O humanismo ateu
(Pe. Jorge Ribeiro)
O HUMANISMO ATEU Para o homem conhece-te quer dizer conhece a tua nobreza e a tua dignidade, compreende a grandeza do teu ser e da tua vocação, daquela vocação que constitui o teu ser. Saiba ver em ti o teu espírito, feito pelo Absoluto.Como os antigos Padres da Igreja, também os grandes doutores medievais tinham por sua vez, sem distinção de escola, exaltado o homem, expondo o que a Igreja sempre ensinou referentemente à relação do homem com Deus: em cada homem a magnificência, em cada um a dignidade.Mas o homem um dia não foi mais tocado por isso. Começou a acreditar que jamais tinha estimado a si mesmo e não poderia ter se desenvolvido livremente se não tivesse tocado os laços com a Igreja, depois com aquele mesmo Ser transcendente do qual a tradição cristã o fez depender.O homem elimina Deus para reentrar ele mesmo na possessão da grandeza humana que lhe parece indevidamente retida por um outro. Em Deus ele abate um obstáculo para conquistar a sua liberdade. O humanismo moderno se constrói sob um rancor e inicia com uma escolha.O humanismo não surgiu entre nós de maneira brusca como um bloco errático num deserto sem ligação com a paisagem circundante. Recolheu e explorou largamente a herança duma tradição anterior. Não podemos fazer uma análise, ainda que incompleta, de suas fontes, isso excederia em muito o objetivo do nosso estudo. Bastará lembrar os nomes de alguns precursores, cuja influência se mantém viva. Em Particular Comte, Feuerbach e Nietzsche comunicaram ao humanismo certos traços de família ainda visíveis.A idéia de um Deus transcendente é rejeitada por Comte, com firmeza, mas sem acrimônia, em nome da ciência positiva. Essa crença tradicional parece-lhe ultrapassada pelas descobertas modernas relativas à origem do homem e do universo. No entanto, a negação de Deus entra numa nova fase. Outrora, o ateu encontrava-se com o crente no mesmo campo de discussão. Punha o problema nos mesmos termos, segundo os mesmos modos de raciocínio, em nome dos mesmos princípios. Exata atitude parece a Comte tímida e perigosa, porque o ateu, apesar de sua segurança, se expõe a regressar atrás. A inquietação e a fé arriscam-se a ressuscitar, mais dias menos dias, numa inteligência ainda imbuída de preocupações religiosas.Por isso convém extirpar as raízes da crença, sufocando o sentido do absoluto e excluindo qualquer pesquisa metafísica. Desde então o problema teológico torna-se difícil e sem interesse: morre de inanição. Nunca mais se levantará (A. Comte, Discurso sobre o Espírito Positivo, 51-53). O reino de Deus fica irrevogavelmente exausto.Era apenas uma regência provisória durante a infância da humanidade. Agora, que o homem atingiu a idade adulta e que entrou na era da ciência positiva e da emancipação intelectual, afasta a questão religiosa como um falso problema. Descobre mesmo a s ilusões que outrora a suscitaram: a ignorância e a ingenuidade. Mas, sabendo que não se destrói uma coisa senão substituindo-a, Comte substitui a idéia de Deus pelo culto da humanidade, promovida à categoria de divindade nova (De Lubac, O drama do humanismo ateu, 169-171).
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