Para entendermos o que é um paradigma, iremos supor uma jaula com cinco chipanzés ( esta experiência foi realizada, de fato, por um grupo de cientistas do departamento de ciências cognitivas, da universidade de Palo Alto, Pasadena, Califórnia). No centro da jaula, sobre uma mesa, uma travessa de frutas; sempre que um chimpanzé subia na mesa para apanhar uma delas, jatos de água quente castigava os outros quatros. Com o tempo, toda vez que um deles ensaiava esse gesto, os outros o agredia com extremada violência, por associarem as frutas com o castigo severo. Um dia, um deles é trocado por outro chipanzé que nunca havia visto a cena da mesa com o subseqüente jato de água quente; entretanto, ele via os companheiros agirem e os imitava; depois, trocaram outro, e mais outro, até não haver nenhum dos chipanzés originais na jaula; entretanto, o costume fora mantido e perpetuado
ad náusea, o que talvez explique porque nossas leis, quanto mais vetustas, mais robustas! Este é um exemplo de um paradigma gerado em condições naturais; passemos agora a um exemplo de paradigmas metafísicos ou transcendentais (o leitor escolherá o nome mais apropriado). Uma equipe de biólogos franceses viaja pelas ilhas virgens de um arquipélago polinésio. Uma população de macacos habita essas ilhotas e os cientistas estão intrigados com a profunda semelhança entre os espécimes, pois, não havendo cruzamento entre indivíduos de ilhas diferentes, eles deveriam apresentar consideráveis diferenças, como o bico dos pássaros galápagos no famoso exemplo de Charles Darwin. Câmaras foram instaladas nas praias de várias destas ilhas, único lugar onde os animais poderiam ser observados sem a densa vegetação a encobri-los, e todos os dias um barco passava perto e lançava sobre as areias da praia um lote de batatas cozidas. Enquanto isso as câmaras monitoravam o comportamento social dos animais se alimentando na areia. Esperavam os cientistas encontrar no comportamento alguma pista que indicasse a existência suspeita de vínculos secretos entre a população das ilhas. Durante longos minutos, os animais limpavam com as mãos a areia em volta das batatas quentes para, em seguida, as devorarem. Um dia, um velho macaco, com uma batata nas mãos, caminhou até a água e lavou a comida, exibindo-a com evidente orgulho aos outros membros do grupo que passaram a fazer o mesmo. O insólito desta situação ocorreu quando as câmeras registraram em todas as outras ilhas, simultaneamente, todos os macacos correrem a lavar as batatas tão logo eram atiradas na areia, coisa que jamais haviam feito ou virem fazer durante toda as semanas que durara a experiência! Se havia algum vínculo a unir profundamente o comportamento, determinando a identidade genética da população estudada - como o fato descrito sugere - ela só poderia ser de ordem sobrenatural e por isso, pertinentemente, a experiência foi abandonada e esquecida pelos sensatos cientistas. Pressupor uma ontologia das espécies, uma entidade viva como a cabeça escondida de um polvo que agita seus tentáculos aparentemente vivos e independentes, seria cultivar as barbas de um realismo platônico no seio de uma ciência talhada pela navalha dos nominalistas. Faltou-lhes um novo e metafísico paradigma que eu próprio, que tenho dedicado minha vida a estudá-los, saberia sugerir!
Sonhos na Pousada Vale do Capão -
a) Um amigo de infância escalava comigo uma íngreme montanha. Um terror inaudito era a nossa secreta motivação. Abaixo de nós uma enchente ameaçava carregar tudo que estivesse em seu caminho. Atingimos o cimo e, em segurança, contemplamos o adejar de pássaros hitcockianos. Sinais de ser o topo da montanha habitado em prístinas eras havia por toda parte, ruínas de bizarras civilizações, ruídos e desencontradas premonições. Percebi à certa distancia um estranho grupo de crianças e segui ao seu encontro. Crianças, ou melhor, uma raça de anões em estranhas algazarras se comunicando. Sem rosto definido, os corpos opacos como se feitos de matéria desencarnada, eles recolhiam cristais espalhados pelo altiplano. Um pressentimento me dizia que eram coagidos, escravizados por uma força superior. Um silente e luminoso disco surgiu acima de nós; dele disparava-se raios sobre os cristais que explodiam em ondas de luz, em dinâmicas manchas coloridas, em fulgurações de mônadas criadas como diria um filósofo alemão!
b) Encontro duas amigas saindo de um cinema. Uma delas me segura com surpresa e me beija; a outra lê uma carta que começa dizendo: somos feitos de muitas moléculas!... A carta seguia tratando de ciência e desejo ( um típico sonho conceitual onde as imagens mimam os termos, proposições e silogismos do texto lido). O efeito do pensamento lógico sobre o estofo dos sonhos é alucinante: mulheres correm em pânico para o banheiro, vejo quadros de Van Gogh incendiando-se, a névoa no céu, dissipada por um vento inclemente, revela um astro luminoso que me enche de opressão o peito. Não era a lua, e sim o planeta Saturno com seus anéis enlouquecidos girando, girando...
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