O Erotismo Sagrado
(Cecile Sagne)
Em todas as tradições espirituais, a união do masculino e do feminino representa o retorno à Unidade Divina. Ultrapassando as opressões puritanas e as complacências libertinas disfarçadas de liberação, a sexualidade pode ser uma verdadeira meditação, um autêntico caminho de transformação interior e de despertar da consciência, já nos diz Cécile Sagne na Introdução. Toda a tradição mística, assim como toda a tradição científica - esta última bem mais recente no cenário histórico, por sinal - quando fala dos primórdios, do início, do surgimento, das origens - leva-nos a refletir que o diferenciado nasceu do indiferenciado. Ou seja, todas as pesquisas de nossas civilizações informam que no princípio havia o UM, do UM fez-se tudo o que mais existe. A civilização ocidental, enveredada e presa nas malhas do capitalismo, que faz ver toda e qualquer atividade humana como atividade comercial, com valor de troca mercantil, leva-nos a situações absurdas. O filósofo francês Jean-Paul Sartre, por exemplo, dizia que, em nossa civilização, "O que diferencia a prostituição do casamento burguês é o preço e a duração do contrato". A mulher, o mais das vezes, é vista como objeto da concupiscência masculina, quando assume seu papel de passividade; quando resolve erguer-se à estatura de um ser humano pleno e com iguais direitos e deveres que os do sexo masculino, via de regra é vista como feiticeira perigosa, demoníaca, desafiadora, enfim. A mulher, numa sociedade falocrática, está cada vez mais sendo afastada da verdadeira experiência do Amor integral. "Fada ou feiticeira, anjo ou demônio, qualquer coisa menos ela mesma..." De novo se vê aqui reeditado o sadismo da sociedade ocidental, consumista, banindo para longe todo e qualquer eivor do que seja o Amor Natural, mútuo e recíproco entre duas pessoas que se completam, nas dimensões física, emocional, intelectual e espiritual. Os surrealistas, herdeiros modernos dos românticos do século passado, vêem na mulher a única via possível de reconciliação do homem com o mundo, uma vez haver ela mantido praticamente inalterada a sua condição intuitiva, ligada à Terra-mãe provedora, com ciclos, como a Lua - que partilha seu duplo etéreo com a Terra também - e tudo o mais. Mas demorará ainda até que a sociedade ocidental compreenda o que significa efetivamente a integralidade do que seja o movimento surrealista e seus desdobramentos. Nesta esfera, por exemplo, percebe-se claramente que o filósofo, o poeta, o artista surreal enfim, só se relacionará plenamente com uma única mulher que lhe será a companheira da vida inteira em toda a sua plenitude, que o verdadeiro surrealista sabe encontrar seu complemento humano. Algo de impensável a ridicularizável numa sociedade que, vale repetir, reduz tudo, até a relação intersubjetiva a "jogos de interesse" ou, por outro lado, à concupiscência lasciva, libertina ou ao puritanismo castrador, ambos imbecis faces da mesma moeda falsa. Se de nada valem as relações "de conveniência", tidas por todos aqueles que, em qualquer tradição filosófica ou religião superior, tiveram uma experiência íntima com a transcendência como algo menor, amesquinhante, só sendo válido o Amor pleno, imenso, mútuo e recíproco como retorno à Unidade, jogamos o puritanismo e a fornicação na mesma vala comum: patologia! Nossa querida Cécile Sagne, em sua bela obra O Erotismo Sagrado, vai ainda um pouco mais longe, colocando a conquista do Amor Único descrito acima como o mais belo e eficiente passo na direção da completa Iluminação do Casal. A cabalista britânica Dion Fortune informa: "o casal que chega à plena união de todas as dimensões de seu ser não mais pode ser visto por olhos humanos, pois atingiu um patamar completamente novo na existência dos seres". Fala-se, entre outras coisas na Obra em pauta, do absurdo do puritanismo ( e isso quando praticado mesmo, quando somente pregado vira pura hipocrisia, nem merece atenção.) assim como da fornicação libertina ("uma masturbação a dois",onde o ego segue sendo o foco das atenções, não o UM ou o mágico nós intersubjetivo...) acompanhei a leitura com grande aplauso em concordância. Ou o Amor é transe, plenitude, natureza, reciprocidade e altruísmo ou não é sequer Amor! A solidão é dolorosamente cruel. Mais cruel ainda a tentativa de união com a pessoa errada. Mas a alternativa verdadeiramente redentora atravessa nosso caminho pelo menos uma vez na vida, freqüentemente quando menos esperamos. André Breton, principal epígono do surrealismo, por exemplo, encontrou Elisa, já quarentão, com mais do dobro da idade de sua musa, com quem foi alucinadamente feliz até o último de seus suspiros neste planeta. Mas enquanto não a encontrou manteve-se irredutível. No Ocidente, os exemplos famosos são raros, no Oriente antigo, ou seja, antes de a infecção capitalista chegar por lá, esta era a regra. Hoje e por aqui é exceção. Como diz Carlos Eduardo Novaes, o capitalismo funciona como "uma vara de condão às avessas": onde havia algo sincero, puro, poético e lindo hoje há apenas um negócio e, se pensarmos bem, péssimo negócio para todos. Com tudo isso, a capacidade de regeneração do humano é surpreendente, até para os médicos. Se a sociedade conseguir suplantar a ganância, grande e pior dos sintomas da infecção capitalística, sobreviverá. Se a humana espécie sobreviver, toda esta camada formada por séculos e mais séculos de hipocrisias, máscaras e mentiras ruirá e o verdadeiro Amor, busca de União e até de transcendência, voltará a ser regra, deixando de ser exceção. Só no amor humano reside toda a possibilidade de regeneração do mundo! O resto, é mero detalhe.
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