Teoria da Vanguarda
(Peter Bürger)
Neste
texto o pensador marxista Peter Bürger pretende analisar sob uma
perspectiva sociológica e materialista a formação histórica da
ideia de autonomia na arte. Ele começa por opor duas visões
paradoxais sobre o conceito: a primeira de que a arte pode ser
independente da sociedade, ideia que não se sustenta – ela, como
todo o resto, é produto de um processo histórico-social; o outro de
que, sendo condicionada pela sociedade, a autonomia seria uma
fantasia dos artistas e uma mera ilusão. Procura então construir
uma terceira alternativa, a partir de alguns estudos que dão uma
descrição histórica para a gênese da arte burguesa autônoma.
Segundo alguns autores a arte teria adquirido esse caráter devido à
“continuidade do modo de produção artesanal do artista, mesmo
depois do advento da divisão histórica do trabalho”
(B. Hinz, p.83). E, segundo Winckler, não produzindo mais sob
encomenda e dentro de uma corporação, mas individualmente e para um
mercado anônimo, o artista teria maior possibilidade de exploração
formal e criatividade. Já Bredekamp se opõe a esse argumento
defendendo que seria, na verdade, o aumento da demanda individual
pela obra de arte, retirada de seu caráter ritual e sacro, que teria
propiciado o espaço para a independência criativa.
É impossível afixar causas definitivas para o surgimento do
conceito de autonomia, mas é certo que é um fenômeno
historicamente condicionado e que surge como um modo de
auto-valorização da consciência burguesa. Isso fica patente quando
Bürger analisa o formação da Estética como disciplina autônoma
na filosofia nos trabalhos de Kant e Schiller, pensadores que
incorporam e exprimem notavelmente o modo de pensamento burguês
racionalista e representam o auge do pensamento moderno. Kant define
o juízo estético ou de gosto, que seria a faculdade segundo a qual
o homem seria capaz de avaliar uma obra de arte, fundamentalmente
como algo desinteressado. Assim a arte fica por princípio
desvinculada da práxis vital e de qualquer responsabilidade social.
Interessante ainda notar o caráter universal que Kant atribui ao
juízo estético que, eventualmente, permite à burguesia européia
etnocêntrica admitir seus valores estéticos como universais e
justificar-se em suas atitudes hegemonizantes. Para além disso,
Schiller vê na arte, descolada da práxis vital, a finalidade de
realizar uma restauração da totalidade do homem. A construção que
faz do conceito de autonomia, ainda que leve em conta o caráter
histórico desse status, não admite sua contingência e vê nessa
autonomia a própria essência da arte, criando assim um ponto cego
na historicidade da experiência artística.
Os
movimentos europeus de Vanguarda vão buscar uma superação dessa
visão burguesa de arte descolada da práxis vital, procurando
torná-la prática e prosaica, incorporada na vida das pessoas e
protestando contra uma ordem vigente. Bürger faz uma crítica
tipicamente marxista a essa pretensão mobilizadora da arte moderna,
na medida em que crê que uma sociedade entregue à ordem capitalista
deve atingir tal grau de tensão que terá a revolução como destino
inevitável: “ao concretizar, na aparência da ficção,
a imagem de uma ordem melhor, alivia a sociedade estabelecida da
pressão das forças voltadas para a transformação.”
Conclui, enfim, que a arte vanguardista não supera a arte autônoma
sendo, também ela, incorporada pelos valores burgueses, mas tensiona
esses valores ao transfomá-la em práxis vital
libertadora.
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