Angustia
(Graciliano Ramos)
Angústia é a história de Luís da Silva, um tímido e solitário funcionário público, que mora num distante e pobre bairro, numa casa velha, cheia de ratos. Além de trabalhar durante o dia na repartição, à noite, para ganhar uns centavos, escreve textos sob encomenda para um jornal. Depois de um mês de cama, curando-se de uma enfermidade, se vê de pé, regressando ao trabalho e às actividades normais. Nesse processo, pelo fio da memória, resgata o passado, na tentativa de reconstruir o que havia ocorrido.
No trajeto do bonde, da repartição à sua casa, arrastavam-se as sombras do cotidiano, misturando-se em sua mente, tornando tudo confuso. O dinheiro não era muito e o aluguel encontrava-se atrasado. com um poder doentio de auto-análise, Luís estava consciente de que levava uma vida idiota e frustrante, desenvolvendo uma ojeriza, um asco aos outros e a si mesmo. Odiava o seu senhorio, como também Julião Tavares, sujeito gordo, eufórico, vermelho, eloquente e rico, que, sempre fingindo superioridade, tentava sempre conversar com Luís.
Voltou a ser criança na fazenda do avô, Trajano, grande latifundiário decadente, caduco e bêbado; da avó, sinhá Germana; do pai, Camilo Pereira da Silva, dono de uma preguiça atroz que só andava lendo, deitado na rede. Dele, infelizmente, herdara o gosto pelas letras. O pai morreu quando tinha catorze anos. Era um defunto grande, envolto em um lençol branco, manchado de sangue na região da cabeça; os pés descobertos eram imensos, ossudos e sujos, com unhas róseas. Essa morte forçou-o a sair de casa; encontrou-se novamente no quarto abafado da pensão sórdida na cidade; as idas ao cinema com a sobrinha de dona Aurora, a proprietária da pensão.
Já não conseguia mais escrever, esses fantasmas familiares, freqüentemente, vinham assombrá-lo. Um dia fez amizade com sua vizinha, Marina, moça vermelha, de olhos azuis e cabelos amarelos. Apaixonado, pediu-a em casamento. Como queria casar logo, enttregou-lhe todas suas economias para o enxoval. Nesse momento, entrou em cena Julião Tavares que, possuindo tudo o que o outro não possuia, principalmente dinheiro e posição social, conquistou, facilmente, a leviana Marina que, sem dificuldades, se deixou seduzir, ignorando Luís por completo.
Este, humilhado e enganado, mergulhou no abismo interior da derrota, adquirindo impulsos mórbidos de morte. Um dia, Ivo, o mendigo que procurava Luís para uma cachacinha e um prato de comida, deixou um rolinho de corda sobre sua mesa, o que lhe despertou um horror incontrolável. Com medo, escondeu-o no seu bolso. Os ratos e os vizinhos dos lados faziam muito barulho, irritando-o.
Luís notou que Julião deixara de visitar Marina. Com certeza, já tinha conseguido seu objectivo e estava em busca de carne e rosto novo. Abandonada, Marina não mais saía de casa, andava triste e sem jeito. Cada vez mais conturbado por seus fantasmas, Luís passou a seguir Julião. Um certo dia, encontrou-o no café e, de sua mesa, imaginou-se estrangulando-o, com a corda do mendigo Ivo, que trazia no bolso. Outro dia, sentindo-se frágil, cheio de culpa e autonegação, se viu atrás de Marina, que entrava na casa de uma parteira. Esperou-a, bebendo cachaça, num bar de frente. Quando esta saiu, com os olhos fundos e pálida como um cadáver, seguiu-a. Ao alcançá-la, desgostoso, agrediu-a moralmente e cobrou-lhe atitudes.
Fazia tudo aquilo, por piedade, tinha muita pena de Marina. Depois de algumas investigações, Luís descobriu o povoado, onde Julião tinha uma nova aventura. Uma noite, protegido pela neblina, esperou-o à saída da casa. À medida que o seguia, atormentado pelas recordações, via Julião que ora sumia e ora surgia, flutuando num espesso nevoeiro. Indeciso no que fazer, continuava a perseguição. Julião parou para acender um cigarro, e Luís, apalpando a corda no bolso, sentia o sofrimento e humilhações vividas, cobrando-lhe compensação. Assim, num gesto muito rápido, saltou enlaçando o pescoço do rival que, desprevenidamente, acendia o cigarro; com toda sua força esticou a corda, estrangulando Julião, que, após debater-se, ali ficou, insignificante, coberto de folhas secas, amortalhado na neblina''''. Uma indizivel felicidade se apoderou de Luís, que se sentia muito forte; não era mais aquela pessoa sem importância, que se mexia pela vontade dos outros; todos os sofrimentos e humilhações viraram fumaça; agora ele era outro. Porém, essa euforia durou pouco, pois sua mente começou a funcuionar, angustiando-o; um grande medo e desespero tomaram conta completamente dele, temendo ser descoberto.
Completamente transtornado, chegou a casa, onde acabou por beber uma garrafa de cachaça e dormiu. Na dia seguinte, sentindo-se doente, não foi trabalhar. Procurou em sua roupa marcas que o pudessem comprometer, mandou a camisa para a lavadeira, picou toda a gravata e deitou-se, entregando-se, desvairado e completamente transtornado e sufocado pela angústia.
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