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(Soares; Fabiane)

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Letras e Dívidas Os grandes escritores conhecidos foram também contumazes devedores de dinheiro. Quase sempre, senão sempre, por detrás de uma obra prima não é uma musa quem sopra no ouvido do autor, mas sim um forte e ameaçador ruído da pancada na porta, feita pelo seu credor. Na longa história da literatura, as letras e os cifrões sempre andaram aos trambolhos, em relação tumultuosa e ofensiva. Escrever é uma arte sedentária, solitária e silenciosa, ofício exercido comumente por seres excêntricos e complicados, sem nenhum talento para a acumulação de bens. O dinheiro, ao revés, é ativo, social e ruidoso, passando de mão em mão, com multidões atrás dele doidas para entesourá-lo. As letras, por seu lado, só necessitam do sonante quando estão em total atrapalho. É, quase sempre, com os trastes empenhados e com as ameaçadas e xingações do cobrador a porta, que um escritor converte-se numa pequena indústria produtora de textos e de idéias, tentando acalmar os credores com uma enxurrada de páginas impressas. Balzac, um exemplo entre tantos, dificilmente chegaria a criar as 2 mil personagens e as mais de dez mil páginas manuscritas da "Comédia Humana" (escrita entre 1829 a 1848), se não o atormentasse uma legião inteira de credores que o caçavam por toda a Paris. O mesmo deu-se com Dostoievski. Sendo jogador compulsivo, era constrangido a deixar a roleta e a escapulir de Baden-Baden, na Alemanha para, refugiado numa pensão ou num hotelzinho qualquer, resgatar o crédito empunhando a pena. Algumas das suas obras-primas seguramente resultaram da ameaça da perda de todos os seus direitos autorais. Diga-se a bem da verdade que os escritores se desforraram dos que, para eles, representavam aquilo que o poeta oriental Ady chamava de o Grão Senhor de Cabeça de Porco: o capitalista, um sujeito qualquer que lhes adianta dinheiro a juros. Bem antes deles todos, o notável Dante, outro costumeiro devedor, por ser exilado e poeta, ao descrever num dos círculos do Inferno (Canto II) aqueles que viviam de juros, amontoou-os num lago lodoso, acossados pelo vento e pela chuva, numa evidente e sublimada vingança pelos padecimentos sofridos por ele nas mãos dos usurários do seu tempo. Shylock, o mais conhecido emprestador de dinheiro de Shakespeare, um monstro que ele expôs às maldições de todo o mundo no O mercador de Veneza, exigia que uma certa dívida fosse paga em pesos de carne. Balzac, por sua vez, retratou um deles, o velho Gobsek, um filósofo da usura, como um lamentável ancião solitário que morre deixando um casarão lotado com coisas empenhadas, repleto de sacos de café velho, salames e peixes apodrecidos! Além de atribuir-lhe a doença da carfologia, fez com que sua bela fortuna, produto de uma cultivada avareza, terminasse nas mãos de uma neta, uma meretriz. Karl Marx, outro eterno quebrado e costumeiro freqüentador dos penhores, previu um fim trágico para todos eles, soterrados pela futura revolução proletária. Dostoievski radicalizou. O principal personagem da novela "Crime e Castigo", o estudante Raskólnikov, um alter ego do autor, trucidou a machadadas sua credora, a velhota sovina Alíona Ivânova. John Kenneth Galbraith, no prefácio do seu livro sobre a crise de 1929, lamentou que as depressões econômicas nunca sensibilizaram os grandes dramáticos, não ensejando, apesar do estrago que provocam, nenhuma tragédia literária sequer digna de respeito. Inexiste um Hamlet da bancarrota. O triste fato de milhares de pessoas verem esfumar-se a poupança, o emprego, e, por vezes, o patrimônio da família inteira, não parece aos romancista e novelistas de porte suficiente para alcançar a comoção. É plebeu, vulgar, banausis, diria Aristóteles, só perder-se dinheiro. Ser alijado do poder, morrer sob o cutelo do carrasco ou na ponta de um florete envenenado, isso sim, é nobre a ponto de merecer a atenção da boa literatura.



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