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Epicuro e a liberdade em CARTA SOBRE A FELICIDADE
(Epicuro)

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1. Se não tivesse existido um acto livre, incondicionado, não só não seria possível conceber a liberdade como também não poderíamos afirmar a evidência do mundo, perante as nossas sensações: porque o mundo não teria tido início!... Ora, Epicuro sabe que o mundo existe, evidentemente, e sabe que, tal como se passa com tudo o que é fenoménico, teve um início e terá um fim: “Quando considero os membros gigantescos e as partes deste mundo, vejo-os morrer e renascer, não posso duvidar que o céu e a terra tiveram igualmente a sua primeira hora e devem sucumbir um dia”. Este é um momento de clarividência absoluta, num movimento que nasceu três séculos antes de Cristo.
Um pensamento que consegue intuir a vida humana como uma organização voluntária de energia, sujeita, pela sua própria vontade de viver, à erosão e à reorganização atómica, é um pensamento ontológico fecundo, pleno de sabedoria interior, a priori , como diria Kant. O sábio comunga com os deuses a liberdade de se auto-recriar, de se auto-desenvolver como alma corporal, um ser infinito num mundo finito.
Jean Brun diz que a teoria da declinação é materialista e não metafísica. Mas esta visão de um mundo natural que se funda por um acto livre da matéria, imbuída de um espírito de iniciativa própria, parece mais uma visão naturalista, sim, mas de uma metafísica da natureza, tal como a vamos reencontrar, por exemplo, em Hans Jonas, que se apoia na teoria da evolução de Darwin (naturalismo) para explicar a necessidade e a liberdade da vida. Jonas também não é ateu (pelo contrário, e procura no judaísmo, a sua religião, uma explicação para a história do mal), mas tem uma noção da divindade que se pode, pelo menos em relação à responsabilidade humana sobre a Terra, comparar à visão de Epicuro: em ambos os filósofos a Divindade não interfere nos assuntos da Criação. Mas a partir daqui afastam-se: para Jonas, Deus abdicou de si pela liberdade da sua Criação, sofrendo com os males terrenos e invocando à alma humana a redenção e a responsabilidade; para Epicuro, os Deuses vivem idealmente, servindo de modelo às aspirações do sábio de suprema felicidade. Mas, no que à vida em natureza diz respeito, em Jonas e também em Epicuro (sabemos que Jonas muito admirava estas antigas filosofias naturalizantes, que com certeza também serviram de inspiração à sua ética de respeito pela natureza) o dualismo alma/corpo é superado por uma liberdade intrínseca que dá origem à vida e que atinge o seu esplendor na alma corporal humana.
Leia-se Epicuro: “Se pela sua declinação os átomos não tomam a iniciativa de um movimento que rompe as leis do destino para impedir a sucessão indefinida das causas, donde vem a liberdade dada a tudo o que respira sobre a terra, donde vem, digo, o poder arrancado aos destinos, que nos faz encaminhar para qualquer sítio onde a nossa vontade nos conduz e, como os átomos, nos permite mudar de direcção, sem sermos determinados pelo tempo ou pelo lugar, mas seguindo o desejo do nosso próprio espírito?”
2. “Antes de mais, considerando o deus como um ser vivo imortal e bem-aventurado, de acordo com a noção comum de deus que possuímos, nada lhe atribuindo de oposto à sua imortalidade, nem de incompatível com a sua beatitude. Em contrapartida, atribui-lhe tudo o que for susceptível de lhe conservar a beatitude, ao mesmo tempo que a imortalidade. Pois os deuses existem: evidente é o conhecimento que deles temos.”
Ao afirmar que temos conhecimento evidente de Deus, Epicuro não O considera uma ideia da razão (Kant, neste ponto, parece radicalizar-se um pouco, ou seja, racionalizar-se demasiado). A evidência pertence ao reino das sensações, moldando-se conforme o caso. Em relação ao invisível, ao infinito e a Deus, a evidência mostra-se através de uma espécie de percepção espiritual.
Esta é a pedra de toque da ontologia epicurista. Ser é Ser-vivo. A vida aqui é considerada, não como umdeterminismo mecânico de nascimento, desenvolvimento e morte, mas como uma liberdade de movimento, à velocidade do pensamento. Este é um tema epicurista e de extrema actualidade.
Qual o papel de Deus na filosofia de Epicuro? Tanto faz que exista como não, que a vida continua ? Deus importa, e muito, ao filósofo do Jardim. Deus é Liberdade em estado puro, Felicidade metafísica. Ora, o sábio, com um saber de experiência feito, tem a intuição fundamental, a visão transcendental da infinitude da experiência estética do Ser.
Em jeito de conclusão, podemos afirmar que, sendo uma filosofia da antiguidade clássica, o epicurismo ainda nos pode ensinar muito acerca da ontologia, não apenas como organização de almas corporais no espaço e no tempo, mas como metafísica, propulsão enigmática de vida. Esse é o papel de Deus: invocar a esperança aos seres naturais de uma vida boa, temperada, teleológica. O mal é uma falsa sensação. A natureza é boa em si mesma – basta sentir-lhe convenientemente as pulsações. Daí que a filosofia epicurista resulte na prática numa estética do viver e do pensar e numa ética como conduta para a Felicidade, a Concórdia e a Sabedoria. Ecuménico, Epicuro.



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