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Alice no Tribunal das Maravilhas
(Lúcio Jr)

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Os três bigodudos irromperam na sala de visitas, maletas de pelica sobre a mesinha de centro, olhos na assustada Alice. Ela mal pôde reparar a impecável gravata do mais grisalho, o primeiro a dirigir-lhe com firmeza a palavra. Até então Alice jamais pusera em dúvida a sua própria existência. O advogado grisalho lhe dizia cruamente:— Alice, eu não sou mitômano. Alice, você não existe. Você não é você. Amanhã você deverá comparecer à CPI e só há um meio de você se safar das acusações. Negar. Aquilo é um tribunal político. O mundo ali dentro não é o mesmo mundo daqui de fora. Mais parece a toca do coelho branco de olhos cor de rosa. A Alice que irá depor não é essa Alice... Arquelau era o nome do habilidoso advogado, perito em escândalos políticos. Há muito tempo, quando ainda lhe restava um pouquinho de escrúpulo, numa entrevista coletiva, deixara escapar aquilo que ele depois considerou uma grande asneira. Quando o repórter lhe perguntou se não tinha problemas de consciência pelo hábito de mentir tão descaradamente, afirmou: “Infelizmente, disse, a advocacia e a mitomania são irmãs siamesas”. Depois disso, passou a abominar a expressão mitomania. A primeira coisa que dizia a seus clientes era um enfático eu não sou mitômano. Alice remoía absorta aquele “você não é você”, que o doutor Arquelau lhe metera na cabeça.—Mas, doutor, eu sou apenas a mulher do Charles...—Não, Alice, no plenário da Comissão, você é cúmplice do Charles, entendeu? Vocês não se casaram, formaram quadrilha. Esses carrões importados, o apartamento em Miami, as contas na Suíça e nas Bermudas, o jatinho, essa mansão, não são fruto do trabalho. Isso é produto de roubo, de propina, desvio de dinheiro público. A transformação não podia fazer-se sem muita náusea, suores frios e desmaios. Charles Jacaré havia providenciado tudo, médico, remédios e até uma ambulância. Alice relutava em mentir. Pôs-se a esbravejar:—O mentiroso é você, Arquelau. Vocês, advogados, são todos maníacos, falsos, fantasiosos... Antes que a mulher desesperada pudesse porventura pronunciar a detestada expressão, Arquelau foi logo se antecipando:—Mas, Alice, eu já disse que não sou mitômano! Passava das dez horas da noite, quando Arquelau e seus assistentes deixaram a mansão dos Jacarés. Alice recolhera-se aos seus aposentos. Sentia-se um espantalho, um mulambo ambulante. Inadvertidamente, mirou-se no espelho de cristal que Charles fizera vir da Alemanha. Depois de algum tempo, a Alice do espelho foi se transformando num rei, de barbas ruivas e beca cinzenta. Impassível, perguntou com voz tonitroante:—Que você sabe sobre o caso?—Nada, respondeu Alice.—Nada de nada? insistiu o rei.—Nada de nada, disse Alice. Não satisfeito, o rei tornou a perguntar:—Alice, que sabe você sobre o caso?Alice não se rendia. O dia já clareava quando, vencido pelo cansaço, o rei desfaleceu. A mulher também estava exausta e adormeceu, não sem antes pensar na Duquesa, ou seja, na moral que tudo isso poderia ter. Aí se lembrou da menina Alice, a garotinha que tanto gostava de ler histórias. Num suspiro dolente, concluiu:—Alice, a do país das maravilhas, estava sonhando...e eu estou bem acordada.



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