Habemus Papam
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Morre o papa, em 2005, e logo após o funeral se instala o Conclave que
elegerá o novo pontífice. Após algumas votações fracassadas, é nomeado papa o cardeal
Melville (Michel Piccoli) - o filme não
refere sua origem, nacionalidade. É anunciado à multidão que o aguarda na Praça
de São Pedro, e ainda nos bastidores tem uma crise de pânico. Não se mostra aos
fiéis nem muito menos faz discurso e abençoa o rebanho.
Enquanto estava protegido pelo Conclave, tudo bem. Quando teve
que encarar a realidade, recuou. Parece um rito de passagem adolescente para o
mundo adulto – mas, falho. Entra em cena, então, o psicanalista Brezzi
(Nanni Moretti), um ateu, chamado pelo porta-voz do Vaticano (Jerzy Stuhr). A primeira
experiência, de falar com o papa diante de todos os cardeais fracassa. A
segunda, a portas fechadas, também.
Só quando a ex-mulher de Brezzi, uma psicanalista (Margherita
Buy) é convocada, se inicia a análise de Melville. O papa começa a fazer
uma revisão da sua vida, desde os primórdios mais remotos de que se recorda, buscando
os motivos que o levaram até ali e se estão de acordo com o seu desejo.
Ele passa, aliás, a
questionar os próprios desejos ao longo da vida. Embora tenha que tocar um
rebanho mundial, na verdade nunca se misturou com qualquer rebanho nas ruas. Sente-se
só, mesmo em meio às multidões. Desamparo.
Para o psicanalista Brezzi, a crise de pânico teve como
fundamento o desamparo devido ao narcisimo de Melville. A onipotência
fantasiada não encontrou amparo psíquico na realidade, justamente no momento em
que mais precisava: falar ao grande público, não como um qualquer, e sim como o
dirigente máximo da Igreja Católica.
A depressão melancólica de Melville se relaciona ao fato de
ter desejado ser ator, de ter estudado e treinado para isto, mas sua mediocridade
não permitiu. Poderia ser mesmo apenas um clérigo? Foi o que lhe restou? A vida
vem cobrar as suas verdades, não sente-se capaz de ser o papa.
Respondendo à questão analítica, revela que não possui vínculos
afetivos íntimos. De onde se deduz que sublima a falta na religião,
tendo como pai, o Deus-Pai. E ainda assim não investe muita fé nesta aliança,
neste vínculo. Tanto que desiste de tomar o lugar do pai celestial na Terra.
Sai anônimo pelas ruas de Roma, interage com os mais
diversos tipos de pessoas, como a vendedora de loja chique, que se apieda do
velhinho desprotegido; o adolescente em um bar, que empresta o celular (já que
o balconista não atende ao seu pedido); padeiros na madrugada, que comentam com
ele especificidades sobre os pães e a rotina; entre outras personagens de um
cotidiano negado pelo Vaticano aos altos escalões.
A política do Vaticano é figurada, metaforizada. Cansado e
entediado por ter que esperar pela decisão do papa, Brezzi resolve fazer
terapia de grupo com os cardeais e depois dinâmica de grupo, mesmo sem eles se
darem conta. Separa os religiosos em times que representam continentes, os
treina e prepara um torneio de voleibol.
Enquanto na mesa de carteado, a portas fechadas, nos grupos
cada um jogava por si, ofendendo uns aos outros em uma espécie de competição
individualista (abandono e desamparo) e destrutiva (punitiva de culpas e
pecados, talvez), sem cooperação nem solidariedade, no vôlei entram em cena
preceitos cristãos (não necessariamente católicos apostólicos romanos...). No jogo de vôlei, volare!, a interdependência, a
solidariedade, a compaixão, o reconhecimento da importância de cada sujeito
para que se chegue a um resultado positivo para a equipe, entram na vida dos
papáveis. É o vínculo, mesmo que por meio do esporte, que os afasta da ameaça
de abandono e desamparo, como se o psicanalista mostrasse como se evitam as
crises de pânico. Ser imagem e semelhança de Deus, em sua última conseqüência, talvez
tenha evocado em Melville a realidade da impotência humana.
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