O Policial como uma das Belas Artes 
(Maria José Camecelha)
  
De que falamos quando dizemos que o Romance 
 Policial é um género? Para  que remete a noção 
 de género? Remete para uma compartimentação, com 
 base essencialmente na 
 'história' -  para as classificações -  'de amor', 'de 
 guerra', etc.
 Dentro da literatura, o policial foi  praticamente sempre 
 considerado (talvez a par com os 'livros de cowboys' e 
 os de guerra) um género 'menor'. 
 Destinado ao grande público consumidor de literatura 
 leve, daquela que se lê aos  fins de semana, não 
 coloca grandes problemas, nem de ordem filosófica 
 nem doutra (não faz pensar - grande temor da 
 sociedade contemporânea), tem vários pontos altos 
 em escritores, como Agatha Christie, criando-se um 
 verdadeiro culto, em que certos detectives são vedetas. 
 O que penso ser curioso é que a definição de género 
 mantém um certo status  do livro - uma forma de o 
 vender, com base numa história cujo âmbito pode ser 
 o mais vasto possível,  e não propriamente uma 
 definição que tenha a ver com um efeito de que o 
 próprio livro produza ou seja participante. Visto de um 
 ângulo mais geral - é condição essencial que, para ser 
 um policial, exista um morto (não de morte natural, 
 evidentemente) - o  objecto central da acção - e que 
 esse objecto central despolete uma série de 
 considerações ao detective. Ou seja, figura tão 
 importante como o morto - o detective - assume um 
 papel de fundamental importância dentro da trama da 
 história. (Só - no caso, por exemplo de Chandler e de 
 Hammet ou ainda Dickon Carr, nos seus vários 
 pseudónimos) ou, caro a várias produções norte- 
 americanas  e inglesas - o detective e o seu alter-ego 
 (situações óbvias encontradas nos pares Sherlock 
 Holmes e Dr. Watson; Tommy-Tuppence; Poirot e o 
 seu eterno confessor,  no par de Queen's de Ellery 
 Queen, Nero Wolfe e Archie Goodwin (Rex Stout) ou 
 ainda  Vance/Van Dine ou, triangular: Perry Mason, 
 Paul Drake, e Della Street.
 O processo de descoberta é um  processo que, 
 definido o objecto da intriga - o morto e o que este 
 arrasta de situações que se vão inter-relacionando - é 
 suportado pelo clássico 'como/quem/porquê' - em que 
 todos os pequenos indícios se vão instituindo em 
 provas e ter lugar num puzzle geral - que o grande 
 detective encaixa a pouco e pouco.
 Até aqui tudo bem - não há nada que levante a questão 
 de não poderem existir géneros bem definidos - 
 caizinhas onde enfiamos os livros, fazendo número 
 com a imensa massa de consumidores da chamada 
 Literatura Policial.  
 Mas, aqui e ali encontramos pequenas traições ao 
 género, que se entrelaçam com outros 
 
 Agatha Cristhie ri-se de si através da personagem da 
 escritora Ms. Oliver - que come maçãs e odeia 
 participar em conferências de escritores - e que nunca, 
 mas nunca, consegue responder à 
 pergunta - 'como se tornou uma escritora 
 de livros policiais?'.  
 Remete ainda para um tipo diferente da  construção 
 clássica em O Assassinato de Roger Ackroyd - 
 em que o próprio narrador se institui assassino - por 
 pequena falha de 10 m - notada pelo grande 
 detective H. Poirot (que, sendo belga e toda a gente 
 pensando que é francês, lembra também o detective 
 sueco da escritora 
 inventada - que se interroga mil vezes sobre o por quê 
 de ter escolhido um detective de um país que 
 desconhece por completo. É como se a história se 
 olhasse a si própria. Um - para dentro - que sugere ao 
 espectador - tornado que é interveniente dum 
 processo que indicia, mais do que um mero relato da 
 história, uma reflexão sobre todo um universo - que é 
 construído no limite duma destruição do género.
 A importância que o factor tempo assume em quase 
 todas as narrativas policiais - um tempo diluído em 
 pequenos acontecimentos, cruzamentos 
 aparentemente ocasionais de personagens num 
 mundo ficcional,  mas perturbadoramente real,  
 que se inventa em cada fragmento de texto - criando 
 uma íntima conexão entre o tempo vivido pelas 
 personagens e tivo do leitor, faz da 
 narrativa policial um espaço em que o suspense  é 
 no teatro, numa sucessão de actos e cenas, - 
 pequenas imagens que se vão formando - várias 
 linhas aparentemente paralelas que vão convergindo 
 para um único ponto. 
 
  
 
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