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Os Maias
(Eça de Queiroz)

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Em junho de 1888, os livreiros
portugueses começaram a vender os primeiros dos cinco mil exemplares da
primeira edição de Os Maias. É tiragem que impressiona ainda hoje. O
que dizer então naqueles tempos de um Portugal pouco habitado e não
muito lido? Foi uma temeridade, mas à audácia dos editores correspondeu
a curiosidade dos leitores e o interesse da crítica. E o livro do
desconfiado Eça de Queiroz transformou-se, desde então, num sucesso de
vendas. E assim é (ou voltou a ser) hoje em dia. Andou uns tempos
esquecido, é verdade, mas bastou que a televisão fosse buscar
inspiração (palavra perigosa) no velho romance, para que as novas
reedições sumissem, recém-chegadas às livrarias, pouco antes do Natal,
e fossem totalmente consumidas pouco antes do novo ano. Eça de Queiroz
foi impreciso e modesto ao dar a Os Maias o subtítulo "episódios da
vida romântica".
Na verdade, o seu mais famoso romance
é uma tragédia, tal como a entendia Sófocles quando, já na maturidade,
compôs o seu Édipo. Uma tragédia burguesa, mas quand même uma tragédia,
pois que lá está a grave transgressão moral, cometida em completa
inconsciência por seus dois personagens centrais ? Carlos Eduardo e
Maria Eduarda. Da Maia, ambos; irmãos, apaixonados e incestuosos ambos,
e belos e trágicos. Invejo quem agora, instigado pela minissérie, vai
ler esse livro pela primeira vez. Terá prazer único e irreproduzível.
As releituras que hão de vir, mais tarde, servirão de consolo, mas não
de substituto. Esse prazer estará certamente na elegância barroca da
forma e no desenvolvimento astucioso do entrecho. Mas estará também, ou
principalmente, nos admiráveis retratos que Eça faz de seus tipos
principais, com a elegância e a minúcia de um genial pintor romântico,
mas com "o seu olho à Balzac".
A começar não por um tipo, mas por
uma casa, mais exatamente a "casa que os Maias vieram habitar em
Lisboa, no outono de 1875", que surge, penumbrosa e prenunciadora, logo
na primeira frase do livro, e que era conhecida como a casa do
ramalhete "ou, mais simplesmente, o Ramalhete". Então, lemos, já
encantados: "Apesar deste fresco nome de vivenda campestre, o
Ramalhete, sombrio casarão de paredes severas, com um renque de
estreitas janelas de ferro no primeiro andar, e por cima uma tímida
fila de janelinhas abrigadas à beira do telhado, tinha o aspecto
tristonho de residência eclesiástica que competia a uma edificação dos
tempos da Sra. D. Maria I; com uma sineta e com uma cruz no topo,
assemelhar-se-ia a um colégio de jesuítas". Ai está o cenário da
tragédia. O Ramalhete é, pela ordem de entrada, o primeiro personagem
em cena, com suas paredes sempre fatais àquela antiga família da Beira,
tão rica e tão infeliz. E será no Ramalhete e em torno dele que vamos
ser apresentados aos personagens nos quais Eça de Queirós se insinua,
para nos falar através de suas muitas vozes. Seus retratos eram sempre
perfeitos e, ao longo da trama, coerentes.
A única personagem que o confunde é
Maria Eduarda, por sua beleza de deusa. Quando ela aparece ? e como
custa a aparecer! ?, "é alta, loura, com um meio véu muito apertado e
muito escuro que realçava o esplendor da sua carne"; algumas páginas
adiante, Carlos a revê e nota que "os cabelos não eram louros, como
julgara de longe, à claridade do sol, mas de dois tons, castanho-claro
e castanho-escuro, espessos e ondeando ligeiramente sobre a testa".
Falei de retratos e o mais correto é falar de auto-retratos. Se
Fernando Pessoa tinha seus heterônimos, Eça tinha os seus "eus", como
diz Beatriz Berrini, que eram muitos e muito se pareciam. Ele nos fala
pela voz severa do velho Afonso da Maia, que "era um pouco baixo,
maciço, de ombros quadrados e fortes...o cabelo branco todo cortado à
escovinha, e a barba de neve, aguda e longa", a reclamar melhores
destinos para o seu lamentável país e a cobrar, do neto tão promissor,
menos diletantismo e mais realizações.
