Conflito no Egito
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Parece que Tutankamon se mexeu no túmulo um dia desses, exatamente o dia 25 de janeiro, depois de milhares de anos usufruindo do seu sossego faraônico no museu do Cairo. Se ele foi até a janela para olhar por cima dos ombros da cerca humana que protegia o museu dos saqueadores, certamente não acreditaria no que estava acontecendo do lado de fora, na praça Tahrir. O ruído ensurdecedor provocado por uma multidão de súditos, cerca de 30 mil pessoas, pedindo e exigindo que o faraó atual se mande para outras plagas depois de 30 anos de ditadura sob a égide do Partido Nacional Democrático (PND) fundado em 1978 pelo antecessor de Mubarak, Anwar Sadat assassinado em 1981. Hosni Mubarak, 82 anos, pelo jeito que a coisa vai não terá direito a nenhuma pirâmide tumular como seus milenares predecessores, ainda mais depois que ele disse a TV americana ABC numa entrevista de 20 minutos à reporter Christiane Amanpour, que está " de saco cheio e que só não deixa o poder agora por temer que o país afunde no caos". Sua fala no entanto sugere mais que seja uma estratégia sua para acalmar os ânimos acirrados sinalizando que além de querer mesmo sair, é uma outra maneira de dizer que está aberto ao diálogo.
Pelo menos, até onde se saiba, a figura mais bem aceita pela comunidade internacional é o seu general vice-presidente Omar Suleiman, lider da inteligência e segurança do Egito há 18 anos. Ele já afirmou algumas coisas alentadoras para o povo e o mundo: Mubarak não vai concorrer a um oitavo mandato seguido nas eleições presidenciais marcadas para setembro deste ano; um forte candidato à sucessão era Gamal, filho de Mubarak, que também não vai mais concorrer e ainda há até a possibilidade de se antecipar as eleições para agosto. Mas o povo quer que ele saia já, tanto é que no dia 1 de fevereiro, a praça já tinha 250 mil egípcios. O governo não ficou de braços cruzados, tipo deixa como está para ver como é que fica. Mandou tanques para rua, aviões sobrevoando a multidão e até obrigou a empresa britânica de telefonia celular Vodafone a enviar mensagens de celulares favoraveis à ditadura, e assim mobilizar seus simpatizantes para um confronto com os manifestantes na praça. Pior, mandou cortar as linhas de internet e só retrocedeu porque Barack Obama indicou que o Egito como aliado recebe anualmente cerca de 1,5 bilhões de dólares. A internet é, por assim dizer, uma espécie de direito da humanidade indo além dos direitos individuais. Se os egípcios fosse depender dos meios convencionais de comunicação ficariam à mercê da máquina governamental.
Entre pedras, prisões de jornalistas e alguma pancadaria, após 12 dias de conflito, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos calculou que pelo menos 300 pessoas morreram e 4.000 ficaram feridas nos confrontos entre manifestantes e forças de segurança. Para que as coisas se efetivem e se acalmem, há necessidade de um diálogo político com as forças de oposição em que a mais polêmica é a chamada Irmandade Mulçumana que hesita em conversar, dando a entender que prefere uma postura mais radical e islâmica do que quer o povo. Outros cinco partidos tem menor expressão. Essa Irmandade jura de pé junto que não segue o Hamas e a Al Qaeda, e para provar isso, disse que se chegarem ao poder não obrigarão as mulheres a cobrir a cabeça com o véu.
A Irmandade foi fundada em 1928 e, é um misto de partido político e grupo de assistência social , e uma das mais organizadas forças de oposição. Oficialmente banida, mas na prática tolerada por Mubarak, a Irmandade defende que as leis do Estado derivem do Corão, livro sagrado do Islã. Em 1948, o grupo já possuía 500 mil membros e se ramificou em outros países, mas foi colocado na clandestinidade em 1954 acusado de participação em tentativa de assassinato de Nasser. Na atual onde de protestos tem optado por não assumir a liderança da oposição para evitar represálias das potências ocidentais, que veem no movimento uma ameaça . Consta que tem origem nessa Irmandade o segundo homem da Al-Qaeda. Segundo um estudioso do Council on Foreign Relations, Ed Husain, o grupo " não compartilha a visão americana sobre a arquitetura de segurança na região e é fortemente anti-Israel".
Este é um movimento sem liderança, formado por jovens da classe média e inspirados na queda do regime da Tunísia e quer mais igualdade e democracia. Considera-se a internet como fator crucial de mobilização. .A revolta pelo democracia no Egito já contaminou a Argélia pois o governo levantou o estado de emergência em vigor desde 1992 e no Iemen, milhares foram às ruas. O grito não é por pão,, é por liberdade.
Barack Obama confirmou que está negociando uma transição de governo em que poderia assumir o vice egípcio Omar Suleiman até eleições em agosto. Mubarack está com câncer e octogenário e idéia de entregar o poder ao filho também não agradava seu vice de 74 anos. Considerado um negociador hábil e oriundo das Forças Armadas que até agora tem adotado um comportamento entre o claudicante e neutro, muitos admitem que somente seria capaz de manter o Exército unido e assegurar a transição. Pelo jeito Tutankamon só descansará a partir de agosto. Esperar para ver.
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