Falsa Dicotomia
(Rodrigo Constantino)
Muito se fala sobre um necessário trade-off entre inflação e
desemprego. Uma das curvas mais famosas em economia é a de Phillips,
que trata justamente desta relação: menos desemprego, mais inflação.
Alban Phillips realizou um estudo empírico em 1958, cujos resultados
logo foram abraçados pelos neo-keynesianos, felizes em argumentar que o
governo poderia então controlar o nível de emprego com suas políticas.
A princípio, Phillips tratava da relação entre aumento de salários e
desemprego, mas as conclusões foram extrapoladas para a inflação e o
desemprego. Esta mentalidade perdura até hoje, quando muitos
economistas apresentam esta suposta dicotomia, exigindo uma escolha
entre menos desemprego ou menos inflação. Mas será que tal relação é
realmente válida?
Na década de 70, muitos países experimentaram
uma estagflação, mistura de elevada inflação com elevado desemprego.
Isso colocou a curva de Phillips em xeque. O nobel de Chicago, Milton
Friedman, foi um dos que melhor explicou o fenômeno, lembrando que a
inflação é basicamente um problema monetário, de excesso de circulação
de moeda. Ele chamou a curva Phillips de uma ilusão. A escola austríaca
também demonstrou, com sólido embasamento, que o desemprego era fruto
de restrições criadas pelo próprio governo, não permitindo o livre
funcionamento do mercado de trabalho. Murray Rothbard chegou a afirmar
que a relação proposta pela curva Phillips era inversa, na verdade. Mas
os adeptos de Keynes não desistiriam facilmente.
A curva foi
adaptada, e o conceito de NAIRU (non-acelerating inflation rate of
unemployment) foi criado, dando a entender que a partir de um certo
nível de desemprego é que a inflação seria detonada. Tamanha é a
influência do NAIRU que até mesmo o Fed, banco central americano,
utiliza bastante seu conceito. Entretanto, a crença nesta teoria seria
duramente abalada com os dados americanos, com cada vez menos
desemprego sem correspondente aceleração da inflação. Para muitos, o
nível do NAIRU seria em torno de 5,5% de desemprego. A taxa atual já
está em 4,7% e nada da inflação explodir. Muitos economistas,
perplexos, buscam novas explicações para o acontecimento “bizarro”.
Não
pretendo me alongar no debate teórico sobre a relação entre inflação e
desemprego. O tema é polêmico e há muita controvérsia ainda. Mas
considero útil trazer o debate à tona, assim como dados empíricos
recentes, já que não são poucos os economistas que condenam as rígidas
metas de inflação no Brasil, como se um pouco mais de inflação fosse
desejável para reduzirmos o desemprego. Erram o alvo. Os
“desenvolvimentistas” são os principais proponentes desta dicotomia, a
qual considero falsa. Podemos crescer de forma acelerada, reduzindo
drasticamente o desemprego, sem que a inflação incomode. Afrouxar as
metas de inflação não é o caminho. Reduzir os gastos públicos, aprovar
reformas estruturais, atacar a burocracia e abrir mais o nosso comércio
sim. Vários países seguiram esta trajetória e colheram os frutos,
crescendo aceleradamente, sem inflação. Enquanto isso, outros
mantiveram as armadilhas criadas pelo excesso de Estado e buscaram um
crescimento calcado na maior tolerância com a inflação. O resultado foi
infinitamente pior. Em alguns casos, catastrófico até.
Levantei
dados de 40 países desde 1995 até 2004, usando a The Economist como
fonte. A taxa média de desemprego no mundo neste período foi de 6,9%. A
inflação média nos últimos 5 anos ficou em 3,8%. Não há praticamente
correlação alguma entre a taxa média de desemprego e a inflação no
período analisado. O Brasil apresentou desemprego médio de 8,3% para
uma inflação de 8,7% desde 1999. Vários países tiveram taxas de
desemprego menores, com inflação também menor. O Chile, nosso vizinho
mais responsável, mostrou taxa média de desemprego de 7% para inflação
média de apenas 2,7%. Tanto Inglaterra como Estados Unidos tiveram taxa
de desemprego média de 6,2% enquanto a inflação permaneceu dentro do
controle, perto de 2,5% ao ano. A Nova Zelândia, que realizou reformas
liberais e reduziu o déficit público, apresentou desemprego de 6,1%
durante o período, com inflação de apenas 2,4% ao ano. Tanto Taiwan
como Cingapura praticamente não possuem desemprego, com taxas abaixo de
4%, ao mesmo tempo que a inflação média não chega a 1% por ano. Por
outro lado, a Venezuela viveu com inflação bem maior, acima de 20%
anual. Nem por isso foi capaz de levar sua taxa de desemprego média
para baixo de 12%. Argentina e Rússia são outros casos de maior
inflação com mais desemprego também.
Os exemplos são inúmeros. A
relação entre a inflação e o desemprego é mais complexa do que parece.
A curva de Phillips está longe de ser uma verdade irrefutável. Mais
parece um mito. O NAIRU ainda necessita de mais fé que qualquer coisa
para ser aceito. Os argumentos dos monetaristas balançam certas teorias
convencionais. As teorias austríacas praticamente sepultam de vez as
crenças dos keynesianos. E os dados empíricos recentes corroboram com a
visão de que a dicotomia apresentada entre inflação e desemprego mais
parece, na verdade, uma falsa dicotomia.
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