A Era do Filme
(Arnold Hauser)
Num texto dinâmico e rico, o crítico literário Arnold Hauser
procura descrever as transformações sofridas pela arte no
pós-impressionismo dentro de seu contexto social, tecnológico e
teórico-filosófico, enfatizando a influência do advento do cinema
nessas transformações. O autor tenta caracterizar a relação das
massas com a nova arte, que a influencia intensamente, sendo seu alvo
tanto nas produções de cunho capitalista liberal como nas fascistas
e, de uma modo bem mais peculiar nas produções soviéticas. Nessas
últimas é notável como o cinema se manifesta como uma
representação das próprias massas, tendo nelas um de seus temas
principais. Enquanto naquela tende a representar a vida das elites
agindo como produtor de desejo capitalista e também como uma
catarse, aliviando as tensões sociais. Também as artes plásticas e
na literatura incorporam uma imagem da vida prática procurando criar
representações totalizantes da experiência humana. Hauser nota
também o uso utilitarista e ideológico do cinema fascista e do
russo e as possibilidades de traduzir-se conteúdo em forma através
das técnicas de montagem.
Um
dos temas centrais que conduzem todo o texto é a transformação
ocorrida na arte pós-impressionista que não se propõe mais
meramente representar o mundo. Ocorre agora um processo de 'absorção'
da realidade pela arte (p.1118)
que “Implica uma fuga angustiada de tudo o que é
agradável e dá prazer, de tudo que é puramente decorativo e
atraente”. Ele detecta também
a presença de uma tensão dicotômica e dualista nas obras das
vanguardas, do dualismo existencial (espírito – matéria) que se
desenvolveu na filosofia até Bergson que se traduz numa tensão
dicotômica formal – destruidora da forma na arte moderna.
Para
Hauser toda a arte pós-impressionista e, de forma muito particular o
cinema, ecoam o intuicionismo e a temporalidade bergsoniana. Para
Bergson a memória
guarda todas as experiências vividas que se atualizam constantemente
e participam da percepção presente, daí ele tira o valor da
intuição, a faculdade de julgar de acordo com essa percepção
empobrecida pela memória (empobrecida na medida em que ela exclui da
percepção aquilo que não é útil à ação). Nessa descrição
toda a duração está presente na memória e se manifesta na
experiência presente. “O que se acentua agora é a
simultaneidade dos conteúdos conscienciosos, a imanência do passado
no presente, o constante fluir simultâneo dos diferentes períodos
da vida, a amorfa fluidez da experiência interna, a ilimitabilidade
da corrente do tempo que arrasta a alma, a relatividade do espaço e
do tempo, isto é, a impossibilidade de diferenciar e de definir os
meios em que a mente se move.”
(p.1128). Isso é manifesto nas manifestações de simultaneidade do
dadaísmo, na escrita automática e na valorização do inconsciente
do surrealismo, na expressão instantânea do expressionismo. No
cinema, arte bergsoniana por excelência (como o dirá também
Deleuze), a mistura de fluxos temporais e espaciais, as narrativas
não lineares e os flashbacks,
o uso alternado de closes
e do grande plano transportam para a tela essa experiência
cinemática da memória como descrita por Bergson.
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