A CONTRATAÇÃO DE ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA POR PREFEITURAS
(guilherme camargo)
A contratação
de escritórios de advocacia por prefeituras ganhou relevo nos últimos anos em
razão do número elevado de ocorrências, os valores pactuados, a discussão sobre
a possibilidade ou não destas licitações excepcionais e os aspectos subjetivos
que permeiam estas relações.
O art. 37 da
Constituição Federal de 1988 foi redigido de forma a impor, como regra geral no
processo licitatório, a primazia da competição e os requisitos mínimos elencados
no art. 37, inciso XXI. Mas, mesmo o dispositivo citado prevê ressalvas em casos
específicos na legislação, hipóteses em que a licitação pública seria
dispensada ou inexigida, a fim de cumprir as especialidades dos objetivos
requeridos, o que levanta a polêmica acerca das licitações ou dispensa delas
nas contratações de escritórios de advocacia por prefeituras.
A ressalva
que se refere o tema está regulada pela Lei n.º 8.666/93, nos artigos 24 (incisos
II e IV) e 25, à contratação direta, ou seja, aquela que não exige licitação. A
regra geral exige a escolha da modalidade mais adequada, desde concorrência,
tomada de preço até carta convite.
As dispensas ao processo licitatório ocorrem sob a alegação da
hipótese de incidência do art. 25 da Lei n.º 8.666/93. Mas, na realidade, tais
contratos representam serviços que dizem respeito à simples consultorias
jurídicas costumeiras, cujos procuradores do município seriam plenamente
capazes de responder ou cuja realização prescindiria da realização de processo de
licitação regular.
A forma mais
adequada para a contratação de serviços advocatícios é aquela prevista no art.
25, II, § 1º c/c art. 26, § único c/c art. 13, II, III e V, todos da Lei
8.666/93, onde o profissional escolhido deverá possuir reputação ilibada e
notável saber jurídico.
Contudo, não
é isso que se observa nas contratações ao redor do país, sendo tais licitações
objeto de censura pelo Ministério Público.
As Ações Civis Públicas promovidas pelo MP contêm invariavelmente
pedidos subsidiários de devolução dos valores recebidos, o ressarcimento pelos
danos causados ao patrimônio público, à perda da função pública, à suspensão
dos direitos políticos por 8 (oito) anos, à proibição de contratar com o Poder
Público por 5 (cinco) anos.
A condenação dos réus, aplicando as sanções previstas no artigo 12,
II, da Lei 8.429/92, incluem a devolução ao município do valor do contrato de
prestação de serviço.
De outro
lado, a Lei n.º 8.906/94 impede que o advogado angarie ou capte clientes (art.
34, IV) e impõe o cumprimento dos deveres éticos sob as mais diversas penas,
conforme o Código de Ética (art.33). E,
sendo o advogado instrumento indispensável à administração da justiça, é
incompatível o exercício da advocacia com qualquer procedimento de
mercantilização (art. 5º).
Neste
contexto, os honorários devem ser fixados com moderação (art. 36), mas nunca
abstraídos ou em patamar inferior ao mínimo estabelecido pela OAB, devendo o
advogado evitar o aviltamento dos honorários profissionais (art. 41).
O Superior Tribunal de Justiça considerou
válida a contratação de escritório de advocacia sem licitação ante a natureza
intelectual e singular dos serviços, a moderação nos honorários e a relação de
confiança entre o contratante e contratado, elementos que legitimaram a
dispensa de licitação para a contratação de profissionais de direito. A
Primeira Turma do STJ decidiu que por motivo de interesse público, pode o ente
municipal fazer uso da discricionariedade que lhe foi conferida pela Lei n.º
8.666/93 para escolher o melhor profissional.
A justificativa é que o advogado se
enquadrava nas hipóteses excepcionais de inexigibilidade do processo
licitatório, pela experiência profissional e os conhecimentos individuais, a
moderação na quantia contratada. Eis um trecho do acórdão:
“A singularidade dos serviços prestados pelo advogado
consiste em seus conhecimentos individuais, estando ligada à sua capacitação
profissional, sendo, desta forma, inviável escolher o melhor profissional, para
prestar serviço de natureza intelectual, por meio de licitação, pois tal mensuração
não se funda em critérios objetivos (como o menor preço)” REsp 1192332
A sobrecarga de trabalho na rotina diária dos procuradores municipais
não é escusa legal prevista na legislação nem tampouco constitui motivo
razoável para as contratações irregulares e tão prejudiciais ao erário.
Algumas contratação chegavam a prever percentuais recebimento em
condenações favoráveis ao município, tornando os advogados verdadeiros “sócios”
do ente municipal ou chegaram a ter como valor global o importe de R$ 860 mil. Em
Minuçu (Goiás), as quantias a serem devolvidas perfaziam o montante de R$ 603
mil, sem prejuízo dos R$ 30 mil, a serem pagos individualmente, por danos
morais.
Não é incomum que tais escritórios de advocacia tenham prestado
serviços jurídicos expressamente ou não aos contratantes durante o período
eleitoral ou em suas respectivas campanhas eleitorais prévias. As contratações
futuras parecem compensações de favores privados com dinheiro público.
As praticas indicam invariavelmente o direcionamento da contratação,
baixa produtividade e fragilidade da descrição dos serviços tidos como
realizados, ausência de justificativa relevante, singular e emergencial para a
contratação. Na maioria dos casos são patentes as ofensas aos princípios da
moralidade, isonomia, eficiência e indisponibilidade do interesse público. As
exceções existem e são permitidas, como bem ponderou o STJ, perceptíveis
geralmente pela moderação dos valores recebidos, mas a regra geral é
assustadora, contratos com valores astronômicos e constituídos de forma processualmente
irregulares, visivelmente em descompasso com os interesses da população e
diametralmente opostos a proteção de qualquer interesse da municipalidade.
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