Entrevista de Gore Vidal (Parte 2)
(José Pedro Antunes)
kulturSPIEGEL: O ataque mostra, na verdade, que o medo em relação aos terroristas tinha razão de ser. Vidal: Mas de que nos serviram os serviços secretos? A questão é se queremos de fato erigir em nosso país uma ditadura policial, com a finalidade de estarmos mais bem aparelhados contra eventuais terroristas árabes. Em cada avião, estarão sentados agentes de segurança, em cada cruzamento de rua, um militar. É isso que eu quero? Minha resposta é: não. kulturSPIEGEL: Não poderia acontecer de muitos americanos desejarem medidas mais enérgicas de segurança, porque querem viver seguros? Vidal: O senhor acha? Eu acredito que os meus compatriotas sejam incrivelmente irados, porque nem a CIA nem os militares os protegeram. Agora serão gastos 60 bilhões de dólares por um sistema de defesa espacial, que não passa de uma piada. O que pode esse escudo contra um avião civil seqüestrado por terroristas? Poderia nos ajudar contra mísseis Cruise, que são desferidos na Coréia do Norte. Mas estes com certeza não nos atacarão, enquanto não desferirmos um primeiro ataque. kulturSPIEGEL: No entanto, é George W. Bush que está convencido da necessidade desta defesa anti-mísseis no espaço, um presidente eleito por uma maioria mínima dos americanos. Vidal: Os americanos tinham de escolher entre duas pessoas, mas, na verdade, não entre dois programas. Naturalmente, agora muito mais dinheiro será injetado em armamentos militares. Mas, em última análise, esse dinheiro não flui para a América dos empreendimentos e para aquele um por cento dos cidadãos a quem eles pertencem. 80 por cento dos americanos não ganham nada com isso. kulturSPIEGEL: Os que os americanos pensam da política intervencionista do seu governo? Vidal: Se alguém não tem condições de manobrar a política mundial, é o governo americano. O povo americano sempre foi da opinião de que os EUA não deveriam se imiscuir, mas cuidar de suas próprias questões. Depois do ataque japonês a Pearl Harbour, 80 por cento dos americanos eram de opinião de que o país deveria abandonar a guerra. Somente os empreendimentos internacionalmente orientados têm um interesse na intervenção internacional, porque tiram seus lucros dos mercados globais. kulturSPIEGEL: O clima deve ter mudado: 85 por cento dos americanos, de acordo com uma pesquisa do “New York Times”, opinam que os EUA deveriam usar força militar contra os responsáveis pelo ataque. Vidal: Não é um milagre que estejam a dizer isso, uma vez que as imagens terríveis de Nova Iorque e Washington lhes são mostradas 24 horas por dia, bem pessoas urrando seu ódio diante das câmeras. A tarefa dos meios de comunicação – e da CIA – é, no momento, horrorizar os americanos e promover um grande ódio contra os muçulmanos. Devo dizer que eles fazem bastante competentemente o que faze. kulturSPIEGEL: Na sua opinião, quem teria atribuído aos meios de comunicação americanos com esta tarefa propagandística? Vidal: O senhor veja – a General Electric fabrica armas nucleares e, ao mesmo tempo, é proprietária da NBC, uma das maiores emissoras de televisão nos Estados Unidos. A General Electric chama isso de “sinergia”. Eu dou a isso o nome de propaganda. O objetivo é espalhar uma única forma de ver os acontecimentos: ou seja, que o terrorista Ossama Bin Laden se esconde por trás dos ataques. Caso ele, como parece, de fato seja o planejador, nós nunca seremos informados sobre isso pelos meios de comunicação americanos sobre os motivos que o levaram a esse atentado. O povo americano é levado a crer que ele seja malvado, da mesma forma como os árabes são malvados. Isso talvez seja verdadeiro para alguns, mas obviamente também é verdadeiro para alguns cristãos, pois o mundo é assim mesmo. kulturSPIEGEL: Se Bin Laden se esconde por trás do ataque – quais motivos o senhor supõe para o seu terrível crime? Vidal: Bin Laden é um homem rico, sua família possuía contatos íntimos com a casa real da Arábia Saudita. Ele estudou e fala excelente inglês. Portanto,não estamos tratando com um camponês bárbaro. Para um bom muçulmano, a Palestina é uma terra santa. Por isso mesmo, jamais haverá de praticar um ataque desses para cima dos judeus em cima desse solo – antes, haverá de atacar, de preferência, aqueles que dão dinheiro a Israel. Bin Laden odeia a América, porque ela apoia Israel política e financeiramente. kulturSPIEGEL: Os Estados Unidos deveriam, portanto, se retirar da política no Oriente próximo? Vidal: Exatamente isso. Nós ajudamos a fundar Israel em 1947/48. Era o modelo de um Estado pluralista, no qual judeus cristãos e muçulmanos haveriam de viver pacificamente juntos. Mas aí um grupo radical de judeus desenvolveu a idéia de fazer dessa terra um Estado teocrático, no qual cristãos e muçulmanos nada teriam para procurar. Isso conduziu ao conflito de hoje, e seria melhor se a América não estivesse envolvida nisso. kulturSPIEGEL: Qual reação do governo dos Estados Unidos o senhor considera correta agora?
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