Enter the Void
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Sinopse. Drama. Vivendo com a irmã em Tóquio, o jovem americano
Oscar é um traficante de drogas que, ao cair numa cilada armada pela polícia e
pelo sócio que o traiu, leva um tiro durante uma tentativa de fuga. Ao morrer,
seu espírito passa a flutuar sobre aqueles que lhe eram próximos, ao mesmo
tempo em que revê os acontecimentos de sua própria vida, desde a infância, até
que encontre um corpo onde possa reencarnar e sair desse eterno vagar no vazio.
Assim, Oscar relembrará o violento acidente de carro sofrido quando criança, em
que ele e Linda (a irmã) perderam os pais; o pacto feito logo depois, de jamais
se separarem; a ida para diferentes orfanatos e a mudança dele para Tóquio
onde, como traficante, conseguiu juntar dinheiro para trazer a irmã, não
conseguindo, no entanto, evitar que ela se tornasse stripper; até a traição
Victor, amigo e sócio que o denunciará após descobrir o caso que sua mãe estava
tendo com Oscar.
Comentário. Logo no início de Enter
the Void (Enter the Void, França
/ Alemanha / Itália / Canadá, 2009), Oscar comenta com o amigo Alex o livro que
este o teria emprestado, O Livro Tibetano
dos Mortos. Pois este livro é a base para o filme que o diretor
franco-argentino Gaspar Noé queria realizar desde que se tornou cineasta, só
conseguindo após o sucesso comercial de sua obra anterior, Irreversível. Fascinado por questões de vida após a morte e usuário
de alucinógenos, Noé pretendeu aqui reproduzir e compartilhar com o espectador
a experiência transcendente do “algo mais” que os espiritualistas esperam
existir além da carne, dedicando à narrativa um formato que pudesse ser comparado
aos sonhos e alucinações.
O resultado, é verdade, chama a
atenção. O que se vê na tela, depois dos rápidos, barulhentos e estroboscópicos
créditos iniciais, são tomadas longas e contemplativas, obtidas por uma câmera que
jamais fica parada e reproduz, até no piscar dos olhos, o ponto de vista de
Oscar. Da varanda de seu apartamento vê-se, lá embaixo, uma Tóquio sempre
noturna e iluminada por neons coloridos, sugeridos mesmo quando os personagens
estão nos interiores, pelas luzes refletidas nas paredes. A fotografia de
Benoit Debie é feliz na forma como expõe a luminosidade das ruas contrastando
com as sombras dos altos dos edifícios, seja nos momentos “normais” ou durante
os vôos do espírito sobre a cidade. A exploração dos sentidos prossegue no
silêncio que acompanha a maioria das cenas, e na trilha sonora formada por
ruídos e algum outro som melódico.
Logo no início há também a
“viagem” de Oscar que, sob o efeito de drogas, começa a enxergar formas
coloridas surgindo dentro do quarto e tomando todo o seu campo de visão,
transformando em outra coisa o espaço até então familiar. Impossível não se
lembrar de 2001: Uma Odisséia no Espaço,
filme do qual Noé é fã declarado. Tem-se então, em seguida à morte, a
demonstração de outro ponto de vista: agora Oscar vê a si mesmo, pelas costas,
revivendo todos os momentos importantes de sua vida até o tiro fatal. A câmera
é colocada atrás do protagonista, cujo rosto só aparece quando ele se vê no
espelho. Nova mudança ocorre quando o espírito, depois do flash-back, passa a acompanhar a vida da irmã e dos amigos, e a
câmera passa a ser colocada sempre no alto e em movimento, reproduzindo o
flutuar sobre as cabeças e lugares.
Sem dúvida, a narrativa é ousada.
Gaspar Noé quer buscar mais em sua arte, e não foge de desafios. No entanto, o
que sobra de deslumbre visual em Enter
the Void termina faltando em conteúdo dramático. O que há de originalidade
na maneira de contar a história, ou apenas, dado o aparente intuito de imprimir
o maior naturalismo possível a esta mesma história, acompanhar o desenrolar das
vidas dos personagens como num documentário do além, termina se perdendo (sem
trocadilhos) no vazio. A trama lenta e silenciosa, e os pontos de vista
desconfortáveis, se causam estranheza no início, logo se tornam cansativos demais
e o roteiro, com exceção de um ou outro momento forte (todos envolvendo Linda: o
acidente de carro, o pacto de sangue com o irmão, e, já adulta, o aborto)
parece se satisfazer com o papel de voyeur, sem qualquer interferência no
destino dos personagens. Pode-se argumentar que é justamente isto o pretendido,
reproduzir a trágica e monótona aventura de um espírito perdido que entra no
vazio do título, e que assim ficará, eternamente, enquanto o ciclo não se romper.
Ainda assim a excessiva metragem (e a controversa opção pela monotonia) não se
justificam.
Altos e baixos à parte, o “drama psicodélico” de
Gaspar Noé (a definição é do próprio) tem o mérito de, mesmo após encerrado,
permanecer na cabeça do espectador. Pena que jamais tenha sido exibido
comercialmente no Brasil, pois deve ser interessante conferi-lo na tela grande.
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