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Poesia
(Pablo Neruda)

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Como se mede um poeta? Como se mede o poeta sem misticismo, sem religiosidade, sem eternidade? A imortalidade de Neruda vai durar porque, no momento em que lhe foi dada a bênção das musas, soube interpretar como nenhum o anseio da terra e dos povos em derredor. Frívolo, inconseqüente, desmesurado. Tudo que uma dezena de críticos importantes disse a respeito de Pablo Neruda é absolutamente verdadeiro, quando se compara com o classicismo moderno de Vicente Huidobro. Finalmente, como não se pode falar mal de un pequeño mal poeta , vamos crescer à custa de un gran mal poeta . Neruda traz na poesia a tradição dos payadores, poetas populares cuja matéria prima é a emoção. Foi decretada a morte do romantismo e determinou-se também a mudança do centro do espírito do coração para o cérebro. Trata-se de uma suposição, mas é fato de somenos importância na circunstância atual: à descoberta da morte cerebral seguiu-se a morte do coração como centro emotivo. Por isso as poesias de T.S.Eliot e Saint-Jean Perse poderão ser lidas a qualquer tempo, mas não as Odas de Neruda. Talvez e admiração e ódio que começamos a sentir pela poesia latino-americana resulte do largo isolamento que a história nos impôs. Agora, enfeitiçados pelo canto da sereia, devotamos tempo a uma poética que não tem o tempero, o cheiro, o ar que respiramos. Para usar expressão antiga: não tem nossa alma. De repente nos bateu a ansiedade de sermos hispânicos. Não somos hispânicos. Não é uma constatação geográfica ou histórica, é carnal, visceral, simplesmente não somos hispânicos. Não somos a América Latina de fala espanhola que se dirige a nós através da Europa. Não descendemos de conquistadores criminosos, reais exterminadores que ensangüentaram as terras, rios e mares, do México à Patagônia. Porisso nossa poesia é diferente. Não temos afinidades poéticas que nos tornem irmãos. Não somos herdeiros da tradição pirata, de saqueadores, de Blake, Colón e outros bucaneiros que não merecem letra. Não nos orgulhamos disso, mas viemos de Portugal, essa terra que se tornou pequena demais porque desistiu a tempo de ser conquistador criminoso. Porque os saqueadores não deixaram pedra sobre pedra, nem a glória, nem a poesia. Encheram os buques com o butim e se mandaram. Mas isso é história, não é poesia. Em poesia somos tão distantes quanto o haicai do soneto. Não temos as mesmas rimas, a mesma história, não somos sequer vizinhos poéticos. A fonte de possa poesia, que pode ainda hoje ser qualificada de romântica – e aqui romantismo tem que ser entendido como a poética voltada para o coração – é originária das qualidades humanitárias que herdamos do cantar gálico, galego e germânico, temperados posteriormente com o ritmo africano e a espiritualidade oriental. Não sofremos a influência bárbara da poesia celta e ibérica, tampouco somos descendentes das sujeições étnicas basca e catalã. Graças a esse detalhe natural nossa poesia não foi compurscada por elementos pseudo-heróicos, ao contrário, cresceu e se impôs ao mundo culto vacinada contra epopéias sangrentas. Nosso herói vem do bumba-meu-boi, do fandango, da micareta, de lendas indígenas, do vudu, da macumba. Mas de repente começamos o lava-pés de vizinhos que sempre nos miraram de viés, alimentando relações literárias e poéticas com fuxicos, comadrios e futricas. O barbarismo dos países latino-americanos ameaça nos contaminar. Os Andrades são nossos; os Bilacs são os; os Campos são nossos. É nossa salada poética, o tempero característico, nosso itinerário percorrido, a voz que varou fronteiras. Não vamos hoje, à luz do Século 21, fingir de mocinho bom e bem comportado, aluno de quem tem pouco a ensinar. Que aprendam conosco – se quiserem – a poética do coração, do samba, do fado, do chorinho. Algo que se pode dizer de Neruda – um tiquinho parecido com Mário de Andrade – é que poeta como ele não existe mais. Ninguém mais adota a poesia do coração, que parece com o evangelho: uma poética estranha e familiar, ao mesmo tempo ingênua e amiga. Ninguém faz a poesia que significa “amor à beleza”, essa beleza que se confunde com o bem. A poética do coração é essencialmente a interpretação contemplativa da vida. O método não se diz inédito, invoca toda uma tradição, menos concernente à vida poética solitária, em favor da solidariedade. O poeta “reconduz o espírito ao coração” e “une-o à alma”. Variante de fórmulas clássicas atualizadas a nosso tempo, a poética do coração não é algo novo e sim baseada em perspectivas anteriores. Trata-se de “guardar o coração pelo espírito” e “reconduzir o espírito da razão para o coração”. É estranho porque a mesma religiosidade negada à poesia atropelou a todos nós recentemente através das obras de pseudo-ascetas capitaneados por Paulo Coelho, este, por sua vez, cavalo do espírito de Raul Seixas.Para reverter esse quadro, talvez imitando na poesia os próprios pseudo-ascetas. Não vamos, como os antigos, “recomendar um lugar tranqüilo e solitário, a posição sentada e os olhos fechados, apoiar o queixo sobre o peito e fixar o olhar no umbigo”. Mas podemos inventar uma maneira poética de explorar o coração e as entranhas, de modo a copiar escolas sufistas. Por-se em busca da energia do coração, energia que designa essencialmente a atividade divina na alma humana restaurada.



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