O Dia da Saia
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Drama social. Professora de francês numa escola pública, Sonia Bergerac enfrenta diariamente os problemas da profissão: desinteresse e agressividade dos alunos, conflitos de gênero e de etnia, falta de apoio da direção da escola. Situação que chegou a tal ponto que, para entrar em sala, a professora precisa de tranquilizantes. Numa manhã, ao iniciar uma aula no auditório, descobre por acaso um revólver na mochila do aluno muçulmano Mouss, que a ameaça para ter a arma de volta. Ocorre um disparo e, num acesso de nervos, a professora tranca as portas e mantém os alunos aprisionados e deitados no chão, para enfim conseguir dar a sua aula. Do lado de fora, no entanto, o tiro foi ouvido, o que leva a direção a evacuar a escola e a chamar a polícia. Enquanto os ânimos acirram lá dentro, com manifestações de intolerância e até a revelação de um estupro entre os alunos, do lado de fora a chegada da imprensa, dos pais e da ministra do Interior torna a situação ainda mais tensa. Não devem faltar professores no Brasil que gostariam de, como Madame Bergerac, sacar de uma arma para poder lecionar em paz. Vivemos num tempo em que, mais do que o gesto ou a música, a arma tornou-se a linguagem universal. A ela todos escutam, e para com ela argumentar só portando outra igual a ela. No meio em que vivem esses alunos – e os nossos –, tudo é ameaça e insulto, e mesmo as relações amorosas se pauta pelo ódio. A casa, a rua e a mídia formam psicopatas, e todos esperam que a escola a todos receba e recupere. Ciente da impossível missão, a escola acaba cruzando os braços, como resume seu diretor no filme, após chamar os educadores de “babysitters sociais”: “Se expulsasse todos os que devia, esvaziava a escola”. Há quem tente reagir, e desista. Ou procure, através das pequenas conquistas, um dia vencer a guerra. Outros, acabam envolvidos pelas circunstâncias e, quando se dão conta, é tarde demais para voltar. Assim foi com a professora Sonia. Por mais que sua história caminhe para a tragédia, ela segue em frente porque não há mais o que ser feito, e alguma lição alguém terá de aprender. Por isso, quando a polícia enfim lhe indaga sobre as exigências para libertar os reféns, ela exige não só a imprensa, mas também que o ministro da Educação institua no país o “dia da saia”, para que as mulheres possam usar tal vestimenta (proibida na escola) sem “serem tratadas como putas”. Em tempos de “marcha das vadias” em Toronto e em São Paulo, nada mais atual. Quanto ao filme, O Dia da Saia (La Journée de la jupe, França/Bélgica, 2008) remete diretamente a obras americanas como Um Dia de Cão, clássico com Al Pacino, ou Um Dia de Fúria, com Michael Douglas, com o protagonista solitário que se volta contra o sistema corrompido. Como em ambos, há momentos bem narrados de tensão e diálogos fortes, méritos do roteirista e diretor Jean-Paul Lilienfeld. O filme comete, no entanto, os mesmos erros do citado Um Dia de Fúria, ao achar que o cotidiano enlouquecedor da professora não bastaria para um surto, adicionando à trama problemas pessoais como uma recente separação. O outro erro deve-se à reviravolta da narrativa nos momentos finais, com o tom melodramático, acentuado pela canção na trilha sonora, substituindo o alucinado e desesperado realismo de até então. A direção parece demonstrar mais segurança nos momentos dentro do auditório do que nas cenas “externas”, onde os conflitos políticos e sociais se repetem de forma excessiva, seja entre os populares diante da tela da TV, seja entre os policiais e a ministra do Interior. Destaque no elenco, e em qualquer coisa que faça, Isabelle Adjani realiza com este filme um bom retorno às telas (seu último filme data de cinco anos antes). Sua professora frágil e obstinada (poderia inclusive ser quase uma resposta à professora que interpretou junto a Sharon Stone, no fraquíssimo Diabolique), quando encostada na parede, encontra forças para reagir à altura, defendo não apenas a si mesma mas aos alunos que ficam na linha de fogo. Sua entrega ao personagem é visível em cada cena, indo desde a angústia ao falar no telefone com o pai, até a amalucada forma como obriga o aluno Mouss a repetir o nome de Molière.
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