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Os Espinhos De Espinosa
(Cassiano Ribeiro Santos)

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Carl Gebhart, editor e biógrafo do filósofo Espinosa, conta que esse extraordinário pensador possuía um brasão com o qual selava a sua correspondência; nele havia um rebu, um enigma em forma de imagem: Uma rosa com o talo sobre o nome Baruch Espinoza. Em volta se lia a inscrição...Cuidado, Tenho Espinhos! ... Muito já se escreveu sobre a rosa como uma alegoria da filosofia de Espinosa: as pétalas como os incontáveis atributos da substancia, cada uma delas expressando, nas modalidades da cor, perfume, textura... a essência unívoca desta substancia. Uma alegoria simplória e poética, como o é também as rosas. Esta alegoria, entretanto, estaria incompleta se não fizesse referencia aos espinhos. Eles seriam a paixão do pensamento, os paradoxos escondidos no ramalhete de axiomas, proposições e corolários da sua filosofia. Supor que o pensamento padeça pode parecer uma heresia diante de uma obra filosófica tão afirmativa como o é a Ética; entretanto, afirmar uma paixão intrínseca ao espírito é também afirmar a absoluta univocidade do ser, pois se em determinadas relações os corpos padecem, as idéias também. Os paradoxos ou os espinhos de Espinosa seriam os maus encontros, a relação inadequada entre certas proposições da Ética lidas em outra ordem diferente da por ele estabelecida. Arriscarei-me a citar dois exemplos de memória: No prefácio da parte IV, lemos não haver nenhuma virtude em uma vida longa, pois a duração de uma vida é determinada pelas relações extrínsecas desse corpo com outros cuja potência supera infinitamente a nossa. Em outro lugar lemos que a essência de um corpo é o desejo de perseverar na existência; considerando que esse desejo se expressa na organização dos encontros, promovendo os bons e evitando os maus que determinarão a duração de uma vida, e que esse desejo é, por isso, virtuoso...! Outro paradoxo: O amor que nutrimos por um ser contingente, segundo este filósofo, é também causa de sofrimentos devido a variabilidade que sofre esse ser na existência e pela idéia de finitude que ele encerra (uma punhalada no romantismo!), contudo, em um dos momentos apoteóticos do livro V, se lê: ... o afeto pelos corpos singulares é a via mais adequada para conhecer e amar a Deus! No plano de composição da sua obra, estes paradoxos se disfarçam com a habilidade de uma florista a compor os seus bouquets e somente os leitores desavisados ferem os dedos desajeitados em seus espinhos.
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Nos fins de semana, eu trabalhava como porteiro do único cinema de minha cidade. Isso me rendia, além de alguns trocados, um passe para ver todos os filmes da semana. Minhas recordações deste breve período, dos filmes incluídos, se reduz a cenas de marcante violência. Havia na cidade um mecânico de nome Epaminondas (ali, para compensar a infâmia de uma vida inglória, os homens simples possuíam nomes de heróis gregos e romanos: Leônidas, Horácio, Aristides, Leandro...) que passava a semana inteira trabalhando em sua humilde oficina. Aos domingos, após limpar a graxa do corpo com sabão e solvente, vestia sua melhor roupa e, com a esposa e cinco filhos unidos no mesmo perfume, desfilava garboso em direção ao cinema. Hemingway dizia que poucos homens tem estilo, já vira cães com mais estilo que muitos homens, e poucos cães tem estilo; pois ali estava um cachorrão estiloso! Epaminondas comprava os ingressos e com um palito nos dentes, ao lado da borboleta, ia introduzindo os filhos em fila indiana; sua esposa, muito gorda para entrar de frente, fingia olhar os cartazes laterais e entrava de lado. Finalmente entrava Epaminondas. Entregava-me peremptório os sete bilhetes, fitava-me nos olhos e dizia:
_ Se dentro de cinco minutos não tiver cacete, vou embora e quero meu dinheiro de volta! - Cacete era cenas de violência, de socos e pancadaria. Com o fim do cinema spaghetti e antes do gênero kung-fu dominar a sede por filmes de ação, passávamos naquela época por uma crise de violência e o cinema foi invadido por filmes românticos: Al Di Lá, O Candelabro Italiano, Love Story.... e outros melodramas. Cinco minutos depois, conforme previsto e prometido, saíam os filhos contrariados, a esposa desapontada e Epaminondas com tanta fúria nos olhos que eu tremia de medo. A ameaça de violência que ele representava é uma das poucas lembranças indeléveis que guardo desse período. De certo modo, a violência fora-me relevante e posso entender a importância que ela tinha no imaginário e na vida pachorrenta de Epaminondas!
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Tão logo rompe a manhã, o mergulhão filhote sai do ninho entre as pedras e voa sobre a praia em linhas adejantes e vigorosas, espalhando nos ares o seu trinado selvagem. Outros espécimes respondem nas ilhas próximas. Nada conhecem ainda desta vida salvo o instinto que lhe insufla as asas. Seu canto desarticulado é um canto de afirmação. Vêem do alto como esse mundo é assombroso e desconhecido. Exultam-se saudando o bando como se gritasse: EU ESTOU AQUI! EU ESTOU AQUI! Outros pássaros respondem sobre as ondas: NÓS TAMBÉM ESTAMOS AQUI! NÓS TAMBÉM ESTAMOS AQUI!

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