Fase documental: a memória arquivada
(Paul Ricoeur)
“Fase documental: a memória arquivada” é a primeira seção do capítulo II (“História / Epistemologia”) do livro de Paul Ricoeur A memória, a história, o esquecimento (Campinas: UNICAMP, 2007. p. 155-92). Tanto nessa seção quanto na obra como um todo, Ricoeur utiliza a noção de pharmakon, do Fedro, de Platão, para problematizar a questão da memória, do documento, do arquivo e da história, a exemplo da pergunta que lança na página 192: “[...] a prova documental é mais remédio que veneno para as falhas constitutivas do testemunho?”. Em uma leitura com interesses de pesquisa específicos, destaco três momentos principais do texto. Primeiramente, quanto à noção de “inscrição”, em contraste à de “escrita”, do modo como Ricoeur propõe nas páginas 155 e 156. Em segundo lugar, as noções distintas de “fato histórico” e “acontecimento”, conforme o trecho transcrito a seguir: “Será tão necessário resistir, quando tratarmos mais adiante da explicação e da representação, à tentação de dissolver o fato histórico na narração e esta numa composição literária indistinguível da ficção, quanto é preciso recusar a confusão inicial entre fato histórico e acontecimento real rememorado. O fato não é o acontecimento, ele próprio devolvido à vida de uma consciência testemunha, mas o conteúdo de um enunciado que visa a representá-lo” (p. 189-90). Finalmente, a apresentação sucinta, com promessa de aprofundamento na seção 3 (“A representação historiadora”) do mesmo capítulo, da noção de “representância”, como se encontra nas páginas 190 e 191, a saber: “Tal como dizemos? Eis toda a questão. E ela nos acompanhará até o final do estágio da representação, onde encontrará, se não sua resolução, ao menos sua formulação sob a rubrica de representância. Até lá é preciso deixar indeterminada a questão da relação verdadeira entre fato e acontecimento, e tolerar certa indiscriminação no emprego de um termo pelo outro por parte dos melhores historiadores” (p. 190). A seguir, aspeados, alguns trechos que me interessam de modo imediato para pesquisas na área de literatura e que, de modo meramente diplomático, transcrevo para futuras referências. Nas “Notas de orientação”: “O terminus a quo ainda é a memória apreendida em seu estágio declaratório. O terminus ad quem tem por nome a prova documental” (p. 155). Na subseção I – “O espaço habitado”: “A inquietante estranheza – Umheimlichkeit – ligada ao sentimento de não estar em seu lugar mesmo em sua própria casa nos assombra, e isso seria o reinado do vazio” (p. 158). / “Cada novo edifício inscreve-se no espaço urbano como uma narrativa em um meio de intertextualidade. [...] A cidade se dá ao mesmo tempo a ver e a ler” (p. 159). Na subseção II – “O tempo histórico”: “A própria brevidade da vida humana recorta-se sobre a imensidão do tempo crônico indefinido” (p. 164). / “O nascimento de Cristo para o Ocidente cristão, a Hégira para o islã” (p. 167). Na subseção III – “O testemunho”: “Com o testemunho inaugura-se um processo epistemológico que parte da memória declarada, passa pelo arquivo e pelos documentos e termina na prova documental” (p. 170). Na subseção IV – “O arquivo”: “O momento do arquivo é o momento do ingresso na escrita da operação historiográfica. [...] Nos arquivos, o historiador profissional é um leitor” (p. 176). Na subseção V – “A prova documental”: “Rastro, documento, pergunta formam assim o tripé de base do conhecimento histórico” (p. 188-9). / “Uma crise da crença, que nos autoriza a considerar o conhecimento histórico como uma escola da suspeita. [...] Pode a história romper todas as suas amarras com a memória declarativa?” (p. 192).
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