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Ensaio sobre a Cegueira: uma metáfora a favor da humanização (parteI)
(Márcia Elizabeti Machado de Lima)

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Falar de humanização, hoje, é falar de uma necessidade que se faz urgente para que nos salvemos do caos que se instalou, como resultante da dicotomia cartesiana: corpo/alma, espírito/matéria, razão/emoção, iniciada com a Era Moderna, que vem configurar a disjunção, de que fala Morin. Pensar, então, a condição humana, significa pensar a partir de quê e quando, ela começa a se esfacelar, a se dividir, a se perder. Só refazendo as trilhas da história da humanidade, é que podemos chegar às fontes de onde se originam a incompreensão, a intolerância, a cegueira que nos dominam na contemporaneidade, chamada de Pós-Moderna. Sobre isso, Fromm diz: “A sociedade moderna, a despeito de toda a ênfase que atribuiu à felicidade, à individualidade e ao interesse de cada um, ensinou ao homem que não é a sua felicidade (ou, para empregarmos um termo teológico, sua salvação) a meta da vida, e sim a satisfação de seu dever de trabalhar, ou o seu sucesso. Dinheiro, prestígio e poder transformaram-se em seus incentivos e fins.” (1972:27) É preciso, pois, buscar a leveza contra o peso da vida, de que nos fala Calvino, baseado em Kundera, nas Seis Propostas para o Próximo Milênio, que “está em toda forma de opressão; que a intrincada rede de constrições públicas e privadas acaba por aprisionar cada existência em suas malhas cada vez mais cerradas.” (p. 19) Chegamos, pois, na encruzilhada, é preciso que nos posicionemos, e escolhamos um caminho, mas a questão é paradoxal, não há possibilidade de escolha, se quisermos nos salvar só há um caminho, é o da busca do religamento das nossas partes multifacetadas pela expansão desenfreada de um progresso que se justificou pela busca do conforto, do bem-estar e da comodidade do homem, e na mesma medida produziu seres marginalizados desse processo, o que Candido chama de civilização x barbárie. Como conseqüência dessa marginalização e desse desencontro do homem consigo mesmo, multiplicam-se as produções de obras de auto-ajuda e abrem-se tantas seitas religiosas, é a necessidade do vôo, da utopia, da completude, como forma de fuga a um sistema que aprisiona as nossas potencialidades. Resta analisar se a transcendência buscada nos livros de auto-ajuda, nas religiões, nas drogas, são verdadeiras ou são pseudo-transcendências, para pôr à prova a qualidade dessa transcendência, segundo Leonardo Boff, devemos questionar se ela aumenta ou diminui a potência do ser humano. Pois se uma experiência que se julga transcendente não nos auxilia a enfrentar os desafios cotidianos com mais energia, mais compreensão, mais generosidade, mais solidariedade. Resumindo, se não contribui para vivermos melhor, não apenas conosco mesmos, mas com nossos semelhantes, é apenas uma pseudo-transcendência.O caminho, ainda de acordo com Boff, é o da busca do equilíbrio entre transcendência e imanência, entre o enraizamento e a abertura, as duas partes das quais fala Gullar, no poema Traduzir-se, “Uma parte de mim/ pesa, pondera:/ outra parte/ delira”, como dimensões que se completam em todo ser humano. É um trabalho que Boff chama de domesticar “ passo a passo os demônios que nos habitam, sem recalcá-los, sem cortar-lhes os chifres, mas controlando-os e canalizando a energia poderosa deles para o nosso crescimento." (2000: 57). E isso só é possível, a partir do auto-conhecimento que possibilita sermos verdadeiramente sapiens, conjugando a convivência da razão e da loucura, do bem e do mal que cada um traz dentro de si. Não é reprimindo a nossa essência que nos afirmamos, mas controlando-a, no que concordamos com Fromm, quando diz : “O homem é, simultaneamente, o artista e o objeto de sua arte: é o escultor e o mármore, o médico e o paciente”. Sendo assim, cabe a cada um de nós contribuir nessa tarefa de, usando um termo de Morin, hominizarmo-nos. A essa altura da reflexão, trazemos à baila a importância da arte nesse estado de coisas, em especiala arte engajada na discussão necessária do religamento, do resgate da essência humana, nesses tempos sombrios, da perda da ingenuidade em relação ao abismo existente entre os diferentes grupos sociais, da possível convivência entre razão e sensibilidade , que induzem à Ética Humanista de que fala Fromm, a atitudes de união do plural e diferente, pois “é uma das características da natureza humana o homem só poder realizar-se e ser feliz em ligação e solidariedade com seus semelhantes.” (p.23) Conforme anunciado, ilustramos essa reflexão com a obra Ensaio sobre a Cegueira,de José Saramago, chamada, aqui, de metáfora a favor da humanização, pois é assim que a entendemos, como obra bem realizada do ponto de vista artístico, que passa pela capacidade ímpar de criação, de um autor preocupado com os rumos da civilização, com uma visão apurada, capaz de vislumbrar outras possibilidades, o que Boff chama de construir o novo a partir do lugar onde nos encontramos, de visualizar e amar o invisível, o que parece absurdo aos menos antenados nessa concepção utópica de vida, o que endossamos com os versos de Fernando Pessoa: cada qual vê o que quer, / pode ou consegue enxergar./ Porque eu sou do tamanho do que vejo/ E não do tamanho da minha altura. Lembrando Boff, mais uma vez, “É a utopia que incita as ações humanas e impede a estagnação da história em fatos atuais, que nos impulsiona a mantermos a esperança com vistas aos fins, mesmo antes da percepção dos meios para os atingirmos”



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