Os Jardins de Luz
(Amin Maalouf)
Esta obra, de autoria do libanês Amin Maalouf, que por sua mão assinou outros títulos igualmente interessantes como “As Cruzadas Vistas Pelos Árabes” e “O Périplo de Baldassare”, reintroduz no nosso imaginário colectivo a figura representada pelo ser iluminado que Mani foi.
Nascido, embora não haja precisão na data, a 14 de Abril de 216, d.C., Mani desde cedo desfrutou de um íntimo contacto com a religiosidade dos Homens que, à época, pareciam desejar nela encontrar um escape às incertezas e aos receios que pairavam sobre uma desolada Mesopotâmia, inundada de conflitos entre Romanos e Partos. Assim que findou a sua idade de amamentação, foi levado de casa por seu pai (o mesmo que já antes havia abandonado sua mulher grávida, com a promessa de que apenas retornaria para consigo levar o filho que viria ao mundo) e com ele regressou para junto da ceita religiosa a que pertencia – os inflexíveis hallé hewarén, aramaico para “fatos brancos”. E foi nesse clima que Mani cresceu e se desenvolveu, apartado da realidade de um mundo que para além daquelas muralhas subsistia (apenas com 12 anos de idade é que soube quem sua mãe era), rodeado de dogmas e restrições, as mesmas que pareciam apelar tão fortemente ao coração de seu pai. Mas somente até ao momento em que atingiu a adolescência e descobriu o seu talento para a pintura.
Certo dia, ao debruçar-se sob uma superfície aquosa, num local de sua predilecção, com a mente plena de questões e sedenta de respostas, obteve a sua revelação. Aí mesmo, naquele reflexo, visionou o rosto da voz que o acompanharia durante o seu percurso futuro, a voz daquele a quem chamou de “gémeo” e “duplo”. Então, já com cerca de 24 anos, decide por fim escapulir-se daquele antro de imposições e engano, iniciando assim uma longa caminhada de anos e anos que o levou aos extremos do Império Sassânida da época, desde o rio Tigre ao rio Indo. Apesar de uma deficiência inata, que o levava a coxear ligeiramente, não se atemorizou pelo incerto e, guiado por uma força invisível – a fonte de sua certeza -, apreendeu as formas do mundo e o conhecimento dos Homens, para com eles formar e espalhar a sua mensagem, o que o levou a granjear fieis e dedicados discípulos.
Na realidade, a fusão das doutrinas de três díspares religiões numa só e a oferta de uma visão humanista e deveras conciliadora, devem colocar Mani na galeria dos grandes mestres e pensadores da humanidade, ora não fosse ele, naquela era, designado de “Buda da Luz”, na China, e, no Egipto, de “Apóstolo de Jesus”. Contudo, ao ter permanecido fiel a si próprio e à verdade que defendia, opondo-se à fúria de um Imperador facínora (ainda que estivesse prestes a abraçar os princípios de suas ideias), Mani assistia à condenação de seu legado. Após o seu encarceramento, tortura e morte, aos 58 anos de idade, seu corpo foi negado aos discípulos e, desde aí, sua obra foi votada ao esquecimento. Daí advêm o facto de tão pouco se saber acerca de tão iluminada pessoa, alguém de semeou sementes de conciliação e esperança, que queimadas haveriam de ser pelas mesmas chamas que devoraram seus escritos e restantes devotos.
É hora de relembrar Mani pela sua essência e palavra, tão crucial num mundo louco como este ainda o é, e esta obra fá-lo, tanto quanto ao seu autor foi possível. Afinal, após séculos e séculos de mentiras e deturpações, pouco mais se poderá afirmar sobre os pormenores de sua existência. Contudo, reaviva uma das suas mais fortes convicções: «Vim do país de Babel para fazer ecoar um grito pelo mundo». Resta-nos, portanto, preservá-lo para que ele não cesse; jamais.
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