uma espécie de continuação da vida para aqueles que têm fé. Para Ferry, é exatamente neste ponto que religião e filosofia tomam caminhos opostos. Segundo ele, "(...) Se as religiões se definem como doutrinas da salvação por um Outro, pela graça de Deus, as grandes filosofias poderiam ser definidas como doutrinas da salvação por si mesmas, sem a ajuda de Deus.". Em suma, a filosofia seria um caminho racional para a compreensão do mundo e do outro por meio de nossas próprias forças e sabedoria. Apesar de usar uma interessante linha de raciocínio, Ferry equivoca-se ao igualar em nível de comparação, filosofia e fé, como se fossem apenas correntes distintas para a busca de um mesmo objetivo (a salvação). Os principais erros cometidos por ele foram colocar religião e razão como elementos opostos e, também, usar apenas a lógica para a explicação de algo sobrenatural. Imaginemos a seguinte situação: um robô dotado de inteligência, mas desprovido de emoções, decide descobrir o que é o amor. Procura nas melhores bibliotecas do mundo livros que falem a respeito do exótico sentimento, assiste a filmes românticos e entrevista casais apaixonados. Porém, hormônios, olhinhos brilhantes e corações desenhados de forma anatomicamente errada não o tocam. Para esta máquina, PhD em amor, o ser humano sempre será um animal irracional quando em poder deste quixotesco sentimento. A metáfora é muito clara: para entender a fé, ou melhor, para senti-la, devemos nos despir de toda nossa arrogância característica e buscar sentir a sua essência e não ficarmos observando tudo de fora, como expectadores alheios a um fenômeno que sempre nos parecerá distante. Não se trata de abandonar a razão, mas entender que há coisas que, mesmo não podendo ser provadas pela lógica ou vistas pelos olhos humanos, são muito mais reais e racionais que as certezas ditas absolutas. Há um outro ponto do texto que merece um maior esclarecimento: a salvação, segundo o cristianismo, não é garantia de vida eterna, mas sim, vida eterna com Deus. A eternidade existe para todos aqueles que têm alma, sem exceção. Por isso, aqueles que desejam a salvação querem, antes de tudo, ficar eternamente juntos ao autor do amor, porque já experimentaram de sua infinita graça. E o que é a sabedoria? Para Luc Ferry, ela seria equivalente à "salvação" para a filosofia. A única saída racional para as angústias que nos assolam. O filósofo deixa transparecer um traço de arrogância ao apropriar-se, de certo modo, do conceito de sabedoria, ao restringi-la a uma forma de pensamento. Estou convencida de que mesmo que alguém detivesse todo o conhecimento do mundo (filosófico, inclusive), isto não seria suficiente para estancar sua fonte inesgotável de inquietude. De desorientação. As perguntas inevitáveis são: e se tudo isso tiver uma razão maior? E se já nascêssemos com esse vazio, essa inquietação interior, por um motivo? E se esse motivo for buscar a salvação, o amor verdadeiro? E os mais incautos perguntariam: mas por que Deus ainda não nos mostrou a verdade em nítidas cores? Não apareceu para nós? Não nos mostrou a verdade em nítidas cores? Ora, certamente Deus não queria robôs programados, gados marcados. Ele nos deu escolhas. Isso sim é liberdade. Luc Ferry foi feliz, de certa forma, ao levar-nos a questionar. Todos nós precisamos fazer o uso da razão. Mas a questão aqui não é fazer perguntas. É fazer as perguntas certas. Talvez isto seja sabedoria. Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens (I Cor. 1:25).
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