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Memórias De Um Sargento De Milícias - Parte 4
(Manuel Antônio de Almeida)

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III ? Despedidas às travessuras - O pequeno, enquanto se achava novato na casa do padrinho, portou-se com sisudez e seriedade, mas assim que foi se familiarizando com o novo ambiente, começou a pôr as manguinhas de fora; mesmo assim, o padrinho estava cego de afeição pelo menino, tanto que por pior que fosse a travessura do garoto ou mal-criação, ele achava graça dizendo serem atitudes ingênuas. A atitude do homem era natural, visto que ele já tinha 50 e tantos anos, nunca tinha tido afeições; passara sempre só, isolado; era verdadeiro partidário do mais decidido celibato. Logo à primeira afeição que fora levado a contrair sua alma expandiu-se toda inteira, e seu amor pelo pequeno subiu ao grau de rematada cegueira. Este, aproveitando-se da imunidade em que se achava por tal motivo, fazia tudo quanto lhe vinha à cabeça. O menino era de fato endiabrado: várias vezes sentado na loja divertia-se em fazer caretas aos fregueses quando estes se estavam barbeando. Uns riam e outros se enfureciam, do que resultava que saíam muitas vezes com a cara cortada, com grande prazer do menino e descrédito do padrinho. Outras vezes escondia em algum canto a mais afiada navalha do padrinho, e o freguês levava por muito tempo com a cara cheia de sabão mordendo-se de impaciência enquanto este a procurava; ele ria-se furtiva e malignamente. Em casa, nada ficava inteiro por muito; pelos quintais atirava pedras aos telhados dos vizinhos; sentado à porta da rua, entendia com quem passava e com quem estava pelas janelas, de maneira que ninguém por ali gostava dele. O padrinho porém não se dava disto, e continuava a querer-lhe sempre muito bem. Desempenhando o papel de pai, passava às vezes, as noites fazendo castelos no ar a seu respeito; sonhava-lhe uma grande fortuna e uma elevada posição, e tratava de estudar os meios que o levassem a esse fim. Queria o melhor para o menino, já que havia se arranjado na vida, pensava até em enviá-lo para Coimbra, (como um babeiro havia se arranjado na vida e conseguido dinheiro para isso, segundo o narrador, é assunto para outra história). Segundo o barbeiro, a melhor profissão para o menino seria a de clérigo. Após ruminar por muito tempo essa idéia, certa manhã, uma Quarta-feira, chamou o pequeno, então com 9 anos, e disse-lhe que deveria se fartar de travessuras até o resto da semana, dali em diante, só aos domingos, após a missa. O pequeno levou a fala do padrinho ao pé da letra e achou que era uma licença ampla para fazer tudo o que quisesse, fosse bem ou mal. Ao anoitecer, sentado à porta, o padrinho viu de longe um acompanhamento alumiado pela luz de lanternas e tochas e ouviu padres rezarem. Era a via sacra do Bom Jesus. O menino quando viu aquilo, estremecendo de alegria, lembrou se da fala do padrinho, ?fartar-se de travessuras?; não perdeu tempo: misturou-se com a multidão, e lá foi concorrendo com suas gargalhadas e seus gritos para aumentar a vozeria. Com um prazer febril pulava, cantava, gritava, rezava e saltava, era um prazer febril; só não fez o que não tinha forças. Para ajudar ainda mais ass estripulias, juntou-se com mais dois moleques e as estripulias foram tantas, que quando deu por si a via-sacra já havia retornado à igreja do Bom Jesus.



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