Tragicômico
(Julia Arantes)
Tragicômico Por Julia Arantes Ao ouvir uma nota fúnebre no rádio fez-me vir à lembrança um certo caso, há muito acontecido e, por isso, achei interessante narrá-lo a vocês. Na cidade de Jurupapo morava uma senhora de nome Filomena Amadeu ou Filó, para os íntimos. Ela era alegre, agradável e tinha como prazer maior participar de excursões junto com suas amigas. As excursões quase sempre eram para Aparecida do Sul, já que todas eram muito religiosas. As senhoras de Jurupapo tinham-lhe muito afeto e apreciavam estar em sua companhia. Ora, sucedeu certo dia, que Filó saiu com suas amigas para mais uma viagem a Aparecida do Sul. Sua filha Felipa também ia excursionar, só que à uma cidade próxima à sua, onde havia uma linda praia. Não se podia desejar lugar mais gostoso de estar. Ela assistiu à partida da mãe e, logo, seguiu com um grupo de amigas, para divertir-se na cidade de Trexistoim. É bom saber que Felipa tinha um namorado, o tal trabalhava na Funerária Cochilo Eterno, de Jurupapo e, por causa do trabalho, não pôde acompanhá-la. Eugênio ou Geninho, como era mais conhecido, era um homem mais adiantado em seu ofício do que esclarecido em outros assuntos... Ao cair da tarde, Geninho, ouvindo o rádio, ficou sabendo que ocorrera um acidente com um ônibus de fiéis que estava voltando de Aparecida do Sul. Existem pessoas que, quanto mais se esforçam em conquistar o paraíso, o máximo conseguido é mandar para lá os outros. - Ah! que desgraça deste arruinado mundo...- Pensou o rapaz. Saindo da funerária apressadamente, foi revelar seu propósito ao marido de Filó, que neste ponto se calou e, com algumas lágrimas escorrendo entre fundos suspiros, concordou em deixar o rapaz arrumar tudo para a chegada do corpo de Filó. Geninho tratou de avisar os parentes e amigos, esses comentaram o caso a outros, uma comadre informou à outra e, em pouco tempo uma enorme multidão compareceu à casa de Filó, já dada por Geninho como falecida no acidente. Nesses entrementes, o motorista do ônibus, no qual viajava tranquilamente a Filó, ligou o rádio e ouviu uma triste notícia sobre um acidente, envolvendo jovens que voltavam da praia de Trexistoim. Inocentemente ele transmitiu a notícia aos passageiros. Filó, sabendo a filha ter ido para aquela praia, teve um chilique. Ora, sabemos muito bem que o ser humano tende mais a crer no mal do que no bem. Filó ficou em prantos, amargando o terrível destino da filha. Suas amigas tentavam consolá-la, rezando várias ladainhas, mas Filó se fazia inconsolável. Porém, como as coincidências mais estranhas teimam em ocorrer, Felipa, que estava sã e salva, também ouviu pelo rádio do carro das amigas sobre o acidente com o ônibus de fiéis. A moça em desespero, temendo pela mãe, não via a hora de chegar a Jurupapo. Por estes fatos, podemos aquilatar o quanto cada uma estava sofrendo. Mãe e filha pareciam unir-se através das preces, trazendo cada qual o coração nas mãos. Os vizinhos, parentes e comadres, já sabendo da tragédia com os jovens que voltavam de Trexistoim, gritavam na rua em desespero, achando que mãe e filha estivessem mortas. Geninho, no entanto, tão ocupado estava em preparar o funeral da sogra, não percebeu a confusão, chegando a impor silêncio à multidão, por três vezes, e ninguém conseguiu contar a ele sobre Felipa. Enfim, a inconsolável Filó chegou na cidade, mesmo amparada pelas amigas, entrou em pânico e começou a dar sofridos gritos pela rua, vendo a multidão em frente da sua casa. Do outro lado da rua, uma desesperada Felipa descia do carro no meio da multidão, ameaçando desmaio e, não fosse Vani Saracura ampará-la, iria direto ao chão. A mãe pensava a filha morta e essa por sua vez, pensava na mãe . Entre a multidão, os que viram Filó ou os que viram Felipa, não entendiam mais nada. Afinal, o funeral era de quem? Quem viu Filó, achou que era de Felipa; quem viu Felipa, pensou ser de Filó; quem não viu nenhuma das duas, achou ser de Filó e Felipa; quem as duas viu gritava tanto, que possível serria extrair todos os dentes de suas bocas; e, ainda quem viu só uma não entendia aqueles gritos de alegria. Bem, à esta altura, uns culpando os outros, foi sendo entendida, aos poucos, tamanha confusão, os parentes e vizinhos, tanto homens, quanto mulheres e crianças, jogaram a culpa no Geninho. Mas, quando mãe e filha se deram de frente aos prantos, a culpa recaiu sobre os radialistas... Pouco tempo depois, a barulheira transformou-se em alegria tal, que a multidão aumentava mais e mais. Cervejas foram abertas e uma sanfona apareceu não se sabe de onde, alegrando o tumultuado ambiente. As pessoas dançaram forró a noite toda, em meio aos apetrechos funerários, os quais o feliz Geninho nem se preocupou em retirar. E VIVA A VIDA!
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