As orelhas do Abade
(António Torrado)
Neste conto tradicional português as personagens intervenientes são um casal (marido e mulher) e o padre ou abade da freguesia onde moravam.Era uma vez um homem que era muito bom caçador e, num dia de caça apanhou duas perdizes. No caminho para casa encontrou o abade e convidou-o para lhe fazer companhia ao almoço.Ao entrar na cozinha recomendou à esposa:- Tens aqui estas perdizes para arranjares guisadas, que daqui a pouco o Sr.abade vem cá ter para as comer comigo!- Está bem! disse a mulher. Enquanto as guisava, foi pensando de uma forma de as comer sem que fosse apanhada, pois estava raivosa por não a convidarem nem contarem com ela para provar o petisco. Depois de as ter arranjado, sem ninguém se aperceber, comeu-as.Passado um bocado batem à porta.- Oh da casa. O seu marido convidou-me para passar por cá! Disse o abade todo contente.- Fuja sr. abade! Fuja! Respondeu a mulher num tom de aflita.- O meu marido jurou aqui que lhe havia de cortar as suas orelhas e, isto, das perdizes e do petisco, foi só um pretexto para o cá apanhar!O abade não quis ouvir mais nada e respondeu à bela mulher:- Diga a ele que por aqui me sirvo!E foi-se embora a correr sem olhar para trás.Entretanto o marido chegou e ao ver a esposa sozinha perguntou:- Então e o padre onde esta?A mulher respondeu num tom irônico:- Olha ele esteve aqui e esperou por ti, esperou, esperou mas como tu não vinhas foi embora e levou as perdizes com ele.O caçador foi a correr até à porta da rua e viu o abade a correr ao longe. Começou logo a gritar:- Óh senhor abade, pelo menos deixe-me uma!O padre a pensar que ele estava a falar das orelhas respondeu:- Nem uma nem duas! - respondeu ele lá de longe.
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