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A Cidade E As Serras - 4 Prt
(anabordin)

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(...)
uma ilusão! E a mais marga, porque o homem pensa ter na cidade a base de toda a
sua grandeza e só nela tem a fonte de toda a sua miséria. Vê, Jacinto! Na
Cidade perdeu ele a força e beleza harmoniosa do corpo e se tornou esse ser
ressequido e escanifrado ou obeso e afogado em unto de ossos moles como trapos,
de nervos trêmulos como arames, com cangalhas, com chinós, com dentauros de
chumbo sem sangue, sem febre, sem viço, torto, corcunda - esse ser em que Deus, espantado , mal
pôde reconhecer o seu esbelto e rijo e nobre Adão! Na Cidade findou a sua liberdade
moral; cada manhã ela lhe impõe uma necessidade, e cada necessidade o arremessa
para uma dependência; pobre e subalterno, a sua vida é um constante solicitar,
adular, vergar, rastejar, aturar: rico e superior como um Jacinto, a sociedade
logo o enreda em tradições, preceitos, etiquetas, cerimônias, prazer, ritos,
serviços mais disciplinares que os de um cárcere ou de um quartel... A sua
tranqüilidade (bem tão alto que Deus com ele recompensa os santos) onde está,
meu Jacinto? Sumida para sempre, nessa batalha desesperada pelo pão ou pela
fama, ou pelo poder, ou pelo gozo, ou pela fugidia rodela de ouro! Alegria como
a haverá na Cidade para esses milhões de seres que tumultuam na arquejante
ocupação de desejar - e que, nunca fartando o desejo, incessantemente padecem
de desilusão, desesperança ou derrota? Os sentimentos mais genuinamente humanos
logo na cidade se desumanizam! Vê, meu Jacinto! São como luzes que o áspero
vento do viver social não deixa arder com serenidade e limpidez; e aqui abala e
faz tremer; e além brutamente apaga; e adiante obriga a flamejar com
desnaturada violência. As amizades nunca passam de alianças que o interesse, na
hora inquietada da defesa ou na hora sôfrega do assalto, ata apressadamente com
um cordel apressado, e que estalam ao menor embate da rivalidade ou do orgulho.
E o amor, na Cidade, meu gentil Jacinto? Considera esses vastos armazéns com
espelhos; onde a nobre carne de Eva se vende, tarifada ao arrátel, como a de
vaca! Contempla esse velho deus do himeneu, que circula trazendo em vez do
ondeante facho da paixão a apertada carteira dodote! (...) Mas o que a Cidade
mais deteriora no homem é a Inteligência, porque ou lha arregimenta dentro da
banalidade ou lha empurra para a extravagância. Nesta densa e pairante camada
de idéias e fórmulas que constitui a atmosfera mental das cidades, o homem que
a respira, nela envolto, só pensa todos os pensamentos já pensados só exprime
todas as expressões já exprimidas; ou então, para se destacar na pardacenta e
chata rotina e trepar ao frágil andaime da gloríola, inventa num gemente
esforço, inchando o crânio, uma novidade disforme que espante e que detenha a
multidão. (...) Assim, meu Jacinto, na Cidade, nesta criação tão antinatural
onde o solo é de pau e feltro e alcatrão, e o carvão tapa o céu, e agente vive
acamada nos prédios com o paninho nas lojas, e a claridade vem pelos canos, e
as mentiras se murmuram através de arames - o homem aparece como uma criatura
anti-humana, sem beleza, sem força, sem liberdade, sem riso, sem sentimento, e
trazendo em si uma espírito que é passivo como um escravo ou impudente como um
histrião... E aqui tem o belo Jacinto o que é a bela Cidade! Zé Fernandes
continuou a filosofar, acrescentando preocupações de caráter pessoal, indagando
a posição dos pequenos que, como vermes, se arrastavam pelo chão, enquanto os
poderosos os massacravam; eles iam às óperas aquecidos, lançando aos pobres não
mais que algumas migalhas. Religiosamente, acreditava ser necessário um novo
Messias que ensinasse às multidões a humildade e a mansidão. Só uma estreita e
reluzente casta goza na Cidade e os gozos especiais que ele a cria. O resto, a
escura, imensa plebe, só nela sofre, e com sofrimento especiais, que só nela
existem! (...) A tua Civilização reclama incansavelmente regalos e pompas, que
só obterá, nesta marga desarmoniasocial, se o capital der ao trabalho, por
cada arquejante esforço, uma migalha ratinhada. Irremediável é, pois, que
incessantemente a plebe sirva, a plebe pene! A sua esfalfada miséria é a
condição do esplendor sereno da Cidade. (...)
Pensativamente deixou a borda do terraço, como se a presença da Cidade,
estendida na planície, fosse escandalosa. E caminhamos devagar, sob a moleza
cinzenta da tarde, filosofando - considerando que para esta iniqüidade não
havia cura humana, trazida pelo esforço humano. Ah, os Efrains, os Trèves, os
vorazes e sombrios tubarões do mar humano, só abandonarão ou afrouxarão a
exploração das plebes, se uma influência celeste, por milagre novo, mais alto
que os milagres velhos, lhes converter as almas! O burguês triunfa, muito
forte, todo endurecido no pecado - e contra ele são impotentes os prantos dos
humanitários, os raciocínios dos lógicos, as bombas dos anarquistas. Para
amolecer tão duro granito só uma doçura divina. Eis pois a esperança da Terra
novamente posta num Messias!...



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