Cartas de Iwo Jima
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Cartas de Iwo Jima traz o novo trabalho de direção do consagrado Clint Eastwood, mundialmente famoso também como ator e importante produtor de cinema. Várias vezes aclamado por crítica e público, incluindo vários prêmios Oscar (mas nenhuma Palma de Ouro em Cannes), Eastwood resolveu filmar o tema mais polêmico de toda a sua carreira ao retratar, sob o prisma japonês, a invasão da ilha japonesa de Iwo Jima pelos norte-americanos nos estertores da 2ª Grande Guerra (1944-1945). Como em toda a Hollywood não dispomos de muitos filmes mostrando "o outro lado", Iwo Jima é um mérito em si mesmo. Parciais exceções podem ser feitas, por exemplo, a películas como "Lista de Schindler" e "Paciente Inglês", ambos valorosos, embora limitados na sua ótica ocidental que, invariavelmente, mostravam os combatentes do Eixo (principalmente Alemanha, Itália e Japão) como verdadeiros monstros a quem os Aliados (principalmente EUA, URSS e Inglaterra) vinham salvar das trevas. Desnecessário afirmar que as complicações sócio-políticas de um conflito da magnitude de uma Guerra Mundial rechaçam qualquer simplificação Bem X Mal como a citada acima. Também não faz sentido eclipsar o óbvio: do "lado de lá" também havia interesses, humanos com certeza, e como tal também havia sentimento, perda, desespero, esperança. Exatamente como cá. Nunca se tratou, no mundo real e nas guerras de toda ordem, de simplesmente matar semi-bestas, seres que chegaram até a ser estereotipados como estúpidos, egocêntricos, desumanos mesmo. É claro que os absurdos do nazi-fascismo foram muito além da simples dominação política, equivalendo muito mais a uma conquista absoluta (no sentido de única, exclusiva) de corações e mentes, e tal conquista acabou levando a um quadro extremamente grave de perversão social. Contudo, o mundo daqui viu, e infelizmente continua a ver, barbaridades e desmandos terríveis que nada deixam a dever a Mussolini, ou mesmo Hitler. Em uma palavra: a exploração não ostenta bandeira alguma. Nesse ponto o filme acerta em cheio. Nada de exageros. Os japoneses aparecem como gente comum, com seus sonhos mundanos e seu sentimento de dever tão característico. Este sentimento, calcado no mais fundo patriotismo nacionalista, pode ser apontado, inclusive, como leitmotiv da película. Fica sempre latente o desejo de morrer pela pátria, pois esta é a morte digna do combatente no Japão, terra dos kamikazes. Da mesma forma, as atitudes contrárias, como a deserção, são encaradas como faltas graves que merecem a exclusão e até mesmo a morte. Produção acurada, que inclui Steven Spielberg, ao longo do filme conta-se inúmeras belas cenas de guerra, pontilhadas de bem trabalhados (e bem verdadeiros) aspectos históricos, fundamental em um filme que se propõe a tratar de fatos históricos. A visão avançada do comandante das tropas japonesas na ilha, o general Kuribayashi, que constrastava com os antigos oficiais de então, e sua defesa da ilha por canais subterrâneos ao invés da habitual construção de trincheiras na costa levaram um conflito amplamente desfavorável a ter um desfecho relativamente atrasado, com grande número de baixas nos dois lados a despeito de toda a supremacia terrestre, naval e aérea dos norte-americanos. Contudo, e desde o primeiro instante, pode-se imaginar as conseqüências do duelo, mesmo sem qualquer conhecimento histórico posterior, e nisto também a direção não falha. Todos os japoneses dispostos na ilha têm a sensação de morte eminente. Até mesmo a carta oficial do governo imperial do Japão incita-os a "lutar até a morte". O próprio campeão olímpico de equitação (japonês) faz sua menção à luta desesperada pela honra. Porém, a balança da guerra já havia pendido decisivamente para o lado dos Aliados já há alguns anos. O sangue soviético, com mais de 20 milhões de mortos, já havia lavado o caminho para o fim da 2ª Guerra. Restava apenas saber em que termos se daria a "partilha do mundo" do pós-guerra e, nesse ponto, os EUA não se fizeram de rogados. Cite-se apenas o estúpido uso das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, jogadas num país que, ainda que não entregue completamente, não tinha qualquer condição de combate a não ser através da desesperada estratégia kamikaze. A prova da supremacia estadunidense estava dada, para assombro do mundo, até a URSS apresentar a sua própria bomba em 1947 e iniciar a alta escalada da Guerra Fria. Por fim, mas não menos importante, parece faltar a este bom filme algo que o destaque dos demais. Algo diferente, que retrate de forma mais pessoal, mais humana as condições dramáticas do seu enredo histórico. Fica a sensação de que faltou "capricho", por falta de palavra mais adequada. Na mesma medida, um filme do mesmo tom do "lado de cá" teria nuances e toques de drama, alguns muito exagerados sem dúvida, a elevar o tom e meio que fazer esquecer a guerra, revelando tão somente o belo lado da humanidade. Basta ver, somente a título de ilustração, que não há qualquer citação explicativa pós-filme, nem aparecem cenas do desfecho/significado daquela batalha, tão trágica para a Terra do Sol Nascente. Quase como se estivéssemos vendo um incidente isolado, sem causas ou conseqüências muito graves. A poesia do filme, por assim dizer, fica limitadíssima a alguns quadros, como o que dá título ao filme e mostra a descoberta de cartas enterradas na ilha, com sussurros fazendo as vezes de vozes, vozes que nunca chegaram ao seu destino.
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