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A Rosa Do Povo - Parte 2
(Carlos Drummond de Andrade)

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Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
Nota-se no poema um eu-lírico mergulhado num mundo sufocante, em que tudo é igualado a mercadoria, tudo é tratado como matéria de consumo. Em meio a essa angústia, a existência corre o risco de Se mostrar inútil, insignificante, o que justificaria a náusea, o mal-estar. Tudo se torna baixo, vil, marcado por ?fezes, maus poemas, alucinações?.
No entanto, em meio a essa clausura sócio-existencial (que pode ser representada pela imagem, na terceira estrofe, do muro), o poeta vislumbra uma saída. Não se trata de idealismo ou mesmo de alienação ? o poeta já deu sinais claros no texto de que não é capaz disso. Ou seja, não está imaginando, fantasiando uma mudança ? ela de fato está para ocorrer, tanto que já é vislumbrada na última estrofe, com o anúncio de nuvens avolumando-se e das galinhas em pânico. É o nascimento da rosa, símbolo do desabrochar de um mundo novo, o que mantém o poeta vivo em meio a tanto desencanto.
Dois pontos ainda merecem ser observados no presente poema. O primeiro é o fato de que ele, além de ser o resumo das grandes temáticas da obra, acaba por explicar o seu título. Basta notar que, conforme dito no parágrafo anterior, a rosa indica o desabrochar de uma nova realidade, tão esperada pelo poeta. E a expressão ?do povo? pode estar ligada a uma tendência esquerdista, socialista, muito presente em vários momentos do livro e anunciadas pela crítica ao universo capitalista na primeira (?Melancolias, mercadorias espreitam-me.?) e terceira estrofes (?Sob a pele das palavras há cifras e códigos.?). O novo mundo, portanto, teria características socialistas.
O outro item é visto pelo estreito relacionamento que A flor e a Náusea estabelece com o poema a seguir, Áporo, um dos mais estudados, densos, complexos e enigmáticos da Literatura Brasileira.
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desata:
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.
Note que a narrativa parece ser tirada de A Flor e a Náusea: um inseto, o áporo, cava a terra sem achar saída. Assemelha-se ao eu-lírico do outro poema, que se via diante de um muro e da inutilidade do discurso. No entanto, Drummond continua discursando, vivendo, assim como o inseto continua cavando. Então, do impossível surge a transformação: do asfalto surge a flor, da terra-labirinto-beco surge a orquídea.
Há algo aqui que faz lembrar o poema Elefante, também no mesmo volume. Da mesma forma como Drummond fabrica seu brinquedo, mandando-o para o mundo, de onde retorna destruído (mas no dia seguinte o esforço se repete), o eu-lírico de A Flor e a Náusea sobrevive em seu cotidiano nulo e nauseante e o áporo perfura a terra. É a temática do ?no entanto, continuamos e devemos continuar vivendo?, tão comum em vários momentos de A Rosa do Povo.
Áporo, portanto, é um poema tão rico que pode ter outras leituras, além dessa de teor existencial.



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