Fala-nos também com as palavras
cruéis e desassombradas do neto Carlos, "um formoso e magnífico moço,
alto, bem-feito, de ombros largos, com uma testa de mármore sob os
anéis de cabelos pretos, e os olhos dos Maias, aqueles irresistíveis
olhos do pai, dum negro líquido, ternos como os dele e mais graves", e
que costumava vociferar: "A única coisa a fazer em Portugal é plantar
legumes, enquanto não há uma revolução que faça subir à superfície
alguns dos elementos originais, fortes, vivos, que isto ainda encerre
lá no fundo". Ao que o avô respondia, já impaciente com esse
diletantismo do neto, como se falasse em nome do autor: ? Pois então
façam vocês essa revolução. Mas pelo amor de Deus, façam alguma coisa!
Mas nenhum de seus "eus" foi mais ele mesmo que João da Ega, ou João da
Eça, ou o Ega de Queirós, que todos esses trocadilhos, embora fáceis,
têm cabimento e justeza. Talvez só o Fradique Mendes se lhe possa
comparar, mas esse não vem ao caso, agora, porque não é personagem d´Os
Maias. Eram "eus" idealizados e muita vez caricaturados, mas que, no
fundo, o reproduziam com verdade e o exprimiam com coerência.
Ao Ega, deu-lhe o Eça a existência
que gostaria de ter tido: discutido e admirado, com a mãe devota, rica
e viúva, a lhe garantir o presente e o futuro, permitindo-lhe desfrutar
as sofisticações, as intimidades e os desvelos de uma família de
aristocratas, como era a dos Maias; mais alguns amores ardentes e com
saúde razoavelmente forte para gozar, sem medos nem cuidados, o prazer
das boas comidas e dos bons vinhos, dos conhaques e das águas ardentes,
das noitadas com espanholas e das devassidões vespertinas, com amantes
de luxo. É conclusão a que se chega no momento em que Eça retrata o Ega
? e se auto-retrata: cheio de verve e de irreverência, de frases
retumbantes e ditos irônicos, um talento amaldiçoado, temido e
exaltado. Vejamos o Ega pelos olhos do Eça: "O esforço da inteligência
(...) terminou por lhe influenciar as maneiras e a fisionomia; e, com a
sua figura esgrouviada e seca, os pêlos arrebitados sob o nariz adunco,
um quadrado de vidro entalado no olho direito ? tinha alguma coisa de
rebelde e de satânico". Ora, se não é esse ou quase esse o retrato do
próprio Eça, tal como captado na célebre caricatura que dele fez Rafael
Bordalo Pinheiro, então já não sei ver nem distinguir.
É ainda o Ega que, em momento de
impaciência com a mediocridade e a hipocrisia da sociedade burguesa, e
como que falando em nome de seu criador, deixa Lisboa e corre para
restaurar-se no interior, lançando a Carlos e a Craft, os dois grandes
amigos que o foram acompanhar à diligência, esta frase aterradora: ?
Sinto-me como se a alma me tivesse caído a uma latrina! Preciso um
banho por dentro. Tal como Carlos da Maia, também João da Ega era um
diletante. Ambos têm revoltas pouco profundas e de pouca duração. As
suas grandes promessas de realização pessoal e de transformação do
mundo terminam por desmaiar no culto quase religioso do luxo e do
tédio. Passam a representar o que mais incomodava o inconformado Eça: a
renúncia e o conformismo. É com mãos hábeis, orgulhosas e brilhantes
que Eça os faz florescer em Coimbra, em tempos de sonho e de estudo, a
prometer insubmissão e luta. É com olhar de desalento e pessimismo que
Eça os deixa vencidos e melancólicos, a "correr desesperadamente pela
rampa de Santos", atrás de um bonde e de um jantar, "sob a primeira
claridade do luar que subia".
Tal como o próprio Eça se sentia, Ega
e Carlos eram, naquele momento, dois "vencidos da vida". E assim a
tragédia se consuma e nos obriga a repensar o ser humano com
inquietação e desconfiança. Lisboa, 1875. A cidade não apenas como um
cenário mas como uma personagem, viva, interveniente, testemunha e
cúmplice dos acontecimentos.A cidade acorda, o movimento cresce. De
entre a multidão que circula vão-se destacando, anunciadas pela
narradora, as principais personagens desta história.Mais tarde, ao
serão, no interior da casa dos M



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