o espiritismo
(alan kardec)
. Em seus últimos momentos, ele dizia sempre: Ele tem sede, é preciso dar-lhe de beber; ele tem frio, é preciso aquecê-lo; ele sofre em tal lugar, etc. E quando se lhe dizia: Mas sois vós que tendes sede, ele respondia: Não, é ele. É que o eu pensante está no Espírito e não no corpo; o Espírito, já em parte desligado, considerava o seu corpo como uma outra individualidade que não era ele, propriamente falando; era, pois, ao seu corpo, a esse outro indivíduo que era necessário dar a beber, e não a ele Espírito. Também, quando da evocação, foi-lhe feita essa pergunta: Por que faláveis sempre na terceira pessoa? Ele respondeu: "Porque eu era vidente, eu vos disse, e sentia nitidamente as diferenças que existem entre o físico e o moral; essas diferenças, ligadas entre si pelo fluido de vida, se tornam muito marcantes aos olhos dos agonizantes clarividentes."
Uma causa semelhante deveu produzir o efeito notado nos militares dos quais se falou. Dir-se-á, talvez, que a ferida determinara uma espécie de loucura; mas o marquês de Saint-Paul não recebera nenhuma ferida; tinha toda a sua razão, disso estamos certos, uma vez que o tivemos de sua irmã, membro da Sociedade. O que se produziu espontaneamente em sua casa, poderia perfeitamente ter determinado em outras por uma causa acidental. Aliás, todos os magnetizadores sabem que é muito comum, aos sonâmbulos, falar na terceira pessoa, fazendo assim a distinção entre a personalidade da sua alma, ou Espírito, e a de seu corpo.
No estado normal as duas individualidades se confundem, e sua perfeita assimilação é necessária à harmonia dos atos da vida; mas o princípio inteligente é como esses gases não se prendem a certos corpos sólidos senão por uma coesão efêmera, e se escapam ao primeiro sopro; há sempre uma tendência para se desembaraçar de seu fardo corpo reo, desde que a força que mantém o equilíbrio cesse de agir por uma causa qualquer. Só a atividade harmônica dos órgãos mantém a união íntima e completa da alma e do corpo; mas, à menor suspensão dessa atividade, a alma toma o seu vôo; é o que ocorre no sono, no meio-sono, no simples entorpecimento dos sentidos, na catalepsia, na letargia, no sonambulismo natural ou magnético, no êxtase, no que se chama o sonho despertou segunda vista, nas inspirações do gênio, em todas as grandes tensões do Espírito que, freqüentemente, tornam o corpo insensível; é, enfim, o que pode ocorrer como conseqüência de certos estados patológicos. Uma multidão de fenômenos morais não tem outra causa senão a emancipação da alma; a medicina admite muito a influência das causas morais, mas ela admite o elemento moral como o princípio ativo; é porque ela confunde esses fenômenos com a loucura orgânica, e é porque também lhe aplica um tratamento puramente físico que, muito a miúdo, determina uma loucura real onde dela não havia senão a aparência.
Entre os fatos citados, há um que parece bastante bizarro; é o do militar que falava na terceira pessoa do feminino. O elemento primitivo do fenômeno, como o dissemos, é a distinção das duas personalidades em conseqüência do desligamento do Espírito; mas há um outro, que o Espiritismo nos revela, e do qual é preciso ter conta, porque pode dar às idéias um caráter particular: é a vaga lembrança das existências anteriores que, no estado de emancipação da alma, pode despertar, e permitir lançar um golpe de vista retrospectivo sobre alguns pontos do passado. Em tais condições, o desligamento da alma jamais é completo, e as idéias, se ressentindo do enfraquecimento dos órgãos, não podem estar muito lúcidas, uma vez que não o são mesmo inteiramente nos primeiros instantes que seguem à morte. Suponhamos que o homem, de que falamos, foi mulher em sua precedente encarnação, a idéia que dela conservasse poderia se confundir com a do estado presente.
Não poderia se encontrar nesse fato a causa primeira da idéia fixa de certos alienados que se crêem reis? Se o foram em uma outra existência, dela pode lhe restar uma lembrança quelhes faça ilusão. Isso não é senão uma suposição, mas que, para os iniciados no Espiritismo, não está desprovida de verossimilhança. Se essa causa é possível neste caso, dir-se-á, ela não poderia se aplicar àqueles que se crêem lobos ou porcos, uma vez que se sabe que o homem jamais fora animal. É verdade, mas um homem,pode ter estado numa condição abjeta que o obrigasse a viver entre os animais imundos ou selvagens; ali pode estar a fonte dessa ilusão que bem poderia, em alguns, lhes ser imposta como punição dos atos de sua vida atual. Quando os fatos da natureza daqueles que narramos se apresentam, se em lugar de assimilá-los sistematicamente às enfermidades puramente corpóreas, se seguiam deles atentamente todas as fases com a ajuda dos dados fornecidos pelas observações espíritas, reconhecer-se-ia, sem dificuldade, a dupla causa que lhes assinalamos, e compreender-se-ia que não é com duchas, cauterizações e sangrias que se podem remediá-los.
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