O PADRE MOTARD
(José Fernandes Lambelho)
Nascido beirão, mais exactamente, entre a serra da Gardunha e a serra da Estrela, numa família pobre de agricultores, cedo começou a guardar o rebanho quando chegava da escola e era preciso dar uma ajuda na quinta dos pais. E era nesses momentos que se deixava embalar nas suas divagações e dúvidas, questionando-se se haveria mais mundo para além daquele que os seus olhos abrangiam! E se havia, como seria? Nunca teve grande oportunidade de o saber até enquanto durou a instrução primária e algumas vezes provou o «sabor» da palmatória que o professor não se fazia rogado em usar. Terminada a quarta classe começou a sonhar com voos mais altos. Se fosse para a tropa como os irmãos, teria de ser ele a mandar nos outros para ter outra posição na guerra do ultramar. Mas para isso teria de ter estudos e essa era a questão mais difícil de resolver. Só havia uma forma: ir para o seminário, mas os pais não podiam pagar. Com a ajuda do padrinho entrou no seminário, mas as saudades dos pais, da quinta, foram muitas e as notas ressentiam-se. Todavia, vencido que foi o primeiro ano a vida de seminarista começou a melhorar ao ponto de estar entre os melhores alunos até ao fim do curso, altura em que foi para Évora com o objectivo de definir a sua vida: ordenar-se padre ou iniciar a vida «civil». O sacerdócio não o entusiasmava e foi nesse período que namorou e conviveu com os jovens da sua idade ao som das canções de Zeca Afonso. Porém, passado o tempo de experiência, concluiu que, afinal, queria mesmo ser padre. Acabou o namoro, ordenou-se e iniciou-se como padre no Alentejo, passando mais tarde para o Algarve, onde lhe haveria de nascer o gosto pelas motos e onde se fez motard, primeiro incógnito, mas não por muito tempo. Breve foi descoberto e apontado e depressa começou a celebrar missa nas concentrações onde nunca deixava de estar presente e onde o seu lema «Boas Curvas se Deus quiser» entusiasmava os milhares de motards que o consideram um seu igual diferente. Um pouco desiludido com as políticas das dioceses portuguesas onde trabalhara aceitou o convite para ser pároco de uma comunidade portuguesa nos Estados Unidos. Aí conheceu a solidariedade, a amizade, sobretudo a partir do momento em que lhe foi diagnosticado cancro. Não se poupou a esforços a comunidade portuguesa, mas não foi possível a cura e o padre Zé Fernandes decidiu vir para a sua terra, onde ainda permanece em solidão vivendo da sua reforma de professor que foi porque da Igreja nada recebeu, nem sequer uma palavra de apoio. Essas quando chegam vêm das família e da comunidade americana que o acolheu na saúde e na doença e também dos muitos motards que ainda hoje continuam seus amigos.
Uma biografia interessante de um homem que deu tudo à Igreja Católica em Portugal enquanto padre e que da sua hierarquia recebeu somente indiferença, intriga e ingratidão.
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