Alfabetização Cultural: a luta íntima por uma nova humanidade
(de Dan Baron.)
Sobre o Analfabetismo Cultural:dialogando com Dan Baron A obra Alfabetização Cultural: a luta íntima por uma nova humanidade, de Dan Baron, trata da necessidade de construção de uma pedagogia e uma estratégia de libertação que possibilite enfrentar os dilemas da práxis transformadora da realidade social. Como escreve a educadora peruana Liliana Galván Ore:“Este livro é um modelo vivo refletido no compromisso de quem faz o que aconselha e integra sua subjetividade ao mundo exterior, para transformar essa memória sombria e obscura da realidade numa visão luminosa, plena de esperança pelo crescimento e florescimento”. (p. 17)Ele utiliza recursos lingüísticos como pequenos contos e poemas e expõe o seu íntimo, entendido como um conceito pedagógico. O autor se expõe ao leitor como um recurso coerente com o seu projeto político-pedagógico e de maneira que isto “ilumine” a sua “subjetividade como arteeducador e colaborador cultural” e também o seu “papel como participante e coordenador”. (p.25)Dan Baron apresenta-nos oito experiências culturais coletivas, histórias que compõem uma narrativa das possibilidades de uma prática pedagógica da autodeterminação voltada para as comunidades excluídas dos espaços formais educacionais e, ao mesmo tempo, envolvendo educadores críticos numa perspectiva solidária e democrática. São vivências relatadas não somente através da linguagem escrita, mas também ilustrada por mais de 600 fotos, as quais revelam o convívio e o processo pedagógico com os índios Pataxós, os sem-terra e comunidades da periferia urbana.A prática pedagógica exposta nesta obra advoga o uso de recursos como o teatro e outras formas de expressão artística. Na medida em que integra outras capacidades sensoriais intrínsecas ao nosso corpo-pensante, extrapolando os limites da linguagem escrita, o autor revoluciona a concepção que geralmente temos sobre o processo de ensino-aprendizagem. Por outro lado, contribui para a superação do conceito de educação restrito às amarras do ensino formal. Como ele afirma: “O ser humano educa e forma, mesmo sem o propósito ou desejo. Participamos o tempo inteiro na formação – ou deformação de nossa humanidade, da humanidade das pessoas com as quais convivemos, e por implicação da humanidade do mundo”. (p. 23)A leitura deste livro expressa, em primeiro lugar, uma luta íntima que envolve o próprio leitor. De repente, nos vemos diante de fatos inelutáveis que questionam as nossas certezas e expõem a nossa subjetividade. Não é fácil assumirmos que, na verdade, somos analfabetos culturais; é difícil aceitar que todo o conhecimento enciclopédico e os títulos acadêmicos que porventura temos não são garantia de que sejamos culturalmente alfabetizados. Sabemos ler e escrever, podemos conhecer as grandes teorias, dominar os conceitos filosóficos, políticos etc., mas tudo isto, longe de nos aproximar do outro e da nossa própria humanidade, pode, paradoxalmente, ter um efeito inverso e perverso: o distanciamento do mundo real, da mísera realidade que nos cerca; tendemos a tudo racionalizar e nada sentir. O adágio filosófico “Penso, logo existo” sugere uma questão: existir para quê? Para além do pensar, que nos dá a certeza do existir, é preciso sentir que existimos.Dan Baron revela a necessidade de superarmos os limites da fria racionalidade e de assumirmos uma postura diante do mundo. É preciso sentir, indignar-se, comprometer-se. Os que dominam a palavra escrita iludem-se em equivaler conhecimento formal e alfabetização cultural. O ser humano mais simples cujas condições sócio-econômicas não lhe permitiu freqüentar os bancos universitários tem o que ensinar. Para compreender este fato singelo é mister desmistificar a noção de cultura, predominante e arraigada em nossos corações e mentes, que confunde cultura com conhecimento livresco e formal.O domínio da cultura escrita e discursiva não é suficiente paraque nos alfabetizemos culturalmente. Essa cultura racionalista e eurocêntrica, fator de colonização das nossas mentes e herança introjetada em nosso ser, “nos deixa menos alfabetizados, até ‘analfabetos’, no que se refere às linguagens e performances de nosso corpo, às emoções, aos usos do espaço e aos relacionamentos”. (p. 41) O resultado é a cegueira da consciência, a anulação da subjetividade e da intersubjetividade. Só superando esta cegueira é que teremos condições de estabelecer o diálogo com o outro. Portanto, o comprometimento intelectual, ou seja, o engajamento militante, não nos torna necessariamente melhores nem indica que estejamos alfabetizados culturalmente. Como escreve o autor:Para compreender a alfabetização cultural enquanto um objetivo estratégico na construção de uma nova utopia que respeite a subjetividade humana e estabeleça o dialogo entre os diversos territórios e suas manifestações étnicas, de gênero e de classe, precisamos ter claro a definição de cultura proposta pelo autor:“A cultura é normalmente entendida como a arte produzida para galerias e teatros por gênios criativos em isolamento. Essa crença nos tem desviado e inferiorizado por séculos. Tem sido usada para nos convencer de que a cultura é irrelevante a nossa vida e para nos excluir da construção de idéias e interpretações. Resultou na idéia de que não possuímos técnicas culturais. Mas, sobretudo, essa mentira tem sido usada para nos desencorajar de participar da construção de nossa própria cultura e identidade. A alfabetização cultural pressupõe não apenas a compreensão não elitista, da cultura, como também uma atitude pedagógica fundada na autodeterminação. Trata-se de uma pedagogia crítica, uma pedagogia da esperança que possibilite ir além da crítica e da resistência à realidade. É preciso, portanto, incorporar uma nova atitude fundada na compreensão da própria subjetividade e no diálogo com o outro, uma atitude que persiga a coerência entre os meios e os fins, entre o discurso e a prática.
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