Epicuro e a evidência do ser em CARTA SOBRE A FELICIDADE
(Epicuro)
1. Os simulacros. Os simulacros surgem como explicação para as ilusões dos sentidos, aquelas que são, mais tarde ou mais cedo, desmistificadas pelo entendimento e por outras sensações. Epicuro, com a sua tese de que a fonte do conhecimento está nas sensações, não quer significar que tudo o que parece é. Pelo contrário, o filósofo serve-se inicialmente das sensações, mas depois filtra-as através de uma percepção clara e evidente. Alguns simulacros desvanecem-se com a proximidade do objecto; uns são ilusões de óptica, outros enganam-nos pelo cheiro ou por outro qualquer sentido. O que é que a razão pode fazer? Afirmar que, afinal, as sensações são o ópio do entendimento? Epicuro está seguro de uma resposta negativa: “Se combates todas as sensações, nada restará a que possas referir-te para saber exactamente quais as que consideras como falsas. (…) O falso juízo e o erro residem sempre no que a opinião acrescenta”.
No fundo, o que está em causa é não perder de vista o naturalismo, aceitando-nos como somos, seres humanos falíveis, sujeitos ao erro. As coisas são como são mas aparecem-nos de determinada forma; ora, o que importa é compreendermos que as sensações nos dão um princípio de realidade palpável, visível, estável em natureza. Quanto ao modo como as coisas nos aparecem, “é uma falsa opinião acreditar que o gerador de imagens visto de perto é o mesmo que visto de longe. É próprio da sensação aprender apenas aquilo que está presente e não dizer que o objecto está aqui de determinada maneira e ali de outra”. Quanto às explicações dos simulacros, não é matéria que preocupe Epicuro. Tal como a ciência não é assunto que deva ocupar a mente do filósofo do Jardim. O que importa é perceber que as sensações valem o que valem, como sensações que são e como acesso fundamental à realidade.
Para Epicuro, importa saber que há um em si , que é manifestado ao homem como um para si . O acesso directo ao em si é possível, mesmo que dele não se possa elaborar uma teoria do conhecimento científico. A Epicuro basta saber que as coisas são como são e que têm uma ou mais explicações fenoménicas, sejam elas quais forem.
2. A antecipação. É uma sensação marcada repetidamente, até se tornar clara e evidente, pela confirmação. Como quando vislumbramos alguém ao longe e o reconhecemos. Quando nos aproximamos dessa pessoa, confirmamos a sua identidade. Assim, a antecipação deve ser confirmada pela sensação, de modo a nos certificarmos da veracidade da suposição.
Mas há acontecimentos que carecem naturalmente de confirmação. Há casos aos quais basta a não-infirmação para lhes garantir também o carácter de evidência. A não-infirmação é uma prova por solidariedade. Por exemplo, Epicuro garante que o vazio, embora invisível, existe, porque o movimento, que podemos ver, tem espaço, vazio, para se evidenciar. Se não existisse o vazio, não teria lugar o movimento. A categoria da antecipação é mais uma ferramenta do epicurismo para fundamentar a verdade através da evidência dos factos.
É como se existisse uma sensação excedente (um sexto sentido) que nos ajuda a viver a vida com a serenidade e a segurança de que, com os olhos tapados ou abertos, a realidade está aí, o homem respira-a, sente-a e pressente-a como evidente. Se em certos casos, a antecipação soa a memória, noutros elas protege-nos da impotência das sensações face ao intangível. Mais uma vez, o homem é senhor do seu destino, antecipando-o.
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