O Valor do Amanhã
(Rodrigo Constantino)
Em seu livro O Valor do Amanhã, Eduardo Giannetti discorre
sobre o tema das escolhas intertemporais de forma bastante objetiva e didática.
O autor deixa claro que o fenômeno dos juros é inerente a toda e qualquer forma
de troca em diferentes períodos no tempo, representando o prêmio da espera para
o lado credor, ou o preço da impaciência na ponta devedora. Ou seja, os ganhos
decorrentes da transferência de valores do presente para o futuro, ou os custos
de antecipar valores do futuro para o presente. Nesse cenário, os juros
monetários são apenas uma pequena fatia do conceito geral de juros.
O economista trata também da questão da miopia temporal, quando o indivíduo dá
demasiada importância ao que está mais próximo no tempo, e seu espelho, a
hipermetropia temporal, quando é atribuído um valor excessivo ao amanhã, em
prejuízo das demandas correntes. De um lado, o sujeito que vive literalmente o
carpe diem, de forma hedonista ou mesmo irresponsável, e do outro lado, o que
adia tanto seu viver que o hoje vira um enorme vazio. Se o míope com freqüência
é vítima do remorso, porque o futuro chega e cobra seu preço pelo passado
despreocupado, o hipermétrope normalmente sofre com o arrependimento pelo
desperdício de oportunidades perdidas com o excesso de zelo pelo amanhã. Como
disse Schopenhauer, “muitos vivem em demasia no presente: são os levianos;
outros vivem em demasia no futuro: são os medrosos e os preocupados”. É raro
alguém manter com exatidão a justa medida.
Giannetti inicia sua explanação sobre os juros pelo fator biológico, lembrando
que a senescência é o valor pago pelo rigor da juventude. “A plenitude do corpo
jovem se constrói às custas da tibieza do corpo velho”, como coloca o próprio
autor. Há um claro trade-off implícito em cada escolha intertemporal que
fazemos, entre “viver agora e pagar depois”, ou “plantar agora e colher
depois”. Não podemos ter e comer o bolo ao mesmo tempo.
Animais e crianças costumam viver mais intensamente o momento, reagindo
basicamente por instinto. Os desejos exigem pronto atendimento, e a busca de
rápida satisfação fala mais alto que tudo. Ainda não aprenderam o valor da
espera, e não possuem ferramentas racionais para avaliar se esta compensa ou
não. A impaciência infantil é fruto da combinação da dificuldade de figurar
mentalmente o amanhã e uma baixa capacidade de autocontrole, de resistir ao
apelo de impulsos. Como resultante, há uma forte propensão a desfrutar o
momento e descontar o amanhã. Infelizmente, são muitos os adultos que não
conseguem também dominar tal impulsividade através da razão.
Retardar o consumo atual para poder investir na produtividade rende frutos no
futuro. Os recursos não caem do céu, e faz-se mister uma escolha intertemporal
entre menos agora, mais depois. Hoje mais que nunca, a preocupação com o amanhã
deve ser enorme. Os nômades caçadores viviam o aqui-e-agora, ignorando a
necessidade da previdência. Entretanto, quem nasce atualmente vive
aproximadamente o dobro do que era comum antes da Revolução Industrial. O
progresso da técnica tem aumentado de forma bastante acelerada a expectativa
média de vida. O mundo necessita mais da racionalidade da formiga que da
impulsividade da cigarra. A poupança de hoje é que permite o consumo maior de
amanhã. Tal obviedade parece ignorada quando observamos a situação caótica dos
sistemas de previdência social modernos. Talvez as pessoas não saibam que o
governo não cria riqueza, e portanto não pode garantir a renda da aposentadoria
futura sem a contrapartida da poupança atual. O conforto de amanhã exige um
sacrifício hoje.
Um dos problemas do curto horizonte temporal no Brasil, com baixa taxa de
poupança, é o coletivismo. Trata-se de um ambiente social em que o futuro
pessoal de cada indivíduo pouco depende dele mesmo, ou seja, depende apenas em pequena
medida das escolhas que ele faz. É o moral hazard do nosso modelo
previdenciário, sem contas individuais eindependente da contribuição de cada
um para a determinação do benefício futuro. Além disso, nosso grau de
impaciência como nação é absurdamente elevado, devido às necessidades urgentes
impostas pela miséria. Por fim, as oportunidades de investimento, prejudicadas
pelo péssimo ambiente institucional, oferecem baixo valor para o uso de
recursos que deixam de ser consumidos no presente, podendo assim ser deslocados
para render frutos à frente. A confiabilidade da ordem jurídica aumenta a
confiança no amanhã.
O somatório dessas características faz com que a sociedade brasileira tome
emprestado do futuro, de forma irresponsável até. Desta forma, a dívida pública
através do Estado beira um trilhão e meio de reais, e a taxa de poupança é
absurdamente baixa, menor que 20% do PIB. O Brasil vive demasiadamente no
presente, com seu governo inchado e assistencialista, sem a necessária poupança
que se reverte em investimentos produtivos. Como uma criança, age por impulso,
para atender os desejos do momento. Quer o bônus da prosperidade sem o ônus da
poupança. Quer o crescimento sem o custo da espera, e quando o resultado não é
inflação ou crise na balança de pagamentos, é juros altos.
O valor do amanhã continua baixo por aqui, como nos tempos indígenas. E quem
tudo quer, nada tem. No afã de querer tanto o consumo maior no presente quanto
o conforto da farta poupança no futuro, o país corre o risco de terminar sem
nada: a cigarra triste e a formiga pobre.
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