A Madona
(Natália Correia)
Quando peguei num exemplar desta obra, não esperava demorar tanto tempo a terminá-la. Uma das poucas coisas que sabia de Natália Correia era que todas as grandes personalidades internacionais que desembarcavam em Lisboa desembocavam inevitavelmente no seu Botequim. Também sabia que numa das suas conhecidas tertúlias houve um dia uma discussão sobre astrologia, para que todos os presentes contribuíram com a revelação do seu signo. Natália Correia foi a última a fazê-lo, e caíra então um silêncio expectante sobre o bar. Quando atirou ?Virgem? para os seus interlocutores, estes responderam-lhe com uma estrondosa gargalhada colectiva, pois o erotismo dos seus livros era amplamente conhecido. Histórias como esta espicaçaram a minha curiosidade em relação a esta autora e à sua obra, cujo romance paira entre o lírico e o prosaico. Foi a exigência de uma digestão completa de ideias e personagens complexas, e fascinantes na sua complexidade e ?incompletude?, como a autora diz a dado ponto da narrativa, que me levou um tempo que me teria parecido excessivo antes de ler o volume. Ao longo da história, Natália Correia faz florescer a poesia, em frases que julgaríamos estéreis se ela não se tivesse apoderado delas, submetendo- -as ao seu estilo quase surrealista. Este estilo permite que a autora se alongue por descrições pormenorizadas de ambientes, sentimentos, pessoas e lugares, sem rasar sequer o enfadonho arrastar de parágrafos que levaria o leitor a desprender-se das suas palavras. A oposição da rural supremacia masculina e da urbana e existencialista avidez pela igualdade de direitos está patente em todas as peripécias da história. Com Branca, a narradora, somos irreprimivelmente levados a calcorrear, não só algumas das grandes cidades do Velho Continente, como o desabrochar de uma civilização efervescente de intelectuais apaixonados pela incompreensão a que se julgam votados, em que liberdade e perversão se confundem, numa vertigem de amor-ódio.
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