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A Destruicao Dos Tiranos
(RUDOLPH COBALTO)

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a medida que cresciam seu poder e sua fama, aumentava, em minha imaginação, a gravidade do castigo que eu desejava infringir-lhe. assim, de inicio, me contentaria com uma derrota eleitoral, uma perda de entusiasmo popular. depois, já exigia sua prisão. mais tarde ainda, que fosse exilado para alguma ilha rasa e longínqua com uma única palmeira, a qual, como um negro asterisco, apontaria para o fundo de um inferno perpetuo feito de solidão, desonra e impotência. agora, finalmente, só sua morte me satisfaria. como nos gráficos que retratam visualmente sua ascensão, indicando o numero de seguidores pelo aumento gradual da figura de um homenzinho que vai crescendo, crescendo e termina enorme, o ódio que eu lhe devotava, de braços cruzados como os dele em todas as fotografias, expandia-se assustadoramente no centro do espaço que correspondia minha alma ate ocupa-lo por inteiro, deixando-me apenas uma borda estreita de luz circular (mais parecida com a cora circular da loucura do que com o halo do martírio) embora eu preveja que vai ocorrer um eclipse total. seus primeiros retratos nos jornais, nas revistas das lojas e nos cartazes de parede __ que também cresciam sem parar nesse nosso pais abundantemente irrigado de lagrimas e de sangue __ eram bastante indistintos: nessa época eu ainda tinha duvidas do resultado fatal do meu ódio. algo de humano, certas possibilidades de fracasso, de que ficasse louco ou doente, sabe Deus o que, pareciam transparecer débeis, em algumas de suas fotografias, na variedade fortuita de poses ainda não padronizadas e no olhar vacilante, que não adquirira sua expressão histórica. pouco a pouco, entretanto seu semblante consolidou-se: nos retratos oficiais, bochechas e macas do rosto cobriram-se de um brilho divinal, o azeite de oliva da veneração publica, o verniz da obra-prima acabada, tornou-se impossível imaginar aquele nariz sendo assoado, ou aquele dedo cutucando sob o lábio para extrair o pedacinho de comida alojado atras de um incisivo cariado senão podre. a variedade experimental seguiu-se a uniformidade canonizada, que fixou a imagem familiarmente pétrea e embaçada de seus olhos, nem inteligentes nem cruéis, mas de certa forma insuportavelmente macabros. cristalizou-se também a solidez carnuda do queixo, o bronze dos zigomas e um traço que já se tornara patrimônio comum a todos os cartunistas do mundo por criar de maneira quase automática o toque de semelhança: a profunda ruga que lhe cruzava a testa __ o sedimento adiposo do pensamento, e não, obviamente, a cicatriz da imaginação. sou forcado a crer que lhe aplicaram todos os tipos de balsamos milagrosos, pois, de outro modo, não consigo entender o excelente acabamento metálico daquele rosto que eu conhecera doentio, inchado e mal barbeado, a tal ponto que se ouvia o arranhar de pêlos contra o imundo colarinho toda vez que ele virava a cabeça. a política jamais me fascinou, tanto assim que nunca li com atenção um editorial ou mesmo qualquer noticia breve sobre um congresso partidário. os problemas sociológicos não atraem minha curiosidade e ate hoje não consigo me ver participando de uma conspiração ou me sentando numa sala enfumaçada, em meio a pessoas politicamente excitadas, tensas e serias, para discutir formas de ação a luz dos últimos acontecimentos. não dou a menor bola para o bem-estar da humanidade. não acredito que nenhuma maioria esteja automaticamente certa e me inclino mesmo a questionar a conveniência de se lutar por um estado de coisas em que literalmente todo mundo seja semi-alimentado e semi-alfabetizado.



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